publicado dia 28/11/2022

Educação integral não se faz sem intersetorialidade; entenda 

Reportagem:

A Educação tem uma relação estreita com os demais direitos e deve ocupar um lugar central na articulação intersetorial entre todos eles. Isso é o que os participantes do debate Educação como direito indissociável dos demais direitos sociais e a centralidade dos sujeitos: o papel da intersetorialidade na Educação Integral” defenderam.

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A mesa fez parte do “1° Seminário Nacional de Educação Integral – Por uma agenda de direitos e políticas intersetoriais na reconstrução da democracia”, que ocorreu entre 25 e 26 de novembro em Diadema (SP).

O encontro foi organizado pela Prefeitura de Diadema (SP), pela Secretaria Municipal de Educação de Diadema, pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), pelo Observatório Nacional de Educação Integral, Cidade Escola Aprendiz e o Centro de Referências em Educação Integral.

A experiência de Lagedo do Tabocal (BA), que tem menos de 10 mil habitantes, ilustra a importância da intersetorialidade. Três escolas, uma delas em zona rural, passaram a implementar a educação integral, enquanto tempo e concepção. “Essas escolas não eram bem vistas, uma delas estava para fechar, e hoje tem fila de espera para matrícula, porque conseguimos recuperar o orgulho da comunidade por essas escolas”, disse Antonio Marcos de Araújo Sena, prefeito do município que regularmente visita as unidades presencialmente. 

Ele explica que isso foi alcançado garantindo que todos os estudantes tivessem acesso aos seus direitos, articulando o trabalho com a Saúde e a Assistência Social. “Uma criança bem alimentada tem capacidade de aprendizado maior, então a primeira coisa que faz na escola é refeição, e isso é promover igualdade”, disse Antonio Marcos. 

Para Braz Rodrigues, ex-diretor da Escola Municipal Campos Salles, na periferia de São Paulo (SP), considerado o principal responsável por transformar a comunidade de Heliópolis em “Bairro Educador”, a intersetorialidade também tem um papel fundamental em aproximar as pessoas de dentro e de fora da escola e criar uma rede de proteção.

“O movimento negro, de mulheres, indígenas, LGBTQIAP+, estão ajudando a construir uma consciência comunitária. Está nascendo algo grandioso, que começa pela articulação local em rede e chega ao nacional. Porque aí o poder público vai ter que fazer o que deve fazer, porque essa rede vai fazer frente às arbitrariedades”, defendeu Braz. 

Para que tudo isso seja possível, Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), apontou que são necessários quatro fatores para que a equipe escolar tenha tempo e condições de promover todas essas articulações. 

Ele começa citando a qualificação da formação inicial de professores, que precisa acontecer presencialmente e pautada pelo olhar para as questões sociais e territoriais dos estudantes, bem como a formação de todos os profissionais da escola. “A formação humana começa no portão da escola, com o porteiro”, disse Heleno, que também destacou a importância de um salário digno e de jornadas de trabalho adequadas para todos os profissionais da Educação. 

Além disso, pontuou que é inadmissível que escolas sigam sem água, energia elétrica, banheiro, biblioteca, quadra esportiva e um quadro completo de profissionais. “Precisamos dar condições iguais de oportunidades para todos os estudantes do Brasil para reduzir as desigualdades”, afirmou.

Por fim, ele cita a centralidade da gestão democrática e da participação social, sugerindo que todas as escolas tenham grêmio estudantil, associação de pais, mães e responsáveis, conselho escolar e construção participativa do Projeto Político Pedagógico.

Experiência brasileira com intersetorialidade 

Em termos de políticas públicas, o Brasil já tem experiência em como promover a intersetorialidade na prática. Juliana Macedo, que foi responsável pela articulação do Programa Bolsa Família e do Programa Mais Educação, contou como funcionou esse processo.

O Bolsa Família, agora substituído pelo Auxílio Brasil, acompanhava a frequência mensal dos estudantes à escola. Esses dado era cruzado com informações do então Ministério de Desenvolvidos Social, que permitiam visualizar, a respeito de cada criança e adolescente, dados completos sobre a família: situação de emprego, renda, se está recebendo o benefício, se há gestantes e realização de pré-natal, a composição da família, vacinação, acompanhamento de crescimento, entre outros.

De 2012 a 2014, o Programa Mais Educação criou uma parceria com os dados do Bolsa Família para definir critérios de adesão, a fim de garantir que a educação integral seria implementada nas escolas com estudantes socialmente vulnerabilizados. 

“Com isso conseguimos dizer quantas crianças em situação de pobreza estão em quais escolas para poder fazer atuações conjuntas. Enquanto política nacional, o Mais Educação vem para ampliar e potencializar a qualidade e a transformação educacional necessária. Mas os mais pobres geralmente são os últimos a entrar nas políticas de ponta, então fizemos o contrário”, explicou Juliana.

Outro ponto crucial da intersetorialidade é que ela pode promover a inclusão – não apenas dos estudantes com deficiência, mas de todos e todas. “Quem está fora da escola são meninos, pobres, pretos e com deficiência. Temos que trabalhar de outra forma, para que a educação inclusiva passe a integrar o sistema de educação de forma transversal, enquanto um direito”, disse Liliane Garcez, idealizadora e articuladora do COLETIVXS, que executa intervenções em prol da inclusão educacional e social.

Isso significa começar a pensar nas barreiras que precisam ser removidas a fim de garantir que ninguém seja expulso do sistema educacional. “Uma educação boa para alguns não é boa para ninguém”, afirmou Liliane.

Ela explicou que a experiência do Brasil com o programa de Benefício de Prestação Continuada (BPC) mostra a efetividade do trabalho intersetorial. Em 2008, quando foi feito um balanço do programa, 70% das crianças e adolescentes que recebiam o auxílio estavam fora da escola. A partir desses dados, perguntaram para as famílias o motivo disso. As respostas giravam em torno da falta de transporte, muitas consultas na hora da escola e porque “a diretora falou que o lugar dele não é lá”.

“O que fizemos foi articular Saúde, Assistência Social e Educação. Em 2011 fizemos um novo levantamento e percebemos que, com isso, conseguimos inverter a curva: 70% estavam na escola e 30% ainda estavam fora. Isso é política integral e integrada exitosa”, disse Liliane.

Assista aos dois dias de evento e leia as demais reportagens de cobertura do 1º Seminário Nacional de Educação Integral:

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