publicado dia 23/05/2024

Escolas cívico-militares: aprovação truculenta em SP reflete proposta do modelo, avaliam especialistas 

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🗒Resumo: Em meio à violenta repressão contra estudantes e idosos, o Estado de São Paulo aprovou o Programa Escola Cívico-Militar, que deve começar a ser implementado este ano em escolas públicas das redes estadual e municipais. Especialistas retomam o histórico recente do país com o modelo e explicam o que ele representa para o direito à Educação.

Nesta outra reportagem, entenda os 4 eixos centrais da política.

A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou, nesta terça-feira (21/5), a implementação de escolas cívico-militares nas redes estadual e municipais de ensino. Proposto pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o modelo deve alcançar de 50 a 100 escolas do estado entre este e o próximo ano. 

A votação do Projeto de lei Complementar nº 9 /2024 foi marcada por uma série de detenções e agressões físicas a adolescentes, jovens e idosos que manifestavam seu repúdio à proposta. 

Para especialistas, a repressão violenta ao debate é representativa da proposta do programa aprovado, evidencia a lógica de funcionamento que será introduzido nas escolas e fere uma série de direitos das comunidades escolares.

“É uma ocupação militar violenta das escolas públicas”, resume Salomão Ximenes, professor na Universidade Federal do ABC (UFABC) e integrante da Rede Escola Pública e Universidade (REPU) e da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação.

“É violenta no sentido simbólico, porque é contra todo mundo que trabalha na Educação e não está sendo ouvido, no sentido pedagógico, porque contraria toda a construção pluralista da Educação, e também no sentido cru da palavra, como vimos nessa votação”, define o professor.

Para Catarina de Almeida Santos, pós-doutora em Educação pela Unicamp, professora associada da UnB e coordenadora da Rede Nacional de Pesquisa sobre Militarização da Educação (REPME), a lógica autoritária se faz presente em uma casa legislativa onde o debate coletivo deveria ser respeitado.

“É a interdição do debate e é o que vai acontecer na escola quando essa juventude contestar uma ordem hierarquizada dada pela polícia. O que deveria acontecer por meio de uma perspectiva pedagógica, se dará por meio da imposição da força”, diz Catarina.

No projeto de lei, Renato Feder, Secretário de Educação do Estado de São Paulo, afirma que o programa é voltado para instituições “situadas em regiões de maior incidência de criminalidade”. Dessa forma, as violações devem se somar às que já permeiam estes territórios marginalizados.

“Não estamos falando de escolas inseguras em uma sociedade segura. Então vão para dentro da escola os profissionais que não garantiram segurança fora dela?”, questiona Catarina.

De acordo com o programa, novas unidades ou as escolas públicas de Ensino Fundamental, Médio e de Educação Profissional já existentes que desejarem, podem fazer a “conversão” para o modelo cívico-militar.

Entre outros pontos, os policiais contratados receberão remuneração superior à dos professores, com recursos da Secretaria de Educação, e serão responsáveis por promover a disciplina nas unidades.

Em 2013, o Brasil contava com 39 escolas geridas por policiais militares. Dez anos depois, já eram mais de 816 escolas públicas militarizadas, um aumento de quase 21 vezes. 

A experiência destes anos trouxe uma série de denúncias de violações de direitos dentro e no entorno das escolas após a militarização. Há casos de perseguição e agressão a estudantes e professores, abuso e assédio, racismo, LGBTQIAP+fobia, censura às temáticas de direitos humanos, entre outras.

As denúncias estão sintetizadas no “Relatório Paralelo sobre a situação de crescente militarização da Educação Básica, perseguição sistemática a educadores e educadoras e censura às temáticas de direitos humanos nas escolas do Brasil“, apresentado ao Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (CDESC) da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Há muito acompanhamento do que significa a militarização das escolas para o cerceamento do direito à Educação, o processo de segregação que acontece nessas unidades e a limitação imposta a professores e estudantes”, afirma Salomão.

A aprovação do Programa Escola Cívico-Militar em São Paulo, que agora aguarda a sanção do governador, contraria a revogação do programa nacional, feita por meio do Decreto nº. 11.611/2023.

Em abril de 2024, a Advocacia-Geral da União (AGU) também encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer indicando que o modelo de escolas cívico-militares do Paraná é inconstitucional. 

No documento, o Advogado-Geral da União, Jorge Messias, lembra que a política nacional foi revogada a partir do entendimento de que havia incongruências com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e com o Plano Nacional de Educação (PNE). Desde então, o Ministério da Educação (MEC) vem apoiando a desmilitarização destas unidades pelo Brasil. 

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