publicado dia 21/11/2024

“Na Educação Integral, a escola precisa favorecer relação com a natureza e vivência coletiva”

Reportagem: | Edição: Tory Helena

🗒 Resumo: A infraestrutura e a organização das escolas na Educação Integral será tema de discussão no Seminário Educação Integral em Debate 2024. Mediadora do encontro, a especialista Beatriz Goulart detalha, em entrevista a seguir, as características de escolas com propostas alinhadas à Educação Integral e como seus espaços podem favorecer o contato com a natureza e a convivência coletiva.

Como reestruturar e repensar as escolas à luz da Educação Integral? A organização dos tempos, espaços e recursos nas escolas será foco de mesa de discussão no Seminário Educação Integral em Debate 2024, programado para acontecer na sexta-feira (22/11). 

Com mediação de Beatriz Goulart (Centro de Referências em Educação Integral), a mesa “Infraestrutura: tempos, espaço e recursos para a Educação Integral com equidade” reunirá Miriam Abramovay (Flacso), Paula Mendonça (Instituto Alana) e Rachel Trajber (Cemaden Educação). O diálogo está programado para acontecer das 14h às 15h30 (horário de Brasília) e será transmitido ao vivo pelo YouTube do Futura

Em 2024, o Seminário Educação Integral em Debate é realizado pelo Centro de Referências em Educação Integral, Cidade Escola Aprendiz, Canal Futura, Avante, Ashoka, British Council, Cenpec, Fundação Vale, Fundação Santillana, Flacso, Instituto Alana, Itaú Social, Instituto Rodrigo Mendes, Instituto Tomie Ohtake, Roda Educativa, Oi Futuro e Unicef. 

Assista ao Seminário Educação Integral em Debate: 

Além de como a Educação Integral pode inspirar revisões e transformações nos espaços e tempos escolares, o encontro também abordará a importância da relação da escola com a natureza, bem como o contexto de crise climática.

“Escolas padronizadas ignoram a crise climática e encaram a natureza como um elemento que atrapalha”, afirma a arquiteta e especialista do Centro de Referências em Educação Integral, Beatriz Goulart.

Leia a entrevista:  

Centro de Referências em Educação Integral: O que caracteriza a infraestrutura na Educação Integral a fim de que ela possa cumprir seus princípios? 

Beatriz Goulart: Um dos princípios da Educação Integral é questionar tudo, desde as coisas mais óbvias: o horário serve para quê? Por que não pode ir lá fora? Por que o banheiro das faxineiras é menor do que o das professoras e, na verdade, por que há essa separação? 

Então ela é uma revisão profunda da forma e organização escolar, que historicamente foi construída de forma fracionada e com o objetivo de vigiar e punir. Os espaços são separados por idade, por tempo e disciplina, e tudo isso precisa ser questionado, desde o seu modo de produção. 

É preciso criar as escolas a partir e com a comunidade escolar, até para que ela possa cuidar desse lugar, se apropriar dele. A produção hoje tem um rito focado em legislação, custo e na palavra de engenheiros e arquitetos, que em sua formação aprenderam a construir escolas desintegradas, que desconhecem a Educação Integral. 

“De nada adianta ter uma infraestrutura premiada e sustentável sem a reflexão sobre o uso dos tempos e espaços e das relações que se estabelecem ali”, explica Beatriz Goulart.

Assim será possível dar à estrutura o sentido do habitar, dos desejos e necessidades daquela comunidade, ao invés de uma estrutura que atende um padrão que desconhece o bioma local, como o vento incide ali, a cultura local, os desafios do território. 

Na Educação Integral, a escola precisa favorecer a relação com a natureza, entre as várias faixas etárias e a vivência social, coletiva, onde todo mundo se junta. 

Junto com esse trabalho da forma da escola, é preciso repensar a organização dela. Então o Projeto Político Pedagógico precisa prever outra organização do currículo, dos conteúdos e das relações. 

É preciso tempo de aula para conversar sobre o lugar que os estudantes habitam. Fazer a alfabetização territorial sobre as questões da natureza e culturais é fundamental, porque de nada adianta ter uma infraestrutura premiada e sustentável sem a reflexão sobre o uso dos tempos e espaços e das relações que se estabelecem ali.

CR: Como é possível transformar as infraestruturas já existentes e engajar as pessoas na reflexão sobre a forma e o uso dos espaços da escola e fora dela? 

Beatriz: A escola pode começar montando um comitê. Ele precisa garantir a participação de todas as pessoas, isto é, ser representativo e representar as diversas idades, gêneros, raças e setores da escola, da família e da comunidade. 

Esse grupo vai fazer um diagnóstico participativo. Observar e anotar o que está bom e o que precisa mudar na escola e em seu entorno. É a acústica que está ruim? Falta espaço para brincar? O rio transborda? 

“A infraestrutura escolar é uma coisa viva e exige renovação constante”, aponta a especialista.

Em seguida, o comitê cria um plano de trabalho para resolver essas questões, como fazer um mutirão para construir uma horta ou mudar o horário de chegada dos estudantes. E pensar o orçamento e os encaminhamentos para Secretaria, Prefeitura, comunidade e outros atores necessários nesse processo.

Vale chamar o conselho de arquitetura e urbanismo local ou arquitetos universitários e da região para apoiar o projeto do comitê. Seu papel vai ser de observar e ajudar, não de liderar, o processo. Depois, vem a execução.

Por fim, é preciso fazer uma avaliação pós-execução para observar se os resultados foram alcançados. Isso é permanente, porque a infraestrutura escolar é uma coisa viva e exige renovação constante.

Outro ponto é que recomendo que seja destinado metade do tempo para o diagnóstico e para o projeto e a outra metade para a execução. É comum que a primeira metade seja feita em poucas semanas e já partam para a execução, como se isso fosse o mais importante, mas não é.

CR: Nestes movimentos de pensar e repensar as escolas e seu entorno, qual a importância de considerar o contato com a natureza e o contexto da crise climática?

Beatriz: Escolas padronizadas ignoram a crise climática e encaram a natureza como um elemento que atrapalha, que deve ser removido. Então é preciso considerar para onde venta, se é íngreme, como é o solo, se alaga, se tem risco de incêndio, qual é o bioma da região. 

“A natureza nos emociona de tal forma que, quando aliada ao processo educativo, se aprende a viver melhor e com mais alegria”, diz Beatriz

Também precisa incluir nas equipes das escolas um jardineiro, uma professora da Educação Ambiental e horta. Isso é responsabilidade do diagnóstico e planejamento do comitê, para entender os potenciais e os desafios ambientais de cada localidade.

No fundo, estamos falando de uma escola que possa viver com o vento, a água, as surpresas que a natureza traz. A gente escorrega na lama, se assusta com um bicho que aparece, experimenta uma fruta nova, porque a natureza traz o disruptivo, e a escola pode incorporar isso.

É trazer a plenitude do planeta para a nossa vida, o que é viver nesse lugar tão incrível e surpreendente. Como diz a [poetisa] Adélia Prado, é trazer a poesia que vem de observar a luz, a pedra, a chuva. A natureza nos emociona de tal forma que, quando aliada ao processo educativo, se aprende a viver melhor e com mais alegria.

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