publicado dia 03/10/2022

Educação integral demanda PPP participativo; conheça duas experiências de redes escolares

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Parte fundamental de qualquer programa de Educação Integral, seja em jornada ampliada ou não, é a gestão democrática. Isso significa envolver estudantes, professores(as), funcionários(as), famílias e a comunidade nas tomadas de decisões da escola, a fim de garantir que ela faça sentido para as pessoas envolvidas. E é o Projeto Político Pedagógico (PPP) que pode reunir e consolidar essas diferentes vozes e desejos.

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O PPP de uma escola é um documento vivo, em constante construção e revisão, conforme muda o contexto e as demandas de todas as pessoas envolvidas no fazer educativo. Além de contar o percurso de uma instituição, ele também fala sobre quem são os sujeitos e qual é a orientação de todo o trabalho pedagógico. Em suma, ele conta por que essa escola existe e trabalha de determinada maneira.

Por sua importância central para a efetivação de programas de Educação Integral, as redes de Educação de Nova Viçosa (BA) e Diadema (SP) instituíram processos de construção participativa dos PPPs de suas escolas.

Eliene Santos Nascimento, coordenadora de projetos na Secretaria Municipal de Educação de Nova Viçosa, conta que todos os municípios baianos estão passando pelo mesmo processo e ela foi responsável por articular esse trabalho com as 36 escolas de Nova Viçosa que, desde 2019, trabalham a partir da concepção de Educação Integral. 

Para começar, cada unidade criou um comitê gestor, que conta com a presença da dupla gestora e de professores, coordenadores, funcionários, famílias e estudantes eleitos por eles próprios. Esse grupo participou de lives formativas realizadas pela Undime, Uncme e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) – com apoio da Secretaria Estadual de Educação – sobre alguns conceitos-chave, como o que é a gestão democrática e para que serve um PPP. Também houve uma reunião com a participação de todos os comitês do município com a Secretaria para trocarem e apresentarem suas descobertas, desafios e desejos. 

“Reforçamos sempre a importância de uma escuta sensível de todos e todas, bem como demos todo o suporte necessário, como fazer aulas mais curtas para que os professores e estudantes pudessem se reunir”, conta Eliene.

Agora, os comitês partem do currículo municipal para estudar e discutir o lugar que a escola ocupa em um mundo globalizado, diante de uma pandemia e de uma sucessão de crises no país. A partir disso, analisam e definem que tipo de homem, mulher, escola e sociedade a comunidade deseja. Em seguida, vão debater as dimensões em que as unidades têm mais dificuldades para alcançar os objetivos esperados e como resolvê-las.

“As escolas se esmeraram em fazer um trabalho bonito de sensibilização, com a participação de todos. Em novembro, esperamos ter o PPP criado a partir de cada comunidade escolar. Que ribeirinhos, quilombolas, e as escolas urbanas, periféricas e centrais expressem nesse documento os seus objetivos, as suas realidades, e como desejam formar um cidadão integral, mais humanizado, capaz de transformar o que temos de mais complexo hoje na nossa sociedade, como o racismo, o preconceito, a misoginia e o individualismo”, afirma Eliene.

“Todos precisam ser ouvidos e ter voz de maneira igualitária, propositiva, respeitando as diferenças”, afirma Núbia Adriana Rodrigues Santana

Essa construção coletiva e a intensa participação de todos, explica a gestora municipal, é o que contribui para que cada um se comprometa com a transformação da escola e da comunidade. “Vai além de um projeto de Secretaria ou de governo – é uma escola de cada comunidade, como pede a Educação Integral – e é no PPP que isso pode ser consolidado”, diz. 

Núbia Adriana Rodrigues Santana, coordenadora pedagógica da EMEF Raul Gazzinelli, conta que para estruturar o trabalho de revisão do PPP em sua unidade, o comitê realizou muitas rodas de conversas, entrevistas e questionários para conhecer todos os atores e atrizes envolvidos na escola. “Todos precisam ser ouvidos e ter voz de maneira igualitária, propositiva, respeitando as diferenças”, afirma Núbia.

Ela também relata notar a satisfação de todos em participar do processo, em ser ouvido. “Estão todos acreditando que esse momento trará mudanças significativas para a escola pública, o desenvolvimento educacional e, consequentemente, a construção do indivíduo cidadão”, pontua. 

Já em Diadema (SP), que possui 60 unidades escolares, o trabalho com a Educação Integral teve início em 2008 e avançou até 2012, quando foi interrompido, para ser retomado somente em 2021. “Foi um trabalho para resgatar essa experiência baseada no programa Mais Educação”, conta Ana Lucia Sanches, Secretária Municipal de Educação do município.

A construção de PPPs participativos em cada escola fez parte dessa retomada. Para começar, cada unidade organizou visitas ao bairro com todas as pessoas da escola e famílias. 

Nesse reconhecimento do território e mapeamento socioterritorial, conheceram as oportunidades e as vulnerabilidades da comunidade. Isso porque cada região tem suas especificidades – em um dos bairros de Diadema há, por exemplo, uma taxa alta de analfabetismo. “Isso permite que cada escola e a Secretaria de Educação entenda melhor qual contribuição ela pode dar para as pessoas que a frequentam”, explica a gestora. 

Além das visitas, cada escola também realizou processos de escuta de sua comunidade, com entrevistas, questionários e rodas de conversa. “Uma das coisas que percebemos é que muitas das nossas crianças não tinham áreas para brincar em casa e percebemos a importância de nossa escola proporcionar isso para elas”, relata Kelly Teixeira, coordenadora pedagógica da EMEB José Bento Monteiro Lobato.

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Eleição do Conselho Curumim. Créditos: Kelly Teixeira

Na unidade, a escrita participativa do PPP já era realidade. A participação das famílias e dos estudantes faz parte da rotina, com reuniões periódicas para compartilhar o trabalho pedagógico e as ações da escola, bem como para ouvir as demandas e opiniões das famílias. Já as crianças participam por meio do Conselho Curumim, em que as turmas elegem representantes de sala responsáveis por participar das decisões da escola. A partir dessas conversas, o PPP da unidade é escrito e reescrito constantemente.

“Essa escola existe há 30 anos com bastante participação de toda a comunidade escolar e do território. Um dos resultados disso é que nunca tivemos invasões, vandalismos e tudo o que solicitamos, todos se envolvem”, conta Mariusa Calzzetta, diretora da unidade. 

Em relação ao processo que Diadema vive agora em rede, após cada unidade escrever seu PPP de forma participativa, toda a comunidade escolar vai se reunir para validar as propostas. 

Para a gestora da Secretaria de Educação de Diadema, ter todas as escolas da rede construindo suas próprias identidades e projetos permite à gestão central uma visão mais detalhada de cada realidade, o que facilita a articulação intersetorial das políticas públicas para efetivar direitos. 

“Com isso, a gestão pública pode se organizar a partir dos planejamentos das escolas – definir prioridades, cronogramas, recursos – apoiar a proteção integral e garantir cada escola tenha autonomia”, diz Ana Lucia. 

Com os PPPs consolidados, o desafio vai ser implementá-los. “Para alcançar uma Educação Integral, todos têm que trabalhar juntos, e o PPP é, também, uma pactuação da conversa entre escola e secretaria. É essa vontade coletiva de que a coisa dê certo, tão urgente agora, com a crise e a pandemia, que pode garantir a efetivação dos projetos”, diz Ana Lucia.

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