publicado dia 16/11/2021
PEC dos Precatórios vai ao Senado; o que isso tem a ver com os professores?
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 16/11/2021
Reportagem: Ingrid Matuoka
No último dia 9/11, a Câmara dos Deputados aprovou a PEC 23/2021, também conhecida como a PEC dos Precatórios. Proposta pelo Poder Executivo, ela limita o valor de despesas anuais com precatórios, corrige seus valores exclusivamente pela taxa Selic, muda a forma de calcular o teto de gastos e traz impactos para professores de algumas redes públicas estaduais e municipais. Agora, o texto será enviado ao Senado Federal para votação.
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Os precatórios são dívidas que a União, Estados ou Municípios devem pagar a pessoas físicas e jurídicas. Quando a decisão judicial é definitiva, o precatório é emitido e passa a fazer parte da programação de pagamentos do governo federal. Muitas dessas pessoas que aguardam o recebimento do dinheiro, há 15 anos, são funcionários públicos, como professores, trabalhadores da Saúde, entre outros.
“A agenda para os direitos humanos é o fim dessas políticas de austeridade e o investimento massivo nos serviços públicos”, avalia Andressa Pellanda.
A PEC aprovada na Câmara permite o adiamento e parcelamento dessas dívidas, que somam quase 90 bilhões de reais, e deveriam ser pagas no ano que vem. Assim, o governo abre espaço no Orçamento para o Auxílio Brasil, política assistencialista que substitui o Bolsa Família e tem prazo para acabar: após as eleições de 2022.
“O Auxílio Brasil é uma proposta bem pior que o Bolsa Família, com vários penduricalhos e menos estrutural. Usa-se bilhões de reais em emendas do orçamento secreto para votar uma proposta de furo na austeridade? A única coerência disso é uma razão profundamente eleitoreira e de interesse privado. Não tem proposta de agenda de direitos humanos, porque a agenda para os direitos humanos é o fim dessas políticas de austeridade e o investimento massivo nos serviços públicos”, avalia Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Dos quase 90 bilhões de reais em precatórios, ao menos 16 bilhões são referentes à dívidas que a União tem com os estados do Amazonas, Bahia, Ceará e Pernambuco, por conta de um erro do governo no repasse de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que vigorou de 1997 a 2006 e depois foi substituído pelo Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb), o principal fundo de financiamento da educação básica no país.
Parte desses recursos deverá ser destinada a professores, de acordo com a Lei 14.057/2020, que garante 60% dos precatórios do Fundef para os docentes. Pelas novas regras, esses precatórios devem ser pagos em três anos: 40% no primeiro ano e 30% em cada um dos dois anos seguintes.
“Esses recursos são parte do orçamento que já era de direito de profissionais da educação, não é um bônus, é uma dívida. Em um país em que não se valoriza o professor e que é o último colocado em relação aos países da OCDE acerca de salário docente, aprovar essa PEC é mais um atestado de negação dos direitos trabalhistas desses profissionais”, diz Andressa.
Essa não é a primeira vez que recursos destinados à Educação são desviados em favor de outros interesses. Sobretudo nos últimos cinco anos, medidas de austeridade e reformas trabalhista, tributária e administrativa têm reforçado desigualdades estruturais e precarizado o trabalho dos servidores públicos.
É o que mostra o estudo “Não é uma crise, é um projeto: os efeitos das Reformas do Estado entre 2016 e 2021 na educação”, produzido pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, com apoio da organização internacional ActionAid, e com colaboração técnica da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), da Plataforma DHESCA, e da coalizão Direitos Valem Mais.
“Desde os primeiros cortes com Joaquim Levy em 2015, com um aprofundamento abissal da austeridade a partir da EC 95 do Teto de Gastos, sob Temer, e com a agenda de cortes e redução do Estado que seguiu no governo Bolsonaro, o projeto que está em curso no país é um projeto de estado mínimo, que está preocupado com 1% da população, da especulação financeira. Os direitos humanos estão todos escanteados e a educação é uma das que mais sofre com essa agenda, mas saúde e assistência estão também à deriva, como podemos ver em termos de mortes por covid-19 e por fome e pobreza no país”, explica Andressa.
O estudo da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação sistematiza informações essenciais e analisa as justificativas apresentadas para as medidas, além de compilar contra-argumentos que indicam os impactos e riscos das reformas para as áreas sociais e, mais detidamente, para a Educação.
“Como disse Darcy Ribeiro, a crise sempre foi um projeto na Educação no Brasil. Hoje, talvez, vejamos, todos os dias, a materialização dessa premissa em um governo que não tem um mínimo de responsabilidade com o povo, pelo contrário, age contra ele e em favor de seus interesses privados”, finaliza.
*Com informações e foto da Agência Câmara de Notícias