publicado dia 31/07/2020
O que significa promover o acolhimento na reabertura das escolas
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 31/07/2020
Reportagem: Ingrid Matuoka
“Viver é a capacidade de existir. Do levantar e cair”, “Um grito calado de alguém despedaçada”, “O que é a saudade?”. Estes são alguns dos registros sobre luto e pandemia de Covid-19 deixados por pessoas de todo o Brasil no mural virtual A Palavra no Agora – projeto realizado pelo Museu da Língua Portuguesa em parceria com o Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto (LELu) da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo.
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“O Brasil vive um período de luto coletivo: 90 mil mortes é muita coisa. E vários dos que ficaram não puderam se despedir. Então o projeto abre espaço para que as pessoas expressem seus lutos. À semelhança, pode-se realizar atividades de acolhimento na reabertura das escolas, porque seguir em frente como se nada tivesse acontecido resultará em fracasso”, afirma a psicóloga Maria Helena Franco, coordenadora do LELu.
Assim, conforme as escolas preparam seus protocolos de retomada das atividades presenciais, vale atenção especial ao acolhimento de famílias, estudantes, gestores, professores e demais funcionários, que perderam parentes e amigos, enfrentaram a doença em seu próprio corpo, e lidam diariamente com todas as transformações, simbólicas ou concretas, que a pandemia trouxe e continuará a trazer.
Em Manaus (AM), uma das cidades mais afetadas pela pandemia no Brasil, a Secretaria de Educação já prepara diretrizes para garantir esse acolhimento. A rede firmou parcerias com universidades para disponibilizar estudantes de Psicologia para integrar a equipe de recepção dos professores e demais colaboradores, que retornarão antes das crianças e adolescentes.
Com a chegada dos estudantes, eles vão promover rodas de diálogo para conversar sobre quem perdeu pessoas queridas – e como estão elaborando esse luto – bem como dialogar sobre as outras perdas: do contato com amigos e familiares, da relação com a rua e os territórios, a alteração da rotina, e o medo e insegurança que pairam por toda parte.
“Nossa maior estratégia de acolhimento é o trabalho coletivo. É ouvir as angústias de cada um e juntos buscarmos alternativas que possam ser viáveis para todos”, explica Euzeni Araújo, subsecretária de Gestão Educacional da Secretaria de Educação de Manaus.
Para as crianças, sobretudo, esse é um momento importante para terem seu luto reconhecido. “Os adultos tendem a achar que as crianças não vivem o luto e não entendem o que está acontecendo. Mas é possível fazer essa conversa, é só uma questão de adequar as falas ao desenvolvimento de cada uma”, orienta a psicóloga.
É importante garantir que os professores e estudantes possam se expressar por meio de diferentes linguagens, como pinturas e desenhos, representações e expressões corporais, fala e da escrita. Também vale oferecer diferentes oportunidades para fazer isso ao longo do tempo: rodas de conversa, leituras de livros, maratona de redações, realização de peças teatrais, e até um mural da escola, como o virtual do projeto A Palavra no Agora.
Durante o mês de julho, Manaus também promoveu uma pesquisa online com famílias, estudantes e professores sobre o retorno das atividades presenciais, e descobriram, dentre outros dados, que a maior parte deles não deseja retornar agora:
“Nós vamos partir dos resultados dessa pesquisa para elaborar o planejamento do retorno”, explica Euzeni, ressaltando que na construção de como seriam conduzidas as atividades pedagógicas remotas, a rede adotou a mesma postura, colaborativa e democrática.
Dentre as estratégias para a reabertura das escolas, a Secretaria já coloca em ação diversas estratégias de busca ativa, que envolvem a comunidade, para garantir que todos os estudantes voltem à escola.
E para que todos possam ter acesso às atividades remotas, desde já ou quando for implementado o sistema de rodízio da turma, a rede também está coletando doações de equipamentos eletrônicos para entregar aos estudantes que precisem. “Acolhimento também é não deixar ninguém para trás, é incluir a todos no processo de tomada de decisão, e reconhecer e ressaltar todo o trabalho e esforço dos professores, pedagogos e estudantes”, diz Euzeni.