publicado dia 30/01/2024

“Escutadora de crianças”: conheça o trabalho da professora Geisa Giraldez no combate ao racismo 

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🗒️ Resumo: Por meio da escuta ativa e sensível das crianças, a professora Geisa das Neves Giraldez, da rede pública municipal do Rio de Janeiro (RJ), combate o racismo e promove o desenvolvimento integral desde a Educação Infantil. Confira seus projetos com artistas negros, lambe-lambes e conexão com as famílias.

Se o racismo presente em nossa sociedade também permeia as creches e escolas, e afeta desde os bebês até as professoras, combatê-lo desde as primeiras experiências educativas é central. Este é o norte do Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI) Zélia Gattai Amado, no Rio de Janeiro (RJ), onde atua a professora Geisa das Neves Giraldez.

Leia + Ser a professora que não tive: A importância do combate ao racismo para as educadoras

Desde 2013, a pedagoga vem construindo sua prática pedagógica com base na escuta das crianças. O que a educadora escuta de muitas delas é a importância do combate ao racismo e da celebração das várias diversidades. 

Para conduzir esse trabalho com suas turmas da Educação Infantil, Geisa usa recursos como a música, desenhos e lambe-lambes, além de construir uma relação próxima às famílias.

“O bebê preto é menos tocado do que o bebê branco nas creches. As crianças negras de 5 anos já não são mais consideradas crianças. Se há uma guerra contra nossa subjetividade, temos que enfrentá-la, inclusive porque o racismo é a coluna de todos os problemas que vivemos no Brasil”, afirma Geisa.

“A Educação das relações étnico-raciais se dá muito a partir do heroísmo e não dá para continuar assim […] Sou uma escutadora de crianças, para ouvir a escola que elas querem e sonham, uma escola que nasce a cada turma que chega”, afirma a professora Geisa das Neves Giraldez.

Para enfrentar o cenário, a professora destaca que a Educação tem um papel fundamental: “Uma Educação que trabalha de forma racializada a diversidade em todas as suas esferas – na família, na escola, na forma de pensar e organizar os conhecimentos – pode abrigar todas as subjetividades e seres vivos, e celebrar a diferença como modo de existência”.

Para materializar ao longo do ano todo essa atuação, pautada na Lei 10.639/03, entre outros documentos legais, a professora conta com apoio de uma gestão democrática e dialógica, que oferta condições para tanto, além de um coletivo de professores engajados. 

“A Educação das relações étnico-raciais se dá muito a partir do heroísmo e não dá para continuar assim, sendo mais desenvolvida por professoras negras por ser uma questão muito pessoal, de ser as professoras que elas não tiveram, a professora que eu gostaria de ter tido. Sou uma escutadora de crianças, para ouvir a escola que elas querem e sonham, uma escola que nasce a cada turma que chega”, define Geisa.

Conheça 2 projetos da professora Geisa das Neves Giraldez e 1 da escola em que atua, o EDI Zélia Gattai Amado, que também contribui para seu trabalho e o desenvolvimento integral das crianças: 

Projeto Desenhema

Indicado para: Crianças de 3 a 5 anos (Educação Infantil) 

Materiais: Papel ou suporte para desenho, lápis de cor, giz de cera ou outros materiais para colorir. Músicas de artistas negros e aparelho de som para reproduzi-las para a turma.

Em uma turma, uma menina perguntou para a professora por que todos os homens que conhecia, morriam. “Era uma denúncia de uma criança de 5 anos. Fiquei muito tocada. Ela estava lendo qual era o corpo mais vulnerável é o do homem negro, parecido com o dela. A partir dessa escuta, fui pensar de que forma eu poderia trazer mais homens pretos para a escola”, conta Geisa.

Desenhema de trecho de música do Emicida

Crédito: Geisa das Neves Giraldez/Acervo pessoal

É assim que surge o Desenhema, projeto em que as crianças são instigadas a fazer desenhos a partir de músicas de homens negros, como Cartola, Luiz Gonzaga, MC Poze do Rodo, Emicida e Gilberto Gil. Enquanto a turma desenha, a professora compartilha a trajetória de vida de cada artista.

“Sempre trago algo pitoresco da vida deles, para cativar e terem conexão com uma experiência negra positiva, terem amor à negritude, como ensina bell hooks. É para que as crianças possam se reconhecer, se abrigar nessa perspectiva, porque quando ouvimos um verso de alguém, é uma visão de mundo dessa pessoa. Quando trago pessoas muito diferentes, como Luiz Gonzaga e Emicida, trago a pluralidade de ser homem preto para as crianças”, explica Geisa. 

Projeto Vozes ecoando vozes

Indicado para: Crianças de 3 a 5 anos (Educação Infantil)

Materiais: Papel para confeccionar o lambe-lambe (seda, papel jornal, sulfite ou kraft) e cola (pode ser artesanal).

“As crianças, e especialmente as negras, são vozes silenciadas na nossa sociedade”, afirma a professora que se empenha em ouvir os pequenos. 

Em um projeto sobre as regiões do Brasil, as crianças gostaram muito do famoso lambe-lambe paulistano “Mais amor por favor”. “Fiquei pensando no que mais elas querem, por favor?”, brinca Geisa. Nos lambe-lambes produzidos por elas, pediram mais batata frita, parquinho, escola e desenhos.

educação antirracista

Mural com os lambe-lambes produzidos pelas crianças

Crédito: Geisa das Neves Giraldez

“Cada uma disse o que gostaria de ter mais na vida naquele momento, e aí as perspectivas de infâncias são diferentes e mostram o que é interessante para cada um. Aprendemos muito nessa escuta e conseguimos organizar nossos projetos e currículo a partir do que elas querem, desse interesse. Isso faz alcançar mais e ter uma conexão maior com eles”, observa Geisa.

Projeto Zélia de Portas Abertas

Uma vez por mês, a escola abre para as famílias viverem um encontro na sala de referência da criança inspirado no tema do ano da escola. O projeto da escola ajuda a professora Geisa a se aproximar das famílias. 

“É muito bom conseguir fazer isso porque é um jeito das famílias estarem na escola sempre, não apenas em datas pontuais, e fazemos um desdobramento para as famílias do que estamos trabalhando com as crianças”, explica a professora.

Nesse processo, as professoras levam várias referências positivas da negritude. “Na festa junina, fizemos as bandeirinhas juntos e eu trouxe fotografias do Heitor dos Prazeres e falamos sobre ele. É importante para as pessoas saberem que tem um multiartista com a aparência de um avô, de um marido. A escola é um espaço de formação para todos”, afirma Geisa.

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