publicado dia 17/09/2018
Educação indígena: professores de etnias presentes em SP elaboram curso de licenciatura
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 17/09/2018
Reportagem: Ingrid Matuoka
O estado de São Paulo terá seu primeiro curso de formação de professores inteiramente elaborado por indígenas. Mais de 20 lideranças vêm se reunindo desde agosto em prol de uma educação indígena que articule conteúdos curriculares à cultura e história de cada uma das cinco etnias existentes no estado – Guarani, Tupi, Krenak, Terena e Kaingang.
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A demanda foi estruturada pelo Fórum de Professores Indígenas do Estado de São Paulo (FAPISP) e acolhida pela Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp) sob a forma de um curso de extensão, que deverá ser elaborado durante os anos de 2018 e 2019 pelo grupo de trabalho “Por uma licenciatura indígena no Estado de São Paulo”.
O desejo por uma formação específica e diferenciada para professores que atuam em escolas indígenas é antigo. Catarina Kunhã Nimbopyrua, da aldeia Piaçaguera, pioneira na educação indígena e anciã do povo Tupi-Guarani, explica que desde os anos 80 as lideranças discutem a necessidade, o formato e a utilidade de escolas em aldeias.
“Antigamente, os indígenas brigavam com arco e flecha. Hoje, a escola serve para brigar com o lápis pelos nossos direitos. Por isso, esse curso de licenciatura é uma ferramenta para criarmos a nossa escola, que trabalhe nossas culturas e vivências nas florestas junto aos saberes dos juruá, os não-indígenas, e permita que a gente faça a nossa transformação”, diz Catarina.
Poty Poran Carlos, uma das docentes indígenas coordenadoras do grupo de trabalho, lembra que todas as reivindicações estão amparadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e que o curso atenderá a diversidade cultural e identitária, respeitando também as realidades linguísticas da comunidade — fatores que a pedagogia comum não abrange.
Em São Paulo, há 1.400 indígenas matriculados na Educação Básica. Dos 252 professores nas aldeias do estado, 139 (55,2%) não têm Ensino Superior.
“A maioria dos nossos alunos não quer ser formada necessariamente para o mercado de trabalho. Quer outros caminhos como ficar na aldeia e aprender as atividades de subsistência. Mas também poder circular no mundo juruá e saber lidar com o que não é da aldeia: ir até a cidade, ler as placas e contratos, o transporte, e mexer com dinheiro”, diz Poty.
Quando pronto, o curso será apresentado para as universidades paulistas. O objetivo é propor que elas acessem verbas do Ministério da Educação (MEC) voltadas para cursos de formação de indígenas.
“Eu aprendi com os meus pais que nos tornamos mais sábios quando conhecemos e respeitamos várias culturas, vários saberes, inclusive a nossa própria. E é isso que queremos com esse curso”, frisa Catarina.