“Amigos do Zippy” apoia escolas a serem facilitadoras do desenvolvimento emocional das crianças
Publicado dia 23/09/2014
Publicado dia 23/09/2014
Raiva, medo, angústia, alegria, ciúmes. Todas essas emoções – agradáveis ou desagradáveis – são muito presentes em nossas vidas e compõem a forma como nos relacionamos com as pessoas ao nosso redor.
Com o objetivo de apoiar as crianças a reconhecer emoções e a identificar e desenvolver alternativas para trabalhar com esses sentimentos, a Associação pela Saúde Emocional de Crianças (ASEC) aplica junto a escolas públicas e particulares, o programa Amigos do Zippy. Como é na faixa etária dos seis a sete anos que a pessoa consolida seus padrões de reação aos sentimentos, a iniciativa atua no 1º e 2º anos do ensino fundamental, amparando educadores a mediarem um percurso formativo em que a criança vive, compreende e desenvolve ferramentas para lidar melhor com suas emoções.
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Criada por uma equipe multidisciplinar da organização internacional Partnership for Children, a metodologia foi traduzida e adaptada ao contexto brasileiro; a própria ASEC nasceu para garantir e modelar sua implementação no país. Hoje, mais de 30 países compõem essa rede internacional, que permite trocas constantes e desenvolvimento de novas atividades que possam complementar o trabalho das organizações locais.
No Brasil, desde 2004, quando o programa foi implementado, mais de 6500 educadores e 200 mil crianças participaram do programa, em cerca de 500 escolas em 45 municípios de diferentes estados do país.
Partindo do pressuposto que muitas vezes dizemos a uma criança que se machucou que aquilo “já passou, que não doeu”, quando, na verdade, o acontecido doeu e não foi bom, a metodologia do Amigos do Zippy não diz às crianças o que elas devem sentir ou fazer. No trabalho, não há condenação das reações e, principalmente, não há a valoração de bom ou ruim na forma como elas se comportam. No lugar, a metodologia conduz o educador a encorajar os estudantes a pensarem em outras alternativas, analisarem as consequências de seus atos e agirem de acordo com o que entenderam e a partir do repertório emocional que desenvolvem no processo.
Para tanto, a ASEC atua diretamente na escola, formando o professor responsável pela turma e o coordenador pedagógico ou representante da direção que possa acompanhá-lo no decorrer do processo. O docente atua com o programa por 25 aulas, divididas em seis módulos, que apresentam emoções progressivamente mais complexas e participativas. Na voz do educador, quem guia todo trabalho é a história com o Zippy, um bicho-pau que tem um grupo de crianças como amigos. Juntos, Zippy e sua turma, apresentam às crianças situações comuns ao universo infantil e que demandam respostas emocionais, como reagir a uma briga, discordar de alguém, sentir medo e ciúmes. A partir dos amigos do inseto, as crianças são convidadas a participar de atividades lúdicas que problematizam o que acontece na história de forma prática.
Aos poucos, as atividades a serem realizadas exigem respostas coletivas e a colaboração de todos os envolvidos. Neste caminho, o educador se faz fundamental, mediando não apenas o desenrolar da história e tarefas, mas o próprio envolvimento dos estudantes com o tema e a relação deles no grupo. Aprender a escutar, respeitar o próximo e a colaborar são habilidades-chave desenvolvidas no percurso.
Paralelamente, todos os professores que ministram o programa e o coordenador pedagógico ou membro da direção têm que necessariamente participar do programa de formação, divido em etapa básica e continuada. Na formação básica, com duração de 16 horas, o participante tem acesso à estrutura do programa, aprende a desenvolver “combinados” com os estudantes e a fortalecer suas estratégias de mediação do conteúdo, garantindo uma vivência autônoma das crianças, mas com foco à proposta do desenvolvimento emocional.
Na parte continuada, o grupo se reúne em quatro encontros com duração de quatro horas. Além do acompanhamento e preparação para os módulos, os educadores são encorajados a trocar com seus pares, relatando suas próprias experimentações e a forma com que as crianças reagiram às aulas e se desenvolveram. Nessa estrutura, ao passo que se prepara para mediar as questões com os estudantes, o próprio educador é convidado a se perceber e pensar sobre suas reações emocionais.
Novamente, longe de ser um caminho de “auto-ajuda”, a formação não dá “soluções imediatas ou certas”. No lugar, busca ampliar o repertório de soluções para eventuais conflitos emocionais e a lidar com dificuldades comuns tanto no universo da criança, quanto no do adulto.
Como as emoções não existem apenas na sala de aula, a metodologia acaba envolvendo os familiares das crianças, que não apenas levam a história do Zippy para casa, mas desenvolvem e aplicam seus ensinamentos. “Uma mãe contou que estava tendo uma discussão com sua filha adolescente, quando seu filho menor, que participou da metodologia, interrompeu a briga e sugeriu que as duas parassem, falassem calmamente, uma de cada vez, pois só assim chegariam a uma resolução”, conta a presidente da ASEC, Tania Paris.
Assim, em muitos casos, a escola acaba ampliando a atuação do Amigos do Zippy para a comunidade escolar. Para tanto, a ASEC incentiva a escola a aproximar os familiares com uma proposta de permanência interessada, lançando mão de múltiplas estratégias para acolhê-los. Para a Associação, quando determinado formato de reunião não funciona, a escola precisa buscar outros mecanismos, e experimentar novas formas de diálogo.
Da mesma forma, com vistas à ampliação do Amigos do Zippy à família, a organização propôs o Amigos do Zippy em casa. Em formato de bolso – para ser utilizado em qualquer situação – , o instrumento propõe a vivência das atividades entre pais, familiares e seus filhos, estimulando a convivência, o diálogo e o desenvolvimento emocional de todos. A demanda surgiu dos pais de estudantes que participavam do processo e tornou-se uma iniciativa exclusiva do Brasil, hoje disseminada pela rede internacional dos países que vivenciam a proposta.
E, em uma perspectiva de continuidade do Amigos do Zippy, há o Amigos do Maçã. A ideia é a continuidade do trabalho com o desenvolvimento emocional para crianças egressas do Amigos do Zippy, a ser aplicada no 3º e 4º anos do ensino fundamental. Os assuntos abordados tornam-se mais complexos, em ritmo mais acelerado e em processo formativo mais curto e leve, fortalecendo ainda mais a autonomia das crianças.
As escolas podem aderir individualmente ao programa, mas, normalmente, o processo se dá por meio das redes de ensino, que o aderem para um determinado grupo.
A partir de demandas das escolas e secretarias, a organização passou a atuar com a educação emocional dos colaboradores das escolas. Como uma das ações, a ASEC atua com a formação de Introdução à Educação Emocional, voltada a outros educadores da escola interessados em tomar ações para promover o desenvolvimento emocional dos estudantes. Nessa mesma perspectiva, mas com foco nos técnicos das secretarias no desenvolvimento de ações em diálogo com o tema, a organização propõe uma formação em Saúde Emocional.
E, por fim, para apoiar as equipes escolares, colaboradores e gestores, a organização desenvolve a metodologia “Um dia para Mim”, com o objetivo de estimular que os participantes, normalmente assoberbados pela rotina escolar, possam pensar sobre si e sobre suas ações no espaço educativo. Adotada em Sorocaba (SP), no programa Cidade Saudável, Cidade Educadora, além de outros funcionários e docentes, todas as merendeiras das escolas públicas da cidade foram beneficiadas com a metodologia, especialmente por apoiá-las a lidar com as situações difíceis do cotidiano escolar, bem como para valorizar sua participação na educação das crianças. A cidade adota a metodologia do programa para as escolas desde 2006.
Aprovada como Tecnologia Educacional do MEC para Educação Integral e Integrada, a metodologia foi testada em vários países e vem sendo avaliada de forma minuciosa. Além da melhora comprovada na relação entre os estudantes e dos estudantes com a escola, nota-se redução expressiva da violência escolar e melhora de 11 a 17% no desenvolvimento acadêmico. “Com mais vontade de estar na escola e sentido-se parte dela, acolhido, é natural que essa melhora aconteça”, explica a presidente da ASEC, Tania Paris.
Paralelamente, segundo a organização, a criança passa a ter mais confiança para lidar com as dificuldades, quando diante de uma situação-problema. Ao passo que passam a pedir ajuda, a não ter medo do apoio de terceiros e não sentir medo de errar, os estudantes tendem a melhorar significativamente na relação com o “fazer acadêmico”.
Na avaliação de impacto conduzida pela organização no Brasil, o Amigos do Zippy alcançou resultados expressivos para além das turmas envolvidas. 50% dos envolvidos diretos das formações conseguiram ampliar os ensinamentos do programa a outros professores e disciplinas escolares.