publicado dia 09/05/2018

A formação de professores à luz da BNCC

Reportagem:

“É muito difícil ensinar de maneira diferente daquela que se foi ensinado”, disse Linda Darling-Hammond, professora de Educação na Universidade de Stanford, durante o evento A Formação de Professores no Contexto da BNCC, ocorrido nesta terça-feira (8) como parte do Ciclo de Debates em Gestão Educacional, organizado pelo Instituto Ayrton Senna e a Fundação Itaú Social. 

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A questão trazida por Linda é oportuna para o momento que vive o País. Escolas e redes de ensino refletem sobre como implementar a BNCC, diante da diversidade de realidades e dos recursos disponíveis. Neste cenário, a formação de professores, inicial e continuada, desempenha um papel crucial.

Linda Darling-Hammond, da Stanford: “O professor não é mais apenas aquele que ensina, mas aquele que aprende ao dialogar com os alunos”

“A formação inicial dos professores precisa se utilizar dos mesmos recursos que deseja que os professores pratiquem. Isto é, estar atenta às habilidades do século XXI e necessidades dos alunos”, afirmou a professora de Stanford.

Segundo a especialista, isso corresponde a uma formação contextualizada, atenta ao território, que prioriza o protagonismo estudantil e os interesses individuais. Além disso, a formação inicial dos professores precisa mirar na aprendizagem por meio de pesquisa, experiências práticas e promover comunidades de aprendizagem, envolvendo também as famílias. Ou seja, é preciso aposentar a formação voltada inteiramente para as aulas expositivas.

“O professor não é mais apenas aquele que ensina, mas aquele que aprende ao dialogar com os alunos que, por sua vez, também ensinam enquanto aprendem. Eles se tornam corresponsáveis por um processo em que todos crescem”, finalizou Linda.

BNCC na prática

Também presente no evento, Elba Siqueira, educadora e consultora da Fundação Carlos Chagas, teceu algumas críticas em torno da BNCC que precisam ser levadas em consideração no momento de implementá-la nas escolas.

“A BNCC teve a pretensão de substituir as matrizes de avaliação. O currículo não pode vir a reboque da avaliação, como tem acontecido no País, muito por causa da corrida do IDEB [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica]”, afirmou Elba.

“O currículo não pode vir a reboque da avaliação, como tem acontecido no País”, criticou Elba Siqueira, da Fundação Carlos Chagas

Elba também fez ressalvas ao detalhamento excessivo, linguajar complexo e à forma como a Base apresenta a progressão dos conteúdos a serem ensinados. Para ela, essas são questões que podem trazer dificuldade para a interpretação do documento na prática.

“Isso dita o ritmo de aprendizagem dos alunos a partir de um ponto de vista completamente externo que, por vezes, não corresponde ao ritmo verdadeiro da aprendizagem, que vai e vem”, criticou.

A educadora destacou ainda a importância do diálogo para ajustar estes e outros pontos. “As redes precisam dar um retorno ao governo federal sobre a necessidade desses ajustes para não se tornarem meros implementadores do que foi criado do outro lado”, disse.

Desafios da formação continuada

O Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) preparou um documento orientador para o aperfeiçoamento das políticas de formação continuada de professores à luz da implementação dos currículos adaptados à BNCC.

Wesley Neves, membro do grupo do Consed que elaborou o texto, disse que o documento partiu do princípio de que os professores não podem ser vistos como uma folha em branco. Por isso, antes de qualquer tentativa de formação, é preciso escutá-los e valorizá-los.

“Temos que entender quais são as reais necessidades dos professores e quais são as contribuições que eles já estão fazendo. Eles precisam de um plano de carreira para se sentirem estimulados a buscar qualificação e a permanecer na rede pública, porque o que vemos são professores que fazem mestrado e doutorado e encontram oportunidades melhores em outros lugares”, lamentou.

Wesley também destacou como decisivo para o sucesso da implementação da BNCC a comunicação. “As políticas públicas não podem chegar como imposição, é importante que o professor se veja nessa política”.

Jana Barros, palestrante, discursa

Jana Barros, do Instituto Chapada, recorre a tecnologias digitais para facilitar a formação continuada

Jana Barros, educadora e formadora no Instituto Chapada Educação e Pesquisa (ICEP), falou da dificuldade de realizar a formação continuada com as escolas atendidas na Bahia por conta, dentre outros motivos, da distância entre a sede do Instituto e as escolas.

A solução encontrada foi utilizar a tecnologia. “Como não dá para ir a essas escolas para fazer um acompanhamento semanal, nesse meio tempo os professores gravam as aulas e me mandam os trechos que evidenciam o momento em que passaram por alguma dificuldade”, disse Jana. Então a formadora transcreve os áudios e estuda a demanda formativa que o professor tem.

Experiências internacionais

Investimento e valorização docente permearam a fala de Chor Boon Goh, do Instituto Nacional de Educação de Singapura. O país, que foi colônia britânica até 1965, após sua independência colocou entre as prioridades governamentais a educação. “Nós decidimos que os professores moldam o futuro da nação”, disse.

Foi a partir dessa decisão que estabeleceram um salário mínimo equivalente para educadores, médicos, advogados e engenheiros e investiram em formação a longo prazo. Todo ano os professores devem cumprir 100 horas de formação, financiadas pelo governo.

“A cada 7 anos, os nossos professores têm direito a um ano sabático, para aprenderem o que quiserem, em qualquer lugar do mundo”, contou Chor Boon Goh, de Singapura

“Nós temos um plano de crescimento do professor. Falamos o tempo todo que quando o professor para de aprender, ele para de ensinar. Por isso, a cada 7 anos, os nossos professores têm direito a um ano sabático, para aprenderem o que quiserem, em qualquer lugar do mundo”, contou Chor.

Anneli Rauatiainen, da Agência Nacional de Educação da Finlândia, contou que o país aposta na tutoria entre professores para a formação inicial. “Assim, o professor serve de exemplo para os alunos, e também para outros professores”. Nessa relação prevalece a empatia, uma vez que todos já foram recém-formados e novatos em uma escola.

Os docentes também são estimulados a escrever planos de desenvolvimento para suas carreiras e sobre onde querem ir como seres humanos. Os diretores dos colégios, por sua vez, se fazem presentes nas salas de aula em um acompanhamento contínuo de apoio. “Não tem a ver com monitorar, nós confiamos nos nossos professores, mas é para que a direção conheça as turmas e as relações de ensino-aprendizagem, que são muito únicas”, disse.

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