Como articular as famílias e a comunidade local ao projeto educativo da escola?
Publicado dia 11/04/2015
Publicado dia 11/04/2015
Fortalecer a integração da escola com o território no qual está inserida, visando maior participação das famílias e representantes da comunidade local na construção e execução do seu Projeto Político Pedagógico. Este deve ser o objetivo das estratégias de articulação das escolas com os famílias dos estudantes e parceiros da comunidade.
Afinal, o engajamento da comunidade local no projeto educativo das escolas contribui para que esta assuma, junto com cada unidade de ensino, a responsabilidade pelo desenvolvimento integral de sua população, condição necessária para a construção de uma educação voltada para a cidadania, a convivência e os valores democráticos.
Para tanto, a escola deve constituir uma instância de gestão local, que agremie os familiares e comunidade do entorno a fim de envolvê-los no planejamento e execução de ações que contribuam para a melhoria tanto da escola, quanto da própria região. A proposta inclui quatro etapas: a constituição de um Comitê Local; a realização de um diagnóstico das práticas educativas da escola; um mapeamento das oportunidades educativas do território e a elaboração de um plano de ação para melhoria da educação na escola na perspectiva da integração escola-comunidade.
O Comitê Local é uma instância articulada pela escola e que tem por objetivo integrar diferentes atores do território em que está situada para pensar os desafios da escola e elaborar ações e estratégias para melhorá-la.
O território a ser considerado inclui a escola e o conjunto dos serviços, programas, projetos e equipamentos das políticas públicas de educação, cultura, assistência social e Sistema de Garantia de Direitos, esporte, educação ambiental, ciência e tecnologia. Além disso, considera-se também o conjunto de atores sociais presentes neste espaço, tais como ONGs, associações comunitárias, clubes de mães, associações comerciais, entre outros.
Para que a participação no Comitê seja representativa, sugere-se que este seja composto de forma equilibrada por familiares dos estudantes, professores, monitores, funcionários, gestores, coordenadores, interlocutores da comunidade e alunos, a fim de garantir uma maior capacidade de promover sinergias sobre os anseios coletivos quanto à educação das crianças, adolescentes e jovens, bem como quanto ao levantamento dos desafios específicos da realidade a ser enfrentada.
Propõem-se encontros regulares, no mínimo mensais, abertos continuamente à entrada de novos participantes. Além disso, recomenda-se que sejam feitos e compartilhados registros destes encontros e ações realizadas, com pessoas e representantes do território que, por alguma razão, não puderam participar do processo como um todo.
Em um primeiro momento, é fundamental que o grupo reunido possa debater e construir um propósito comum voltado para a garantia da educação naquele território, tendo como orientação perguntas tais como “que escola queremos” ou “que educação queremos oferecer para nossas crianças, adolescentes e jovens?”. Uma dinâmica interessante para ser utilizada neste momento é a “Árvore dos Sonhos”, que utiliza a analogia de uma árvore, com suas raízes, tronco e folhas para identificar as potencialidades, desafios e sonhos daquele grupo com relação ao projeto educativo para a escola. Esta atividade contribui para construir no grupo o senso de coletivo, na medida em que parte dos anseios de cada um para a construção de um projeto comum.
Para convocar os participantes, é essencial identificar dentro da comunidade escolar os melhores canais de comunicação a fim de convidar professores, gestores e colaboradores em geral, além de estudantes, famílias e interlocutores da comunidade próxima para fazerem parte deste processo. As formas de convite são variadas, por meio de reuniões profissionais específicas, conversas individuais, visitas a espaços institucionais, elaboração de boletins informativos, uso de sites, blogs, jornais, murais locais e outras formas criadas no próprio processo, esclarecendo, sempre e de forma objetiva, as razões desta iniciativa tomada pela escola.
Veja como aplicar a metodologia da Árvore dos Sonhos.
A tarefa de articular o Comitê Local deve, inicialmente, ser assumida pela direção da escola, mas pode ser compartilhada ou delegada para o coordenador pedagógico ou outro profissional que tenha disponibilidade e interesse em ser o responsável por fazer esta articulação e assumir a coordenação da instância. Nas escolas que participam do Programa Mais Educação ou programas de educação integral semelhantes, a articulação para a constituição do Comitê e a coordenação dos encontros deverá ser de responsabilidade do professor comunitário ou professor articulador – profissional que compõe a equipe de educadores e que é o responsável pela integração da escola ao território.
Feito este primeiro encontro, no qual se define esse sonho ou desejo comum, é preciso desenhar os caminhos para torná-lo uma agenda concreta, com etapas e metas. Embora não exista um único roteiro para esse processo, há algumas ações que podem fortalecer o grupo, ajudando-o a entender melhor seu papel na construção do projeto educativo da escola. Estas ações serão descritas nas próximas etapas.
A primeira ação a ser realizada pelo Comitê Local deve ser um diagnóstico das práticas educativas da escola. Isso porque a realização do diagnóstico e sua análise permitem o planejamento de ações e estratégias que visam a superação dos desafios educativos locais identificados – que são o objetivo deste grupo.
O diagnóstico deverá levantar informações sobre a realidade percebida pelos representantes do Comitê Local acerca dos seguintes aspectos:
• o processo educativo
• o ambiente escolar
• as relações estabelecidas na comunidade escolar
• a apreciação sobre as disciplinas
• o uso de equipamentos
• o conhecimento sobre a comunidade próxima à escola
• a visão da escola a respeito da aproximação entre família e escola
• o acesso a lazer e cultura e aos demais direitos.
O roteiro com as perguntas e a metodologia que orientarão o diagnóstico deverão ser elaborados pelo coordenador do Comitê Local. Como há muitos elementos para serem avaliados, indicamos alguns instrumentos que podem ser utilizados como referência:
– Indicadores da Qualidade da Educação
– Diagnóstico Socioterritorial do Bairro-escola
Com o instrumento preparado, o Comitê Local se reunirá para discutir e responder as questões. Após respondê-las, o grupo deverá realizar uma análise dos dados, pois é a análise que permitirá identificar a real situação da escola. Para tanto, sugerimos que sejam observados aspectos relativos aos seguintes eixos:
• processos de tomada de decisão participativos e transparentes, de forma a garantir instâncias de gestão participativas, divulgação das decisões, participação estudantil;
• participação ativa das famílias e dos agentes locais, tanto nas instâncias de tomada de decisão quanto no apoio e desenvolvimento de atividades formativas, de avaliação e outras;
• oportunidades educativas diversificadas e articuladas à proposta político-pedagógica da escola, incluindo a organização de tempos e espaços, estratégias e metodologias de aprendizagem, valorização da cultura, das novas mídias e dos saberes locais;
• processos educativos centrados nos estudantes, considerando os saberes, os desejos, as necessidades e valorizando a identidade cultural, étnica e de gênero de cada sujeito;
• integração com o território, com o envolvimento da escola nas questões locais e utilização do território como espaço de aprendizagem.
A análise do diagnóstico a partir destes eixos favorece a visualização dos pontos fortes e das fragilidades da escola em relação a sua capacidade de executar um projeto educativo que realmente valorize os processos participativos e democráticos e a integração dos diferentes atores da comunidade escolar e do entorno, de forma a constituir-se numa escola articuladora da educação no território.
Feita a análise, o resultado destas informações é sistematizado e compartilhado com a comunidade escolar e a comunidade local. Os públicos sugeridos para o compartilhamento destes conteúdos são:
• Para o Conselho Escolar, em momento agendado para esta finalidade;
• Para os demais professores da escola, nas reuniões regulares de equipe;
• Para as famílias, em reuniões de pais;
• Para os estudantes, em encontros coletivos pontuais ou em sala de aula, encontros do Grêmio Estudantil, ou outras formas sugeridas pelas escolas;
• Para parceiros da escola em encontros agendados para esta finalidade.
Com isso, espera-se proporcionar aos diversos atores locais envolvidos nesta nova dinâmica de integração um panorama da situação da aprendizagem na escola, a fim de que estes possam se mobilizar para colaborar na definição de estratégias coletivas para a promoção da aprendizagem no território, fortalecendo e validando o próprio Comitê Local como instância de tomadas de decisão da escola.
A próxima ação a ser realizada pelo Comitê Local será um mapeamento das oportunidades educativas do território. O mapeamento é uma atividade para encontrar espaços e organizações que possam contribuir com a educação, e é também uma ação de mobilização. Ao convocar as pessoas a olhar para nossas cidades com esse propósito, apresentamos a ideia de que a educação também acontece fora da escola e pode complementar e apoiar o trabalho dos professores.
Assim, além de serem convidadas a entender sua própria comunidade, as pessoas que participam do mapeamento começam a se reconhecer e se apropriar do local onde vivem, descobrindo relações e criando vínculos que até então estavam escondidos. Esse exercício permite também que as pessoas descubram o que não é educativo de suas cidades e percebam problemas ou questões locais que precisam ser trabalhadas coletivamente, que convidam a uma ação coletiva de educação.
Após um mapeamento, por exemplo, podemos perceber que a cidade tem pouca sinalização, o que prejudica o trânsito local e a segurança das pessoas. Esse pode se tornar o mote de uma atividade interdisciplinar na escola, convidando alunos, professores e direção a pensarem juntos como melhorar a sinalização do entorno da instituição. Se a proposta mobilizar as pessoas, ela pode até se tornar uma pauta para o município, encorajando os estudantes a descobrirem como funcionam os trâmites para implementação e revisão de leis, como funciona a casa legislativa local, qual o papel dos vereadores, quem são e como operam as lideranças comunitárias, etc. Uma pauta local pode virar aprendizado e mobilização social, ampliando o repertório sociocultural e político de toda a comunidade.
Veja um passo a passo simplificado do processo de mapeamento que inclui três fases: planejamento, execução e sistematização.
Como em todos os processos educativos, não há uma única forma de desempenhar esse mapeamento. Cada comunidade, cada escola e cada Comitê Local devem levar em conta suas características, composição, disponibilidade e interesses, estrutura de funcionamento, etc. Assim, o planejamento dessa atividade pode e deve ser alterado de acordo com as características do território e grupo em questão.
A constituição do Comitê Local e a realização do diagnóstico e do mapeamento já são estratégias que, se bem realizadas, aproximam a escola, as famílias e a comunidade local. No entanto, para consolidar esta aproximação e garantir que esta parceria se estabeleça de forma efetiva e duradoura, é interessante que seja desenhado um planejamento permanente, com previsão de ações contínuas a serem desenvolvidas pelo Comitê Local. Este planejamento se traduz na elaboração de um plano de ação com estratégias de curto, médio e longo prazo, que considerem as questões levantadas no diagnóstico e as possibilidades apontadas pelo mapeamento.
Não existem regras para determinar ações específicas. Podem ser desde atividades que melhorem o ambiente físico da escola, que apoiem a escola em atividades pedagógicas junto aos estudantes, que ampliem o acesso aos recursos educativos da cidade ou que articulem redes de serviços. O importante é que as ações reflitam as preocupações e desafios da escola identificados pelo grupo e se constituam em estratégias que fortaleçam a capacidade da comunidade escolar de agir coletivamente. É fundamental também que as ações propostas sejam exequíveis, isto é, elas precisam ter condições de realmente serem realizadas no tempo previsto, caso contrário o plano de ação perde sua confiabilidade.
O plano de ação não tem um formato pré-determinado. Cada Comitê Local pode construir seu próprio modelo, a partir da realidade de cada escola. No entanto, é importante que ele indique claramente as ações previstas, os responsáveis por cada ação e também os prazos para sua realização.
Por fim, os encontros e ações do Comitê Local devem ser avaliados sistematicamente. Os critérios para tal avaliação devem levar em conta aspectos tais como:
• quantidade de participantes
• diversidade dos participantes
• qualidade da participação
• realização das ações propostas
Além disso, é interessante avaliar a sustentabilidade do Comitê Local ao longo do tempo, considerando:
• a constância da participação (se os representantes comparecem em todos os encontros)
• a sustentação da agenda (se as reuniões e atividades previstas realmente acontecem)
• a autonomia do grupo (Quem coordena tem sempre que estar presente ou o grupo consegue realizar a reunião na ausência do coordenador?)
É ainda interessante prever, nas reuniões do Comitê Local, momentos para que seja feita uma avaliação coletiva do mesmo, o que permite que o grupo identifique suas forças e suas fragilidades e possa, a partir disso, se fortalecer.
Saiba mais
ASSOCIACAO CIDADE ESCOLA APRENDIZ. Relatório do Projeto Integração Comunidade-Escola / Parceiros da Educação. 2011. (Disponível por solicitação à organização).
BONAFE, Jaume. Entrevista concedida para o Portal Aprendiz em 12 de Novembro de 2014.
BRASIL.Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica. 2010.
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
COSTA, Natacha. Educação, Cidade e Democracia: a agenda do Bairro-escola. In: SINGER, Helena (org.). Territórios Educativos: experiências em diálogo com o Bairro-escola. Volume 1. Moderna: São Paulo, 2015.
MEC/SECAD. Texto de Referência para o debate nacional. MEC: Brasília, 2009.
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