publicado dia 12/08/2022
‘Se não escutar, como mudar a educação?’, diz educadora em evento sobre participação da comunidade escolar
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 12/08/2022
Reportagem: Ingrid Matuoka
“A educação integral é mais do que ficar o dia inteiro na escola, é passar mais tempo se desenvolvendo em todas as suas dimensões, com aprendizagens significativas que ajudam a se tornar um cidadão ativo, participativo e consciente. Na minha escola, a gente valoriza a participação de todos, promove saídas pedagógicas e projetos. Se todas as escolas pudessem focar na educação integral, teríamos uma sociedade mais pacífica e consciente”, disse Clara Siqueira Neumann, estudante do 8° ano na EMEF Martim Francisco e membro do grêmio estudantil da unidade.
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A fala foi feita durante o debate “A Participação da Comunidade Escolar na Garantia do Direito à Educação Integral”, que aconteceu em 11 de agosto, na Câmara Municipal de São Paulo (SP), e foi realizado pelo Fórum de Educação Integral para uma Cidade Educadora (FEICE).
A escola de Clara é uma das 195 unidades do município que fazem parte do Programa São Paulo Integral, que visa ampliar a jornada escolar a partir da concepção de educação integral. “Não é só mais tempo na escola, mas uma experiência qualificada de mais tempo na escola”, disse Renata de Lara Pereira Tamasi, do núcleo técnico de currículo da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SP).
“Não é só mais tempo na escola, mas uma experiência qualificada de mais tempo na escola”, disse Renata de Lara Pereira Tamasi
O Programa atende ao Plano Nacional de Educação (PNE) e ao Plano Municipal de Educação de São Paulo, que trazem entre suas metas a implementação e ampliação da educação integral na rede pública. “O PME foi construído a muitas mãos, como uma solicitação da nossa sociedade, e nós estamos aqui para fazer funcionar”, afirmou Renata.
Ela também destacou que, para o Programa São Paulo Integral funcionar, é fundamental que as escolas instituam conselho de escola, grêmio estudantil, associação de pais e mestres, associação de mediação de conflitos, assembleias de classe, e que todas essas pessoas sejam ouvidas sobre o que acham da adesão ao programa, o que funciona ou não, e a educação que desejam e que faz sentido para elas e para o território.
É assim que um mesmo programa de educação integral pode se adequar a cada contexto particular das escolas e das comunidades, para que não seja uma política pública padronizada que não garante adesão e sentido. “O território tem que estar em função de um projeto educativo e, para isso, tem que trazer a comunidade escolar para conversar. É uma construção, não surge de um dia para o outro”, explicou Renata.
Na experiência de Priscila Kodama, que é diretora da EMEF Emiliano Di Cavalcanti, é essencial que esses diálogos sejam representados no Projeto Político Pedagógico da escola.
“Quando começa a conversar, a escola se reconhece diante do PPP e passa a se articular em soluções baseadas na comunidade e no território educativo. Mas é importante lembrar que o Programa São Paulo Integral transforma soluções locais com diálogo construído na escola e na comunidade, só que isso não pode ser tratado como excepcionalidade”, destacou a gestora, que também indicou a necessidade de mais recursos humanos para atender ao Programa com qualidade e de toda a cidade melhorar as condições de transporte: “É um absurdo São Paulo se apresentar como cidade educadora e os estudantes não terem mobilidade”.
Melissa Ribeiro Saraiva, coordenadora do CRECE Central (Conselho de Representantes dos Conselhos de Escola), também reforçou a importância de fortalecer o PPP das escolas e sua construção participativa, bem como os processos democráticos para escolher e gerir o Programa. Na prática, ela afirma faltar a fomentação da participação da família e dos estudantes.
“A gestão sofre muita represália das DREs [Diretorias Regionais de Ensino], temos sentido muito isso em relação a promover essa participação. Um projeto de educação integral precisa ser discutido amplamente, ser apresentado para a escola, o conselho e depois vir à aprovação, em prazo mais estendido, mas não temos a fomentação dessa participação. Se não escutar, como mudar a educação?”, questionou Melissa.
“Não podemos aceitar a terceirização nas nossas escolas”, defendeu Melissa Ribeiro Saraiva
Para ela, falta ainda garantir que todos os colaboradores da escola sejam contratados por concurso público a fim de evitar a alta rotatividade que impede a eles conhecer mais profundamente o contexto e a comunidade, bem como a construção de vínculos significativos com os estudantes. “Não podemos aceitar a terceirização nas nossas escolas”, defendeu.
Encerrando o evento, Carlos Eduardo Fernandes Junior, coordenador pedagógico da EMEF Espaço de Bitita, que abriu os debates lendo a “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!”, afirmou que “ou a gente senta e conversa e entende os argumentos do outro, o que está todo mundo passando, ou vai continuar falando sozinho, como tem sido a nossa realidade no Brasil nos últimos anos”.