publicado dia 17/11/2023

Em escola de Perus, livro “Vão” aproxima estudantes do seu território

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🗒️Resumo: A partir da obra Vão: trens, marretas e outras histórias, estudantes do 5º ano da EMEF Julio de Oliveira, no bairro de Perus, em São Paulo (SP), descobrem mais sobre seu território e identidades em projeto de Literatura.

Um projeto de Literatura na EMEF Julio de Oliveira, no bairro de Perus, no noroeste de São Paulo (SP), engajou os estudantes do 5° ano do Ensino Fundamental de maneira especial. Melissa, 10, retomou o gosto pela leitura e, para Felipe, 10, foi uma inspiração para continuar a escrever seu livro. 

“Eles mal chegavam na sala e já pediam para ler o próximo capítulo”, relembra Lidyane Rafaela Almeida Santos, professora da sala de leitura que conduziu o trabalho. Depois de ler a obra, a turma pesquisou a fundo sobre os temas centrais abordados e a biografia da escritora e produziu poesias autorais, apresentadas em um sarau da unidade.

Livro “Vão” disparou uma série de pesquisas e conversas na escola.

Crédito: Lidyane Rafaela Almeida Santos

O fator determinante para tanto envolvimento das crianças foi a escolha cuidadosa da obra: Vão: trens, marretas e outras histórias (Editora Patuá, 2021). O livro conta o cotidiano dentro dos trens de São Paulo pelos olhos e palavras de Jéssica Moreira, jornalista e escritora que nasceu e cresceu no mesmo bairro da escola e da maioria dos estudantes. 

“Escolhemos este livro por sua qualidade e porque é de uma escritora negra do nosso território. Foi muito impactante para as nossas crianças conhecerem mais sobre aqui, ver o trem, que eles e suas famílias usam tanto, por outra perspectiva, e saber que aqui também tem pessoas muito inteligentes. Elas têm essa impressão de que os livros são coisas distantes daqui”, conta Lidyane.

Tal percepção não é à toa. Os veículos de comunicação têm o histórico de retratar as periferias unicamente pelo viés das privações e da violência. “Eu fui uma adolescente que negou muitas vezes o local onde morava. Mais tarde, descobri que outros amigos das periferias também haviam feito isso para sobreviver nos meios onde estavam. Eu negava meu bairro porque não conhecia sua história”, diz Jéssica, que também é uma das fundadoras do site jornalístico Nós, mulheres da periferia

Convidada para uma roda de conversa mediada pelas crianças, conversaram sobre como é escrever um livro e a carreira de escritora, sobre o olhar criativo e crítico para o sistema de transporte público paulistano, os atravessamentos do racismo e as potências e ricas diversidades das periferias e suas populações.

“A roda de conversa foi emocionante e me deu a certeza de onde quero ver minha literatura: nas salas de aula de escolas públicas. Nesta escola, estudaram minha mãe, meu tio e meus primos. Minha mãe parou na 5ª série porque não tinha dinheiro para comprar os livros didáticos. Voltar nesse lugar é honrar minha mãe e, com as ferramentas que ela proporcionou a mim de estudo, devolver às crianças e à minha comunidade aquilo que aprendi”, afirma Jéssica.

Para a professora Lidyane, tal missão foi cumprida com sua turma. “Propiciou muitas conversas porque eles se sentiram representados no livro, eles e a família, e então compartilharam suas histórias no trem e no bairro. Também percebi que ver alguém de Perus em destaque foi um incentivo super favorável”, diz Lidyane, que agora busca caminhos junto à escola para imprimir o livro de Felipe e realizar seu sonho.

Durante as pesquisas que as crianças fizeram sobre a escritora, o estudante também descobriu que seu bisavô foi retratado em outra obra de Jéssica, Queixadas – por trás dos 7 anos de greve (Fapcom, 2013). O livro conta a história dos homens e mulheres que tiveram seus direitos trabalhistas negados pela Fábrica de Cimento Portland Perus e iniciaram a maior paralisação da história sindical do Brasil.

“É muito bom ter um bisavô que participou de uma coisa muito especial para Perus e ter isso em um livro”, afirma Felipe, que também disse ter gostado de conhecer uma colega escritora pela primeira vez.

“Quando me voltei ao meu bairro, descobrindo e contando suas histórias, eu entendi a importância do meu lugar para a história do Brasil. O que antes era ruim, virou importante. Entendi, desde a escrita de Queixadas, que o meu dever era ajudar as crianças e jovens a terem orgulho desse local, para que nenhum deles precisasse mais mentir sobre o lugar onde morava, como eu tive que fazer”, reflete Jéssica. 

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