publicado dia 11/08/2025
Programa Escola em Tempo Integral completa 2 anos em meio a desafios orçamentários
Reportagem: Ingrid Matuoka | Edição: Tory Helena
publicado dia 11/08/2025
Reportagem: Ingrid Matuoka | Edição: Tory Helena
🗒Resumo: Realizado pelo governo federal, o Programa Escola em Tempo Integral completou 2 anos no final de julho. Nesta reportagem, Raquel Franzim (MEC) e Claudia Santos (Observatório Nacional de Educação Integral) apontam avanços da política e indicam caminhos para lidar com financiamento, infraestrutura e currículo, os principais desafios encarados pelas redes.
Em 31 de julho, o Programa Escola em Tempo Integral completou dois anos desde sua instituição por meio da lei nº 14.640/23.
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O aumento do número de matrículas em jornada estendida (tempo integral) traz uma série de avanços, como o fortalecimento da Educação Integral no país, mas enfrenta desafios como a falta de recursos e de integração do currículo escolar.
Programa Escola em Tempo Integral marcou retomada de investimentos federais na área. Na foto, a coordenadora-geral de Educação Integral e Tempo Integral no MEC, Raquel Franzim.
Crédito: MEC
Com o objetivo de fomentar com recursos financeiros e técnicos a criação de matrículas de Educação Integral em tempo integral, o Programa Escola em Tempo Integral marca a retomada dos investimentos federais nessa área, desde 2023, e alcança atualmente mais de 4,6 mil dos 5,5 mil municípios brasileiros (87%) .
Desse total, 90,48% de Secretarias de Educação que aderiram ao programa já haviam aprovado, até o final de junho deste ano, suas próprias políticas locais de Educação Integral, validadas pelos Conselhos de Educação dos territórios, assegurando uma diretriz do programa para que ele seja contextualizado às demandas particulares de cada localidade.
A política pública de Educação Integral atende hoje 1,975 milhão de estudantes e alcança 87% dos municípios
“Conseguimos um patamar que nos orgulha muito”, celebra Raquel Franzim, coordenadora-geral de Educação Integral e Tempo Integral na Secretaria de Educação Básica (SEB) do Ministério da Educação (MEC).
A política atende hoje 1,975 milhão de estudantes da Educação Infantil ao Ensino Médio e em todas as modalidades de ensino, de acordo com a pasta.
Ao todo, segundo o Censo Escolar 2024, o Brasil possui mais de 7,4 milhões (23%) de crianças e adolescentes em tempo integral.. Em 2022, essa taxa era de 18,2%. A meta, de acordo com o Plano Nacional de Educação (PNE) vigente, é alcançar 25% dos estudantes da Educação Básica.
Um edital de reconhecimento de experiências inspiradoras de Educação Integral também foi realizado pelo MEC em 2025, identificando 739 práticas de redes públicas de ensino.
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“Nos anos anteriores vimos um crescimento maior do tempo integral no Ensino Médio e na creche. Desta vez, o aumento foi principalmente no Ensino Fundamental, etapa que concentra a maior parte dos estudantes e que estava estagnada nos últimos anos”, observa Raquel.
Além do aumento do número de matrículas, Raquel avalia que há um compromisso das redes educacionais em discutir o projeto de Educação que elas adotam e formar suas equipes, gestores e educadores.
Formações em parceria com universidades alcançaram 28 mil secretários, equipes técnicas e conselheiros
Desde a criação da política, mais de 28 mil Secretários, equipes técnicas e conselheiros de Educação participaram da formação realizada pelo programa em parceria com universidades federais de todas as regiões do país.
“Não queremos só criar matrículas e ampliar o tempo. Queremos assegurar uma experiência pedagógica de desenvolvimento pleno, garantia de direitos de aprendizagem, formação para cidadania e qualificação para o mundo do trabalho”, pontua Raquel.
Ampliação do tempo integral fortalece Educação Integral, mas enfrenta desafios como a falta de recursos e de integração do currículo escolar.
Crédito: Agência Brasil
Este ano, o Congresso Nacional zerou os recursos previstos para o programa na Lei Orçamentária Anual (LOA). Na proposta inicial do governo, a iniciativa teria R$4,8 bilhões em 2025.
“Quando a política foi anunciada, ela gerou muita expectativa e alegria. A perda de financiamento traz angústia e descrédito. Muitas redes não têm clareza de que o repasse não vai chegar e, infelizmente, o recurso é determinante para a política acontecer. Ela está ameaçada”, afirma Claudia Santos, professora e integrante da equipe de coordenação do Observatório Nacional de Educação Integral e do Comitê Territorial Baiano de Educação Integral.
O Programa Escola em Tempo Integral agora depende exclusivamente do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), que financia salário de professores e infraestrutura escolar.
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Além disso, no fim do ano passado, o Legislativo diminuiu de 20% para 10% a parcela do Fundeb a ser destinada ao Programa Escola em Tempo Integral em 2025 . A partir de 2026, será de apenas 4%.
Cortes no orçamentário e execução do recurso recebido pelas redes seguem como desafios
Outra dificuldade que as redes enfrentam está na execução do recurso recebido. “Dos 4 bilhões de reais transferidos pelo governo federal para as redes municipais, estaduais e distrital no primeiro ciclo, 2023/2024, cerca de 2,8 bilhões de reais ainda estão em conta e podem ser utilizados. Para isso é preciso ter planejamento de como utilizar esse recurso com intencionalidade educativa”, diz Raquel Franzim.
Para auxiliar as redes, em maio deste ano o MEC realizou uma live com orientações sobre a utilização de recursos. As Secretarias têm até 31 de outubro para utilizar a verba.
Para Claudia, a política também poderia ser fortalecida se o diálogo que a União faz com os entes federativos se estendesse diretamente às escolas, para que elas tivessem mais autonomia, principalmente financeira.
A educadora também avalia a necessidade de maior convergência entre as ações propostas pelo MEC. “O governo tem muitos programas, como o Escola das Adolescências, Compromisso Criança Alfabetizada, Escola e Comunidade, o de Formação de Leitura e Escrita, mas eles estão muito soltos, com pouca convergência. Quando chegam nas redes municipais que têm poucos técnicos, é mais difícil fazê-los dialogarem, além de muitos desses programas virem com alto nível de plataformização. Precisamos unir as políticas em direção à formação integral dos estudantes”, defende Claudia.
Na implementação do programa, as redes também lidam com a dificuldade de estruturar a política localmente, garantindo um desenho institucional adequado à sua implementação, com a criação de um setor e com profissionais responsáveis pela Educação Integral em tempo integral dentro da Secretaria.
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A falta de infraestrutura escolar, tanto para alocar todos os estudantes em turno único, quanto para diversificar as experiências e aprendizagens, ilumina um problema histórico da educação brasileira e que afeta de forma mais aguda estudantes e escolas de territórios vulnerabilizados.
“Esse é um ponto paralisador da política, porque mesmo que haja vontade, é uma questão concreta de falta de equipamentos e infraestrutura, como parquinhos, brinquedos, utensílios de cozinha, material de tecnologia, além da contratação de mais pessoas”, indica Claudia.
Construção de currículo integrado é outro desafio enfrentado pelas Secretarias e escolas.
Crédito: Agência Brasil
A construção de um currículo integrado é outro desafio enfrentado pelas Secretarias e escolas. Raquel explica que é mais comum encontrar escolas divididas em turno e contraturno – um período de aulas e outro de oficinas extracurriculares – ou o uso do tempo a mais na escola para aulas de reforço.
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“É preciso ter compromisso com a proteção integral e com as aprendizagens, que devem dialogar com as necessidades daquela comunidade e território. Não opomos aprendizagem ao desenvolvimento pleno. O estudante está lá para aprender a ler, mas também para fazer esporte, por exemplo. Não é um ou outro, é tudo isso junto”, define Raquel.
Em 11 de junho, o Conselho Nacional de Educação aprovou as diretrizes operacionais da Educação Integral em tempo integral, que agora aguardam a homologação do ministro da Educação, Camilo Santana.
Fruto de 5 seminários realizados em todas as regiões do Brasil em 2023, audiências e consultas públicas, a expectativa é que as diretrizes possam auxiliar as redes na construção, implementação e avaliação de seus currículos.
“O compartilhamento das 739 experiências selecionadas pelo edital Experiências Inspiradoras de Gestão e Projetos Pedagógicos de Educação Integral em Tempo Integral, realizado pelo Ministério da Educação (MEC) em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também vai gerar redes de trocas entre as Secretarias para colaboração e apoio na implementação da política”, afirma Raquel.
*Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil