publicado dia 09/03/2021
Ensino híbrido promove o desenvolvimento integral dos estudantes; saiba como funciona
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 09/03/2021
Reportagem: Ingrid Matuoka
O ensino híbrido não é novo, mas ganhou os holofotes com o início da pandemia no Brasil. Superficialmente, a abordagem é compreendida como uma mescla entre ensino presencial e remoto, mas a proposta vai muito além disso. “O ensino híbrido deve promover o protagonismo e a autonomia dos estudantes e permitir a personalização do ensino”, explica Lilian Bacich, diretora da Tríade Educacional e autora do livro “Ensino Híbrido: Personalização e Tecnologia na Educação“.
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Assim, essa abordagem implica em associar atividades presenciais com as que o estudante realiza em outros ambientes, preferencialmente mediadas por recursos tecnológicos, que engajam as crianças e adolescentes e promovem o letramento digital. Essas dinâmicas podem alternar, por exemplo, entre um debate sala de aula e um projeto no laboratório de informática, ou entre uma investigação em uma praça e pesquisas em casa.
O importante é que os dois momentos dialoguem entre si e contribuam para o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes. “Essa abordagem aproveita diferentes espaços e estratégias que se complementam, incentivando que os estudantes, enquanto protagonistas de sua aprendizagem, mobilizem diferentes conhecimentos e habilidades”, elucida João Paulo Cêpa, consultor e especialista em currículo da Fundação Lemann.
O especialista, que atualmente é consultor pedagógico de 28 redes educacionais de todo o Brasil, afirma que o ensino híbrido é a grande aposta de várias secretarias, tanto por ser uma transição gradual entre o remoto e o presencial, quanto por permitir a personalização do ensino, necessária principalmente por dois motivos: para acompanhar a flexibilização curricular, que visa definir as aprendizagens essenciais de 2020 que precisam ser retomadas agora para permitir que os estudantes sigam aprendendo, e para dar conta das desigualdades, que vão desde os diferentes modos que a pandemia impactou as redes e as escolas, até os estudantes de uma mesma turma.
“Experiências no Reino Unido e na França mostram escolas operando em modelos diferentes de acordo com a situação local, à luz dos dados da Saúde. Então temos o desafio de flexibilizar a oferta pedagógica de acordo com as necessidades específicas de cada escola e turma, permitindo modelos diferentes e alternando entre eles quando preciso”, orienta João Paulo.
Para implementar o ensino híbrido nas redes, é preciso formação dos professores para trabalhar com a abordagem.Também é necessário estabelecer diretrizes claras e um trabalho intersetorial fortalecido para que as áreas se comuniquem e promovam a vigilância epidemiológica nessas escolas a fim de alterar o modelo de funcionamento quando necessário. Assim, se uma escola apresenta casos de coronavírus, pode rapidamente conter e monitorar essas pessoas para bloquear novas transmissões e avaliar a necessidade de retornar algumas turmas ao ensino remoto por um período ou a escola inteira.
“É preciso fazer tudo isso garantindo equidade e boas oportunidades de aprendizagem. Tudo que a gente não quer é que os alunos que estão na escola tenham oportunidade melhores do que aqueles que não podem estar na escola”, diz o especialista.
Uma das principais características do ensino híbrido é permitir a personalização do processo de ensino e aprendizagem. Ao avaliar os níveis de conhecimento e habilidades da turma, o professor pode melhorar as experiências que promove. O primeiro passo desse processo é promover uma avaliação diagnóstica dos estudantes. “Com esses dados em mãos, podemos planejar as ações coletivas e individuais”, diz Lilian.
Essa foi a estratégia da EMEF (Escola Municipal de Ensino Fundamental) Gastão Vieira, em Açailândia (MA) que, com o aval da Saúde, está operando desde fevereiro com o ensino híbrido e rodízio semanal dos estudantes — enquanto metade de uma turma vai à escola, a outra estuda de casa. Após promover o diagnóstico, criou-se uma ficha individual para estabelecer as estratégias específicas de intervenção e acompanhar o desenvolvimento dos estudantes no decorrer do ano. Esse diagnóstico auxiliará os educadores, inclusive, caso seja necessário retornar ao ensino remoto novamente.
Em relação ao ensino híbrido, a escola adotou o modelo de rotação individual. O professor trabalha alguns temas em sala de aula ao longo da semana e prepara um roteiro de experiências para desenvolverem em casa, e que podem ser adaptadas de acordo com a avaliação diagnóstica inicial e as necessidades específicas de cada indivíduo ou grupos de estudantes.
Como exemplo, Jason de Souza Santos, supervisor escolar da EMEF Gastão Vieira, menciona o trabalho feito com lendas. Na escola, os estudantes leem juntos, debatem e estudam o gênero literário e questões de gramática e ortografia. Em casa, são desafiados a reescreverem o texto com suas próprias palavras, a gravarem um pequeno vídeo contando e interpretando a história e a pesquisar outras lendas. Os professores depois recebem e avaliam essas atividades. Com o grupo de estudantes de volta à escola na outra semana, o educador retoma conceitos fundamentais e avança.
Até 7 de março, o município de Açailândia (113 mil habitantes) registrava 5 mil casos de Covid-19 e 107 óbitos desde o início da pandemia.
“Para fazer tudo isso dar certo, de forma segura, preparamos a escola do ponto de vista sanitário, fizemos formações com os professores, convidamos as famílias para visitar a escola, conhecer as medidas [de biossegurança] e o ensino híbrido e falarem sobre seus medos e dúvidas. Com isso, a maioria das famílias topou o retorno, e os que preferiram manter o ensino remoto recebem os roteiros de experiências e estudos”, conta Jason.
Nesse contato com as famílias, a equipe também aproveitou para recomendar jogos e aplicativos pedagógicos gratuitos para que as crianças aprendam brincando em casa. “Jogos como o GraphoGame aproximam as crianças da cultura digital e do universo leitor”, explica o supervisor escolar.
Os modelos de ensino híbrido são divididos em dois agrupamentos. Os modelos sustentáveis aprimoram as práticas educacionais já existentes e os disruptivos propõem uma inovação em relação a essas práticas de ensino. Cabe a cada rede ou escola diagnosticar a realidade de sua comunidade escolar para planejar a melhor forma de trabalhar. “Gerar experiências de aprendizagem que se alinhem às necessidades dos estudantes é o que mais impacta a aprendizagem no ensino híbrido”, afirma Lilian.
A nota técnica “Ensino Híbrido e o uso das tecnologias digitais na educação básica“, do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb) em parceria com a Tríade Educacional, da qual Lilian é diretora, traz orientações para implementação da abordagem e apresenta alguns modelos de ensino híbrido. Abaixo, um resumo dos formatos mais conhecidos:
Sala de aula invertida
Em casa, as crianças e adolescentes estudam um conceito com base em orientações do professor. De volta à escola, realizam atividades e desafios para aplicar os conhecimentos estudados previamente e tirar dúvidas.
Rotação por estações
Nesse modelo, são preparadas estações de aprendizagem diferentes. Elas podem ficar em uma mesma sala de aula ou em vários espaços da escola e dos arredores. Os estudantes circulam por cada estação e realizam uma atividade que é complementar à outra, contando com a mediação do educador.
Laboratório rotacional
Enquanto um grupo está na sala com o professor e podem tirar dúvidas e promover debates, outro fica em casa ou no laboratório de informática da escola desenvolvendo tarefas de forma autônoma.
Rotação individual
O professor prepara um roteiro de estudos que contempla os desafios e potencialidades daquele grupo de estudantes, para que os alunos desenvolvam em casa ou em outro ambiente. De volta ao grande grupo presencial, avançam na construção de conhecimentos e nas possibilidades que a coletividade e presencialidade oferecem.
Afinal, o que é o ensino híbrido?
O que o uso das tecnologias digitais no ensino remoto evidencia sobre o futuro da escola
Palestra de Lilian Bacich sobre a formação de professores para o ensino híbrido
Curadoria especial da Aprendendo Sempre, com materiais e recursos para apoiar professores e gestores a promoverem o ensino híbrido em suas escolas e redes
Canal do Youtube Ensino Híbrido, coordenado por Lilian Bacich, Adolfo Tanzi Neto e Fernando Trevisani
Realizado pelo Centro de Referências em Educação Integral, em parceria com diversas instituições, a campanha #Reviravolta da Escola articula ações que buscam discutir as aprendizagens vividas em 2020, assim como os caminhos possíveis para se recriar a escola necessária para o mundo pós-pandemia.
Leia os demais conteúdos no site especial da #Reviravolta da Escola.