publicado dia 06/08/2024

“Retrocesso inaceitável”: representantes indígenas ficam de fora do Conselho Nacional de Educação (CNE)

Reportagem:

🗒 Resumo: O governo federal anunciou, nesta segunda-feira (5/8), os 13 novos conselheiros do Conselho Nacional de Educação (CNE). Nenhum deles é indígena, contrariando o histórico do órgão. A lacuna preocupa pela especificidade da Educação escolar indígena e a urgência em combater o racismo e a violência contra estes povos.

Nesta segunda-feira (5/8), foram indicados os 13 novos integrantes do Conselho Nacional de Educação (CNE) e, pela primeira vez desde 2003, com exceção do período governado por Bolsonaro, não há nenhum representante indígena entre os conselheiros.

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A lacuna preocupa pela especificidade que a Educação escolar indígena demanda e pela urgência em combater o racismo e outras violências contra os povos indígenas. 

Em nota, o Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena (FNEEI) afirma que a decisão “ignora a importância de nossas contribuições, mas também perpetua um histórico de marginalização e exclusão que temos lutado arduamente para superar. Nossa luta continua e a educação é um dos direitos que muito prezamos e que é estratégico para nossos projetos de bem viver”. 

Falta de representatividade é retrocesso em meio a violência contra indígenas

No Brasil, há 272 povos indígenas que falam 150 línguas diferentes. Na Educação Básica, são cerca de 400 mil estudantes, atendidos em 4 mil escolas por 25 mil professores. 

Todos eles, agora sem representação em um dos mais importantes órgãos do Ministério da Educação (MEC), responsável por apoiar a formulação de diretrizes e políticas públicas e garantir a participação da sociedade civil nessas decisões. 

“O CNE volta a ser um órgão de tutela racista”, diz o ex-conselheiro Gersem José dos Santos Luciano, do povo Baniwa. “Toda vez que a questão indígena for tratada, se é que será tratada, isso será feito por não indígenas, que não conhecem e não entendem nossas culturas e pedagogias. Ninguém pode falar ou decidir por nós”, aponta. 

Pilar Lacerda, que foi nomeada conselheira este ano, e já compôs o Conselho ao lado de Gersem entre os anos de 2007 e 2012, reforça a importância da participação indígena no órgão: “Temos que ter como meta que a próxima indicação de algum conselheiro da Educação Básica seja indígena”. 

Givânia Maria da Silva, a primeira mulher quilombola nomeada para o CNE, concorda: “Eles já têm uma tradição de presença no CNE, de reivindicação das especificidades da pauta”. 

Para Gersem, que também é professor na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e doutor em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UnB), o fortalecimento da Educação escolar indígena e da participação destes povos nas tomadas de decisão se faz ainda mais urgente diante do aumento de violências e retiradas de direitos. 

“Os governos anteriores desmontaram as políticas indigenistas e houve um abandono dos princípios pedagógicos e legais da Educação escolar indígena, voltando àquela Educação colonizadora. É um retrocesso inaceitável que acontece em um momento em vivemos também violências enormes nos estados e municípios”, denuncia Gersem.

Além das invasões a territórios indígenas e dos embates em torno do Marco Temporal, a violência contra os povos indígenas vem se intensificando. Em 2022, foram registrados 416 casos de violência contra pessoas indígenas. Oito anos antes, a média anual era metade: 242,5 casos. Os dados são do relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em julho de 2023.

“Apostamos no processo educativo da sociedade para superar o racismo e a violência contra os povos indígenas e o CNE tem esse papel nacional de organizar, orientar e definir diretrizes da política educacional. Sem a presença indígena, fica um vazio dessa esperança em atuar firmemente em des-educar as nossas elites”, lamenta Gersem.

*Foto: Guilherme Cavalli/Cimi

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