publicado dia 10/05/2018
Em Salvador (BA), educadores defendem uma escola das infâncias
Reportagem: Da Redação
publicado dia 10/05/2018
Reportagem: Da Redação
Reunidos durante os dias 2 e 3 de maio, em Salvador (BA), educadores, gestores públicos, acadêmicos e especialistas em infância e educação discutiram as possibilidades e desafios para a construção de uma escola das infâncias no Brasil.
A proposta, fundamentada pela publicação “Educação Integral nas Infâncias”, lançada durante o evento realizado pela Avante, em parceria com o Centro de Referências, o Instituto C&A e o Instituto Alana, assinala que para assegurar o desenvolvimento integral das crianças de zero a 12 anos a escola deve converter-se em um centro de cultura infantil.
A proposta assinala que para assegurar o desenvolvimento integral das crianças de zero a 12 anos a escola deve converter-se em um centro cultural infantil
“Começamos essa reflexão relacionando a Educação Infantil à educação integral. Nossa ideia era que os processos educativos pensados para as crianças pudessem influenciar a educação integral e que essa conexão fosse mais orgânica”, descreveu Natacha Costa, representante do Centro de Referências em Educação Integral.
A partir dessa demanda, o grupo de educadores que se debruçou sobre o tema – Maria Thereza Marcílio, Rita Coelho, Levindo Diniz e Vital Didonet – deparou-se com uma primeira questão: era preciso repensar a transição entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental.
“Marcada por uma forte ruptura, vimos que essa passagem acaba sendo traumática para grande parte das crianças brasileiras”, avaliou Natacha. “Foi quando deixamos de falar em transição para sonhar com uma escola que pensa toda essa etapa do desenvolvimento humano a partir das suas diversidades e singularidades”, completou.
Desse processo, acrescentou Maria Thereza Marcílio, da Avante, nasceu a proposição de uma escola das infâncias. “Aprofundamos um discurso de educação que entende que é preciso assegurar os direitos das crianças. E para que isso se torne realidade, é preciso ter como ponto de partida a escuta das crianças.”
Corroborada pelo representante da Rede Nacional pela Primeira Infância, Vital Didonet, a visão holística dos direitos das crianças é um elemento fundamental dos marcos legais brasileiros e exige, segundo ele, uma abordagem intersetorial e um olhar ampliado da sociedade para a educação.
“A educação não pode estar focada apenas no currículo. Os conteúdos descontextualizados não levam em conta a totalidade da criança”, Levindo Diniz, da UFMG.
“A educação não pode estar focada apenas no currículo da aprendizagem. Os conteúdos isolados, descontextualizados, não levam em conta a totalidade da criança”, analisou.
Para Levindo Diniz, co-autor da publicação, essa concepção exige da instituição que vai acolher a criança um trabalho que contemple os diferentes tempos de aprendizagem, as múltiplas linguagens e interações e as experimentações características das infâncias.
O pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) também defendeu que, se o brincar é o meio pelo qual a criança significa o mundo, este deveria ser o eixo de articulação de todo o Projeto Político Pedagógico (PPP) das escolas. “Se somos capazes de reconhecer toda a riqueza presente nas infâncias, por que ainda reproduzimos um modelo escolar que diz que aos meninos e meninas que devem fazer as mesmas coisas, ao mesmo tempo?”, indagou.
A conferência de abertura, conferida por Lydia Hortélio, educadora e etnomusicóloga, ressaltou a importância da cultura popular para as infâncias. Com uma vasta pesquisa no campo das cantigas-brinquedo, Lydia falou sobre essas e outras manifestações para uma plateia formada por profissionais de 35 municípios, de 16 estados brasileiros.
“Nossos meninos não cantam mais e acho isso grave. O que vai ser de uma humanidade que não canta mais? Acredito que o desconserto que vivemos no nosso País vem daí”, criticou. “No nosso afastamento do campo, deixamos nossos rituais com a natureza e de viver em comunidade para trás e a música pode resgatar isso”, acrescentou.
Na mesa Formação integral e múltiplas linguagens, Renata Meirelles, do Território do Brincar, falou sobre a distância que ainda separa a educação formal da proposta da escola como um centro de cultura das infâncias. “Como podemos caminhar em direção a essa utopia? Temos algo que nos distancia dessa realidade que é a concepção equivocada de educação como transmissão de conhecimento. A ideia de que a criança só pode aprender o que eu ensinar e o pressuposto de que a criança só pode aprender o que eu considero aprendível”, disse.
Para finalizar o debate Território e direitos: a criança, o espaço público e a criação de sentidos que constituem a aprendizagem teceu reflexões sobre as relações heterogêneas entre as infâncias e a cidade. Para Juliana Prates, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), é preciso urgentemente reverter o discurso hostil à vivência do espaço público. “A fala de que é muito difícil levar a criança para a cidade tem a ver com o imaginário de que ela não tem competência para estar na cidade, que deve ser protegida desse espaço”, colocou.
A necessidade de instaurar processos de escuta das crianças também foi destacada por diversas falas. “Tem que haver uma escuta responsiva, onde tanto educador quanto criança se engrandecem com o que podem receber um do outro”, concluiu Silvia Cruz, da Universidade Federal do Ceará (UFC).