publicado dia 05/09/2019
Bolsonaro defende impor escolas cívico-militares
Reportagem: Natália Passafaro
publicado dia 05/09/2019
Reportagem: Natália Passafaro
O governo federal lançou hoje (5) o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim). Com o objetivo de promover a melhoria na qualidade do ensino na educação básica, a meta é implementar 216 escolas em todos as unidades da federação até 2023.
As escolas cívico-militares são instituições não militarizadas, mas com uma equipe de militares da reserva no papel de tutores. Em julho, o Ministério da Educação (MEC) já havia anunciado a implementação de 108 escolas nesse modelo, no âmbito do Compromisso Nacional pela Educação Básica. Agora, a meta foi dobrada.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, destacou que as escolas cívico-militares têm um desempenho muito acima da média e são instrumento para a melhoria da educação no país. Segundo ele, a meta é criar 216 escolas, mas o desafio é ter 10% de todas as escolas brasileiras no modelo cívico-militar até o final do governo.
“As famílias sentem muito mais segurança em deixar seus filhos nas escolas, o ambiente é muito mais seguro, a camaradagem entre os colegas é melhor, eu realmente tenho virado fã desse modelo”, disse.
Leia+: Desvalorização da escola pública opera pela militarização e privatização da educação
Para Bolsonaro, o bom desempenho das escolas cívico-militares está ligado à disciplina dos alunos. “Tem que botar na cabeça dessa garotada a importância dos valores cívicos-militares, como tínhamos há pouco no governo militar, sobre educação moral e cívica, sobre respeito à bandeira.”
Segundo Andressa Pellanda, coordenadora executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a afirmação do presidente preocupa por remeter a como essa disciplina era lecionada na ditadura. “Há muitas pesquisas que demonstram como essa educação é necessária quando voltada para princípios democráticos e como prática da liberdade, mas extremamente prejudicial quando se torna doutrinária e censuratória”.
De acordo com o MEC, os militares atuarão na disciplina dos alunos, no fortalecimento de valores éticos e morais, e na área administrativa, no aprimoramento da infraestrutura e organização da escola e dos estudantes.
As questões didático-pedagógicas continuarão atribuições exclusivas dos docentes, sem sobreposição com os militares, e serão respeitadas as funções próprias dos profissionais da educação, que constam na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
“Há não somente um desvio de função das forças armadas quando passam a atuar em escolas, como não há preparo e formação pedagógico desses funcionários para serem educadores”, explica Andressa.
“O programa tenta separar o que seria a gestão da escola e a gestão comportamental da parte didática. As primeiras ficariam a cargo dos militares e a segunda dos professores. Isso denota uma completa falta de compreensão sobre a educação: em uma escola, da gestão à merendeira, todos são educadores.”
A implantação das escolas cívico-militares vai ocorrer preferencialmente em regiões que apresentam situação de vulnerabilidade social e baixos índices no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Entre as premissas do programa estão a contribuição para a melhoria do ambiente escolar, redução da violência, da evasão e da repetência escolar.
De acordo com relatório do Conselho Nacional de Entidades da CNTE, as escolas militares limitam os princípios constitucionais do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, falhando com a missão de cumprir os três objetivos nucleares da educação: o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Para Bolsonaro, entretanto, a depender do desempenho dos alunos, a implantação da escola cívico-militar pode ser imposta. Ele citou o caso do Distrito Federal, onde o modelo foi adotado em quatro escolas, em parceria com a Polícia Militar.
“Vi que alguns bairros tiveram votação e não aceitaram. Me desculpa, não tem que aceitar não, tem que impor”, disse. “Não queremos que essa garotada cresça e vai ser, no futuro, um dependente até morrer de programas sociais do governo.”
De acordo com Andressa, o programa infringe o princípio de gestão democrática: primeiro pela “imposição”, nas palavras do próprio presidente, da política para as escolas; e, segundo, pelo modelo de gestão adotado pelas escolas militares. “Há não somente um desvio de função das forças armadas quando passam a atuar em escolas, como não há preparo e formação pedagógico desses funcionários para serem educadores.”
Neste ano, 54 escolas serão contempladas com o programa, em formato piloto, duas em cada unidade da Federação. A indicação das instituições deverá ser feita pelos estados até 27 de setembro. Os colégios devem ter de 500 a mil alunos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental e/ou médio.
Leia também: Por que o conservadorismo avança sobre as escolas?
O Ministério da Defesa vai destacar militares da reserva das Forças Armadas para o trabalho de tutores. Eles serão contratados por até dez anos e vão ganhar 30% da remuneração que recebiam antes de se aposentar. Os estados poderão ainda destinar policiais e bombeiros para ajudar na administração das escolas.
O MEC investirá R$ 1 milhão por escola, para o pagamento dos militares, melhoria da infraestrutura das unidades e materiais escolares.
“A demanda por escolas militares a que o presidente se refere está muito mais ligada à demanda por escolas de melhor qualidade que por escolas militarizadas”, explica Andressa.
“Ou seja, o que deveria estar sendo feito é um melhor investimento do governo federal em escolas de educação básica – em um esforço solidário com estados e municípios – em vez de toda essa ação de militarizar escolas”, finaliza.
Com informações Agência Brasil
Publicado às 14h30 e atualizado às 15h45