publicado dia 16/07/2018
Comunicação intercultural e sua relevância na escola
Reportagem: Da Redação
publicado dia 16/07/2018
Reportagem: Da Redação
Por Profa. Dra. Janice Cristine Thiél
Entre os temas mais discutidos hoje estão as questões da inclusão e da diversidade. Tais questões são certamente significativas e merecem a atenção do educador para que não se tornem apenas palavras a serem inseridas nos discursos, mas transformem-se em saberes, ações e atitudes que promovam o respeito pelo outro, a convivência pacífica e o aprendizado constante.
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Janice Cristine Thiél é doutora pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), professora titular de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e autora do “Pele Silenciosa, Pele Sonora: A literatura indígena em destaque”, publicado pela Autêntica.
Sabemos que precisamos formar um cidadão global, que utiliza redes de conexões e de construção de relações sociais, mas também atento às questões locais. Temos a percepção de que há inúmeras culturas no mundo com as quais interagimos e nem sempre conhecemos.
Estereótipos são construídos com base em noções etnocêntricas, centradas na cultura de um grupo ou local, que é vista como superior ou melhor que outras, o que pode levar a numerosos conflitos. Contudo, para que a interação entre os povos aconteça de modo que todos tenham oportunidades de crescimento, cooperação e valorização, é preciso que se promova na escola a discussão e a realização de atividades voltadas para a comunicação intercultural.
A cultura nos define, constrói nossa identidade, porém não nos conectamos com uma única cultura. John R. BALDWIN et al (2014, p.4) definem cultura como “o estilo de vida de um grupo de pessoas, incluindo símbolos, valores, comportamentos, artefatos e outros elementos compartilhados”.
A cultura pode ser percebida dentro de modelos, como pro-põem Bob DIGNEN e James CHAMBERLAIN (2009, pp. 13-14): o modelo Iceberg, que demonstra que a cultura tem elementos visíveis e invisíveis e a maior parte dos aspectos culturais (crenças, valores, etc.) fica ‘submersa’ e é somente perceptível quando surge um conflito; o modelo Pirâmide, criado por Geert Hofstede, que indica que há elementos universais, na base da pirâmide, compartilhados por todos (rir ou chorar), elementos coletivos, pertencentes a grupos (família, turma de amigos, grupo de trabalho, etc.) e também elementos individuais, no topo da pirâmide, relativos a cada personalidade; e o modelo Cebola, mostrando que há vários níveis para se perceber as culturas, pois todas têm alguns valores centrais que levam a crenças e atitudes, à criação de instituições e a produtos, que estão na camada mais externa.
Toda comunicação é, na verdade, intercultural e se realiza efetivamente quando reconhecemos e/ou entramos em contato com pessoas ou grupos afiliados a culturas diferentes. Como vimos, há inúmeros fatores e muitas culturas envolvidas naquilo que chamamos ‘nossa cultura’, ‘cultura nacional’, ou ‘cultura estrangeira’ que merecem nossa atenção e de nossos alunos.
Muitas atividades podem ser sugeridas para a inserção da comunicação intercultural na sala de aula. Proponho algumas atividades, que podem ser adaptadas ao nível dos alunos, fundamentadas na Aprendizagem por Projetos, para que possa ser promovida a percepção dos elementos que compõem nossas culturas, a compreensão de culturas diferentes e a comunicação intercultural no Ensino Fundamental e Médio:
Por exemplo, os alunos podem escolher uma região do país natal, um país estrangeiro, um ambiente formal ou informal para fazer pôsteres, pequenas apresentações ou encenações para apresentar sua pesquisa sobre a cultura escolhida. Essa é uma maneira dinâmica e motivadora de discutir como o que pode ser culturalmente aceito em um espaço pode ser inadequado ou levar a equívocos e conflitos em outro.
Os alunos podem preparar pequenas apresentações sobre o que viram, a cultura que originou os elementos da exposição e como a exposição contribui para o conhecimento cultural.
Por exemplo, ‘Boa sorte!’, ‘Até logo’, ‘Não sei’, ou para indicar números. Gestos aceitos em algumas comunidades e contextos podem ser ofensivos em outras. Raramente pensamos sobre nossa linguagem corporal. Assim, é importante discutir sobre nossa postura e os gestos que utilizamos em diferentes contextos. Esse tipo de estudo promove autoconhecimento, conhecimento do outro e a percepção de que culturas diferentes podem utilizar gestos parecidos mas constroem significa-dos diversos.
Um ponto de partida para discussão pode ser a maneira como o discurso é utilizado para cumprimentos no dia a dia. Quando alguém pergunta “Tudo bem?”, a resposta demonstra a afiliação cultural: “Bem, obrigado” ou “De boas”. As culturas são dinâmicas e as transformações podem ser um ponto para discussão com os alunos. Quando os estudantes têm uma percepção maior da variedade do discurso, podem discutir o que o discurso expressa sobre seus interlocutores e como revela o pertencimento de uma pessoa a um grupo etário, social, ideológico, a um ambiente ou contexto, às identidades e visões culturais desse indivíduo.
A proposta possibilita perceber como grupos de gerações diferentes interagem com pessoas do próprio grupo e com pessoas de grupos diferentes.
Corcovado no Rio de Janeiro, Teatro Amazonas em Manaus, Jardim Botânico em Curitiba, Torre Eiffel em Paris, Estátua da Liberdade em Nova Iorque ou objetos que sejam relacionados a certas culturas (totens ou apanhadores de sonho indígenas, bonecas russas/matrioskas, etc) para pesquisar a origem, os significados e relevância para a cultura local.
Os alunos podem ler a linguagem verbal e não-verbal para comentar. O projeto pode envolver a escolha de uma cena do filme para representar os aspectos culturais que se destacam. Um roteiro para observação da cena pode ser preparado pelos próprios alunos para orientar os colegas na observação e discussão.
Os alunos que são músicos ou que cantam e dançam podem ter a chance de interpretar músicas diversas; pôsteres/imagens sobre festividades e cerimônias de diferentes culturas podem ser expostos.
As culturas regionais, culturas dos imigrantes e migrantes podem ser pesquisadas em termos linguísticos, artísticos, culinários, entre outros, para que sejam conhecidas e para que alunos de diversos ambientes possam expressar e valorizar suas diferenças.
Quando não conhecemos a cultura do outro, do diferente, é muito fácil julgá-lo e rotulá-lo como bárbaro ou primitivo. Segundo Francis Wolff (2004, p. 42), “uma civilização é enriquecida por uma pluralidade de culturas, enquanto uma cultura é bárbara quando é apenas ela mesma, só pode ser ela mesma, permanece centrada e, portanto, fechada sobre si mesma.” Ao estudarmos e refletirmos sobre a diversidade cultural, começamos a ter mais consciência sobre nossas próprias atitudes, as crenças e valores que as sustentam. O conhecimento da diversidade e a comunicação intercultural constroem pontes e, citando novamente Wolff (2004, p. 42), “aqueles que reconhecem que o homem se diz em vários sentidos podem se dizer civilizados.”
BALDWIN, John R. et al. Intercultural communication for everyday life. West Sussex, UK: Wiley & Sons, 2014 (versão virtual).
DIGNEN, Bob; CHAMBERLAIN, James. Fifty ways to improve your intercultural skills. London: Summertown Publishing, 2009.
WOLFF, Francis. Quem é bárbaro? Tradução de Dorothée du Bruchard. In: NOVAES, Adauto (org.) Civilização e barbárie. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.