Como trabalhar a igualdade de gênero na Educação Física?
Publicado dia 21/07/2017
Publicado dia 21/07/2017
A Educação Física talvez seja ainda uma das disciplinas mais marcadas pelos estereótipos e desigualdades de gênero. Isto porque, historicamente, esteve baseada na separação entre os sexos para a realização dos diferentes jogos, esportes e brincadeiras que a compõe.
Enquanto algumas atividades eram destinadas apenas aos homens, como o futebol e o basquete, outras ficavam circunscritas à participação feminina, a exemplo das danças.
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Essa segregação apoiava-se na noção cultural de que a prática esportiva associava-se ao universo masculino. “Vencer desafios, superar limites, enfrentar oponentes, dor e esforço eram tidas como experiências restritas aos homens, relegando às mulheres a leveza, fluidez, graça e sensibilidade”, explica Marcos Neira, professor da Faculdade de Educação da USP e coordenador do Grupo de Pesquisas em Educação Física Escolar.
Nesta perspectiva, não só os esportes, mas algumas brincadeiras e praticamente todas as lutas foram concebidas como territórios de expressão e imposição de uma certa masculinidade, sem muito espaço para a participação das mulheres.
A divisão de atividades específicas para os meninos e específicas para as meninas é um fóssil pedagógico que precisa ser varrido de todas as escolas se quisermos construir uma sociedade mais justa e democrática
Concebido como um instrumento de disciplinarização dos corpos, o esporte moderno valeu-se da ideia da suposta “fragilidade” das meninas para impedir a circulação da mulher/menina no espaço público, restringindo seu campo de ação ao ambiente doméstico.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) não há recomendação de separação.
Já os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) recomendam aulas mistas, tidas como uma oportunidade para que os alunos convivam, compreendam e respeitem suas diferenças.
“Não há outra explicação para a segregação. Essa visão comumente circula amparada em falsas teorias biológicas ou psicológicas. A mulher não é ‘geneticamente’ frágil, assim como o homem não é ‘geneticamente'” forte”, diz o professor.
Assim, a existência de turmas masculinas ou femininas para as aulas de Educação Física ou mesmo a divisão de atividades específicas para os meninos e específicas para as meninas, segundo Neira, é um fóssil pedagógico que precisa ser varrido de todas as escolas se quisermos construir uma sociedade mais justa e democrática.
“Essas situações trazem efeitos educacionais perversos, pois vão ensinando a meninos e meninas concepções distorcidas sobre eles próprios e os lugares que podem ocupar no cenário social”.
Nos últimos anos, felizmente, esse cenário vem se alterando, assumindo aspectos um pouco mais inclusivos. No entanto, esse movimento não acontece ainda com a velocidade e amplitude necessárias.
Questão de infraestrutura
Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), 35% das escolas públicas no País não possuem quadra poliesportiva; 15% possuem quadras descobertas e 30% possuem quadras cobertas e descobertas.
É possível observar, por exemplo, que são poucas as famílias que apoiam o envolvimento das meninas no boxe, caratê ou mesmo nos videogames que retratam situações de combate.
Por outro lado, meninos que participam de atividades como balé ainda são alvos de preconceito.
Diversifique o repertório:
Para aulas mais inclusivas, o professor também deve ter em mente que é necessário selecionar experiências pedagógicas adequadas e diversificadas para o tratamento das práticas corporais.
Além disso, insistir em situações didáticas que apenas exponham a dificuldade das crianças ou jovens só reforça as diferenças em sala de aula.
É importante tematizar brincadeiras, danças, esportes, ginásticas e lutas realizadas por distintos grupos sociais – de gênero, religião, etnia ou classe.
Aponte e debata as condutas segregacionistas:
É fundamental que os discursos que estigmatizam as pessoas sejam problematizados e as condutas segregacionistas, combatidas.
Se os meninos não estão passando a bola para as meninas, a atividade precisa ser interrompida e as razões dessa postura têm que ser transformadas em objeto de análise e crítica.
Da mesma forma, se os meninos se recusam a participar das danças ou da ginástica rítmica, esse comportamento deve ser debatido e questionado. O pior que pode acontecer é a escola ausentar-se dessa responsabilidade.
A desconstrução dos discursos pejorativos ou das posturas preconceituosas só acontecerá se outros conhecimentos forem agregados às experiências pedagógicas para além das vivências corporais.
Apresente outras realidades:
Meninos e meninas precisam saber que a ocorrência social das práticas corporais nem sempre foi da maneira como hoje conhecemos, nem tampouco acontece da mesma forma em todos os lugares.
Há países em que o futebol é uma prática bastante comum entre as mulheres. O balé já foi uma dança exclusivamente masculina e, em alguns povos, existem lutas praticadas igualmente por mulheres e homens.