publicado dia 20/06/2023

Escolas públicas criam bibliotecas antirracistas pelo Brasil

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Na EE Professor Andronico de Mello, em São Paulo (SP), a maioria dos estudantes são não-brancos. Apesar disso, não se viam representados nos autores e personagens de livros da biblioteca da escola. Para mudar essa realidade, as turmas se engajaram em uma competição para conseguir doações de novas obras e, assim, construir uma biblioteca antirracista.

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“Esse tem sido o maior motivo de orgulho de todo mundo na escola nos últimos tempos. Até aprendemos a trabalhar melhor em equipe e entre as salas. Tem sido bom para unir as pessoas”, conta Julia Iratsuka, estudante de 17 anos.

A competição funciona da seguinte maneira: cada livro doado vale 10 pontos – e não pode ser comprado. As turmas também podem conseguir palestras ou oficinas, que valem 150 pontos. 

O grupo que conseguir mais pontos vai ganhar uma ida ao teatro, prêmio que os próprios estudantes escolheram. “Se conseguirmos apoio, vamos levar todos os estudantes”, explica a professora Rachel D’Amico.

Até aqui, já conseguiram cerca de 200 obras, como as de Achille Mbembe e a coleção Feminismos Plurais. A iniciativa também já ganhou apoio da filósofa e escritora Djamila Ribeiro, que compartilhou o projeto em suas redes sociais: 

“Também já tivemos cinco palestras. Márcia, uma mulher indígena, veio falar sobre a importância da cultura indígena na Literatura. Domênica, uma mulher negra, veio conversar sobre racismo recreativo”, relata Julia.

Este último tema, inclusive, foi um dos principais motivos que levou a professora Rachel a propor a iniciativa. Docente na escola há um ano, logo notou que enfrentar o racismo recreativo seria uma de suas principais missões.

“Estamos lidando com isso a partir do trabalho com os estudantes, porque discutimos as obras que chegam, as palestras, os termos novos que eles aprendem. Também falamos sobre Monteiro Lobato e a questão do racismo e a eugenia”, aponta a educadora.

Entre os avanços que nota nos seus estudantes, Rachel destaca a autoafirmação enquanto sujeitos de direito e que produzem conhecimento. 

“Eles tinham muita dificuldade de se defender, de se colocar como produtores de saberes e fazer construções teóricas, porque são lugares que na nossa cultura racista ficam muito destinados às pessoas brancas. Mas outro dia, por exemplo, vi uma menina enfrentando uma autoridade com propriedade. Que eles possam levar a força do conhecimento para a vida, para fora da escola”, diz Rachel.

A biblioteca está prevista para ser inaugurada no último trimestre do ano e vai ganhar um novo nome: Marielle Franco. “Fizemos uma votação na escola para decidir e o nome dela ganhou por sua importância na luta antirracista”, conta Julia.

A formação para trabalhar com a biblioteca antirracista

No nordeste do país, outra escola vem constituindo sua biblioteca antirracista. Além disso, forma os professores para trabalhar com as obras. A Escola Municipal Julieta Quintal, em Açailândia (MA), fez parte do projeto Rotas e Redes Literárias, que tem como objetivo promover o direito ao livro, leitura e literatura em redes municipais de ensino de diferentes locais do Brasil.

“Somos uma escola de periferia com muitos estudantes abertos à diversidade e dedicados. Tanto é que eles tomaram a frente do projeto Cultura Afro – Conhecer para libertar, que é se libertar desse racismo, do preconceito”, conta Raimunda Campos de Oliveira, mediadora da sala de leitura. 

Cada grupo de estudantes escolheu uma obra para ler e desenvolver um projeto. Maria Firmina, Carolina Maria de Jesus, Conceição Evaristo, Bianca Santana e Machado de Assis foram alguns dos selecionados. 

“Nós atuamos como mediadores e discutimos ao longo da leitura o preconceito, as leis e a literatura”, afirma Raimunda. Na finalização do projeto, fizeram um grande seminário para apresentar as obras e seus achados.

Para poder realizar esse trabalho, Raimunda conduziu uma formação com professores. Na sala de leitura, discutiam o que cada um pensa sobre o racismo no Brasil hoje, o papel da Educação em seu enfrentamento e as ações e projetos que poderiam realizar em suas áreas ou interdisciplinarmente o ano inteiro – não apenas no mês da Consciência Negra. Também participaram de um seminário com uma escritora do território.

“Quando construímos juntos, ouvindo um ao outro, o trabalho flui melhor, porque muda a maneira de pensar e essas ações se tornam conjuntas, não é algo imposto aos professores, mas algo que passou a fazer sentido para eles”, diz Raimunda.

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