publicado dia 26/09/2019

Bernardo Toro e a educação para o contexto das mudanças climáticas

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Inundações, secas extremas, perda de biodiversidade, alterações no ecossistema, e redução de áreas férteis para agricultura. Estas são algumas das consequências das mudanças climáticas, que delineiam o cenário que aguarda os que hoje são crianças, e para qual a escola deve prepará-las.

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A previsão dessas alterações foi feita pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em relatório divulgado em 2018. Nesta quarta-feira, 25, um novo estudo publicado pelo órgão aponta que, em decorrência do aumento da temperatura média do planeta, os oceanos estão mais quentes, mais ácidos e menos produtivos e o nível do mar está aumentando 3,6 milímetros por ano – o dobro da elevação constatada no último século inteiro. 

O que é o IPCC? É um órgão criado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (ONU) em 1988. Ele não conduz pesquisas, mas analisa e compila informações científicas, técnicas e socioeconômicas produzidas por cientistas de 195 países. Assim, o IPCC traz consensos da comunidade científica global sobre as mudanças climáticas.

“A crise climática é o que aconteceu de mais grave, e será o mais importante para o futuro da espécie humana. Ela vai nos acompanhar para o resto do tempo que estivermos aqui, e traz fortes implicações para a nossa forma de pensar, agir, sentir, educar, produzir e consumir”, afirmou o filósofo e educador colombiano Bernardo Toro durante o 5º Seminário Internacional de Educação Integral.

Para orientar como viver nessa nova situação, que vai impor mudanças estruturais no mundo inteiro, mas também para fortalecer a democracia desde já, o especialista aponta o cuidado como principal ferramenta. “Saber cuidar, dialogar, ter respeito, hospitalidade, e saber fazer transações ganha-ganha. Esse é o universo de valores compõem essa cosmovisão.” 

Bernardo Toro durante o 5o SIEI

Bernardo Toro durante o 5o SIEI

Crédito: Ingrid Matuoka

O cuidado com o corpo

Nas escolas, as aulas de teatro, de esportes, que envolvem o uso corpo, são vistas como extracurriculares em relação às aulas do currículo regular. “Isso significa que o nosso corpo é extracurricular, e que nosso cérebro é o mais importante. Mas não é. E nisso a educação integral sai na frente”, diz Toro. 

Outro ponto importante sobre ensinar a cuidar do corpo, da saúde, e da expressão corporal, tem relação com o enfrentamento à violência. “Países violentos são os que não nos ensinaram o valor e cuidado com o corpo.” 

O cuidado com o espírito

O conceito de cuidado com o espírito, na perspectiva de Toro, abrange todas as religiões e espiritualidades, porque é regido pela capacidade que uma pessoa ou um grupo tem de trabalhar para evitar ou diminuir a dor dos demais.

Trata-se ainda, de ser capaz de autorregulação para obter liberdade. No caso das mudanças climáticas, exemplifica o especialista, isso seria necessário para aprendermos a viver com a escassez de recursos e alimentos.

“Também precisamos educar as crianças para serem conscientes com seus sentimentos aflitivos, porque ter consciência deles permite controlá-los.”  

Cuidar de quem está próximo

A taxa de suicídio e depressão entre os jovens tem crescido pelo mundo todo. Para Toro, isso deriva da falta de vínculos, da capacidade de fazer amigos e estabelecer relações de parcerias estáveis.

Na escola, cuidar do vínculo é garantir aulas seguras, que todas as perguntas sejam respondidas, que ninguém sofra bullying, que toda forma de existência e expressão sejam válidas, e que as famílias desses alunos também sejam respeitados em suas maneiras de ser. 

“Isso gera segurança na escola e vínculo com a sociedade. E o resultado é que dificilmente vão causar danos a bens públicos, porque se sentem pertencentes. Esse vínculo é fundamental para viver em qualquer lugar do mundo, é reconhecer a si e ao outro.”

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Cuidar de quem está distante 

Em um contexto de mudanças climáticas, as migrações devem se intensificar, sobretudo em busca de água potável, algo que a América Latina possui em abundância. “América Latina será o centro da imigração nas próximas décadas. Estamos preparados para isso? Vamos formar nosso espírito de hospitalidade ou vamos matar a todos?”

Assim, saber cuidar de quem é diferente, e respeitar essa diversidade, será um imperativo que pode fortalecer a democracia. “Temos que criar e cuidar de redes de apoio social e profissional, pertencer a organizações, e ter um comportamento inclusivo em todos os aspectos. Nós temos que reconhecer a humanidade como uma espécie.”

O cuidado com o intelecto

“Sem um sistema educacional de alta qualidade, não vamos conseguir mudar as formas de pensar das crianças para enfrentarem as mudanças climáticas”, argumenta Toro. Assim, ele sugere o fortalecimento de uma rede única de educação, sem distinções entre privado e público. “Precisa ser para todos.”

E na concepção pedagógica, ele recomenda que se renuncie à noção de inteligência como propriedade pessoal, privada e interna, que se manifesta no desempenho em provas, e tem caráter competitivo e excludente.

Em lugar disso, seria necessário um altruísmo cognitivo, de aceitação da debilidade e da cooperação humana, desenvolver a capacidade de buscar ajuda para as tentativas de solução de um problema, e de usar continuamente o intelecto em benefício próprio e dos demais. “A educação é um fator estratégico de nação, sem isso não há país”, finaliza. 

Bernardo Toro é diretor da Fundación AVINA (Colômbia) e membro do Conselho Internacional do Instituto Ethos, e já atuou como assessor dos Ministérios da Educação e Comunicações da Colômbia, Brasil e México, entre outros países.

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