publicado dia 01/11/2018

André Lázaro: “Repetir enganos (sobre kit gay) não cria uma verdade”

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Artigo publicado originalmente no O Globo e reproduzido com a autorização do autor

O presidente eleito Jair Bolsonaro, em entrevista ao Jornal Nacional no dia seguinte à vitória eleitoral, voltou a falar sobre o que chama kit gay, usou meu nome e me atribuiu intenções que não são minhas. Ao retirar minha frase de contexto, quis dar materialidade ao que não existe: o kit gay.

André Lázaro foi Secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC de 2007 a 2010 e participou do Programa Brasil sem Homofobia.

Aos fatos: em 2004, o governo aprovou o Programa Brasil sem Homofobia, um esforço conjunto de ministérios para o “Combate à Violência e à Discriminação contra GLTBs e Promoção da Cidadania Homossexual”. O MEC atuou no programa com diversas ações voltadas para a formação de professores.

Em 2008, o Ministério Público Federal enviou ao MEC o documento MPF/PRSP Nº 06/2008, para “recomendar ao Secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação” que “lance edital específico para selecionar e financiar a produção de materiais educativos sobre orientação sexual, a serem distribuídos em larga escala nas escolas públicas estaduais e municipais de todo o país”. O não atendimento, prossegue o documento, “acarretará a adoção, pelo Ministério Público Federal, das medidas judiciais e administrativas pertinentes”.

Por pressão do movimento social e da Frente Parlamentar pela Cidadania LGBT, a Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados aprovou para 2009 uma emenda parlamentar com objetivo de produzir materiais para o programa Brasil sem Homofobia. No dia 23 de novembro de 2010, em reunião conjunta das Comissões de Legislação Participativa, Educação e Cultura e de Direitos Humanos, foram apresentados, ainda sem aprovação do MEC, alguns dos materiais financiados pela emenda.

Nesta oportunidade, na presença de deputados, lideranças dos movimentos LGBT e professores, segundo transcrição do evento, fiz o comentário sobre o beijo lésbico para concluir que: “a língua pode ser usada para falar, não para dar beijo”. E acrescentei: “Seria ilusório eu chegar aqui e dizer que o MEC vai acolher tudo. Seria mentira, e ninguém merece mentira”. Nenhum dos vídeos apresentados trazia beijo, carícias ou cenas de sexo.

Apesar disso, o material não foi aprovado pelo MEC, não foi impresso e não foi distribuído. Nunca existiu kit gay nas escolas. Não houve material com a intenção de mudar a orientação sexual de ninguém. Não houve o nono seminário LGBT infantil.

É importante lembrar que a reunião de 23 de novembro de 2010 também prestava homenagem à mãe do jovem Alexandre Ivo que, em 20 de julho de 2010, havia sido barbaramente assassinado em São Gonçalo. Sua morte foi por homofobia, e seus assassinos ficaram impunes.

A homofobia mata e precisa ser combatida nas escolas, nas igrejas, nas ruas, nas empresas. E também nas famílias. Há violência contra as pessoas em razão de sua orientação sexual. Para combater essa violência são necessários acolhimento e informação.

A educação de que o país precisa deve tratar dos desafios que o país enfrenta. Educação para a paz, com respeito pelas diferenças, o reconhecimento das diversidades e a garantia de aprendizagem para todas as pessoas.

Por que a escola brasileira precisa discutir gênero e orientação sexual

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