publicado dia 25/05/2017
Sucesso da BNCC depende da formação dos professores, defendem especialistas
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 25/05/2017
Reportagem: Ingrid Matuoka
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) não poderá ser implementada integralmente enquanto a formação dos professores não for atualizada.
Essa é a conclusão dos especialistas que participaram, nesta quarta-feira (24/05), do 2º Fórum de Inovação Educativa, realizado pela Folha de S. Paulo e a Fundação Telefônica Vivo, na Unibes Cultural, em São Paulo.
“O grande desafio é como ensinar o professor a implementar o que está escrito na Base”, apontou Guiomar Namo de Mello, diretora da Escola Brasileira de Professores, na mesa “A Base Curricular e a chance de rediscutir o papel dos professores”. Para que isso ocorra, enfatizou, as universidades precisarão se adaptar já que são as responsáveis pela formação dos docentes.
Também presente na mesa, Teresa Pontual, diretora de Currículos e Educação Integral do Ministério da Educação (MEC), afirmou que apesar do documento trazer avanços ao estimular o ensino e o aprendizado investigativo, bem como por estabelecer quais conteúdos as crianças e adolescentes já devem dominar de acordo com a idade, não é possível garantir que os professores saberão com precisão o quê e como deverão ensinar.
Questionada sobre a retirada das menções explícitas à identidade de gênero e orientação sexual das competências gerais da BNCC, a representante do MEC argumentou que “um rápido ctrl + F” para buscar essas palavras no texto prova que elas não foram suprimidas do documento e que permanecem integradas ao currículo.
A segunda mesa do fórum aprofundou o debate sobre como melhorar a formação inicial dos professores. Paula Carolei, coordenadora de graduação em Design Educacional na Unifesp, propôs diálogo antes de qualquer medida ser aplicada. “A universidade pública é muito focada na pesquisa isolada e precisamos abrir a conversa para a sala de aula, para a sociedade. Diante da complexidade das questões educacionais, não adianta polarizar, mas construirmos juntos soluções”.
A professora também dividiu sua experiência de implementação do curso de Design Educacional na Unifesp: “a universidade inteira foi contra”, disse. Desde 2017, a instituição oferta a primeira graduação à distância em Tecnologia em Design Educacional com o intuito de formar profissionais aptos para planejar, coordenar, implementar e avaliar projetos educacionais on-line, presenciais ou híbridos.
A solução encontrada por Paula diante da resistência acadêmica foi ouvir. “Convidamos os professores para construir dialogando, sugerindo e fazendo oficinas. Se eu simplesmente chegar de cima para baixo, os professores atuais não vão aceitar novas propostas. Temos que trabalhar juntos”, afirmou.
A especialista defendeu ainda que o ensino de tecnologia deve fugir da lógica instrumental e ir além: “temos que trabalhar o processo, a lógica, e como utilizá-la dentro de um contexto. Olhar a realidade e fazer a solução pedagógica caber no projeto. A grande transformação está na consciência da ação”.
Mário Ghio, vice-presidente do grupo educacional Kroton, defendeu uma questão controversa. Para resolver o problema do déficit de professores de Matemática, Química e Física na rede, por exemplo, Ghio apoiou a proposta de que profissionais do mercado possam lecionar em escolas da Educação Básica em disciplinas relacionadas à sua formação – prática conhecida como “notório saber”.
“Se um engenheiro for demitido, ele pode fazer uma complementação pedagógica e ir dar aula. Claro que não com a carga horária absurda que é hoje, mas algo como 200 ou 300 horas de formação pedagógica e outras 300 ou 400 de prática de ensino”. Hoje, são necessárias mil horas de formação teórica seguidas de 400 de prática.
Naomar Almeida, reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia, também disse acreditar que o notório saber não traz prejuízos ou precarização para o ensino e para a profissão. “Professor no interior da Bahia é muito respeitado e temos uma altíssima taxa de escolha pela Licenciatura. Claro que isso é muito diferente da periferia de São Paulo, por exemplo, mas você pode trabalhar a formação dos sujeitos mais nas lógicas e métodos do que no conteúdo”, disse.
Os críticos à prática do notório saber, no entanto, alegam que a estratégia retira do Estado a responsabilidade de fazer com que a profissão se torne mais atrativa, com jornadas, remuneração e condições de trabalho adequadas, além de colocar em sala de aula professores sem a qualificação necessária e ameaçar os cursos de formação docente.