Como conduzir conversas na escola sobre violência extrema
Publicado dia 26/04/2023
Publicado dia 26/04/2023
Quando acontecem episódios de ataques às escolas ou outros casos de violência que abalam a comunidade escolar, é fundamental abrir espaços para falar sobre como cada um se sente. É assim que é possível começar a construir uma cultura de diálogo na escola que se torne permanente e faça parte de uma atenção constante ao clima escolar e da convivência entre todos e todas.
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“O que a gente precisa saber enquanto professor é que não falar sobre isso com as crianças e adolescentes não significa que eles não saibam, que não estão vivenciando e conversando entre si. O que não é dito, explode de outro jeito”, diz Luciene Tognetta, do departamento de psicologia da educação da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) e coordenadora do GEPEM (Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral).
Para Paulo Bueno, psicanalista, doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e docente no Instituto Gerar, o diálogo também é um meio de lidar com a violência que já aconteceu e prevenir novos casos.
Confira as orientações dos especialistas para promover o diálogo sobre o tema de forma adequada:
Educadores também são vítimas de ataques às escolas e precisam de espaço para falar sobre seus medos e inseguranças. “Também sobre serem cobrados a dar respostas de medidas de segurança, algo que não faz parte do trabalho deles e é extremamente angustiante”, destaca Paulo.
A partir desse acolhimento, cada um vai poder entender suas próprias condições e motivações para se engajar na construção de caminhos para lidar com o problema.
“O medo pode paralisar a ponto de professores não conseguirem realizar essa função. Não é um problema estar amedrontado e por isso não podemos obrigar professores a fazer essa condução. Mas outras pessoas podem ter um medo que os impulsiona a poder assumir esse papel”, explica o psicanalista.
“É pela escuta”, sintetiza Paulo. Ainda que o trauma tenha sido coletivo, cada um vive essa experiência de uma forma individual. “O professor precisa escutar os alunos para se aproximar de possíveis efeitos desorganizadores neles. E isso não é para o professor pensar individualmente, mas todos juntos”, orienta.
Ainda que todo assunto seja assunto de criança, é preciso adequar a linguagem e o formato ao nível de desenvolvimento dela. “Precisamos trabalhar no mesmo ritmo em que elas nos trazem essas questões. As crianças elaboram as situações através de brincadeiras, da contação de histórias e de jogos. Então quais materiais vão ser escolhidos para trabalhar o tema do medo, da morte?”, indaga Paulo.
A recomendação de Luciene é permitir que os próprios estudantes organizem as rodas de diálogo – no formato e sobre o tema que desejarem. Um(a) professor(a) pode ser eleito(a) por eles para mediar o começo dos trabalhos, mas a proposta é que eles ganhem autonomia e conduzam as atividades inteiramente sozinhos.
“Os alunos são os que mais sabem sobre as angústias que eles têm e o que está acontecendo com os pares. Então que eles possam discutir sobre o que têm vivido de forma mediada por eles mesmos. Quando os espaços são abertos pelos professores, demora para que eles ganhem confiança de que não se trata de um lugar de obediência e avaliação”, explica Luciene.
Nas pesquisas que Luciene conduz, encontrou uma percepção compartilhada pelo senso comum: os estudantes buscam mais os amigos do que as famílias para falar sobre seus problemas. Quando perguntados sobre como vão as coisas, respondem de maneira genérica e superficial.
Assim, para que as famílias se mantenham próximas de suas crianças e adolescentes, e possam estabelecer uma parceria com a escola sobre como vai o desenvolvimento deles, é preciso construir, no dia a dia, um diálogo.
“Não espere eles procurarem por vocês. Nós, que somos adultos, temos condições de encontrar os melhores momentos para conversar, para entrar no mundo deles, e partir de seus interesses para aprofundar em conversas mais sérias”, diz.