Em Natal (RN), EE Alceu Amoroso Lima prepara a escola para o tempo integral

Publicado dia 17/12/2024

Selo que identifica o Especial Escolas de Educação IntegralResumo: Em Natal (RN), a Escola Estadual Alceu Amoroso Lima prepara sua infraestrutura, recursos e equipe docente para ampliar a jornada dos estudantes para o tempo integral. Conheça a história da escola e confira um Raio-X detalhado de seu trabalho no Especial Escolas de Educação Integral.

Há 7 anos a Escola Estadual Alceu Amoroso Lima, em Natal (RN), trabalha a partir da concepção de Educação Integral. Foi assim que a escola conseguiu vencer as altas taxas de evasão e reprovação, baixas aprendizagens e violências que permeavam seus muros. 

Agora, se prepara para um novo desafio: em 2025 vai ampliar a jornada parcial de 4 horas e 30 minutos para o tempo integral de 8 horas e 40 minutos, multiplicando as oportunidades de desenvolvimento integral de seus estudantes.

Em 2024 a escola completou 40 anos e até recentemente não havia passado por nenhuma reforma de alta complexidade. Não havia quadras de esportes ou espaços para convivência comunitária. 

A cozinha era precária para realizar no mínimo três refeições diárias necessárias para o tempo integral e a climatização das salas de aula era insuficiente para o calor da região.

“Até aqui recusamos o tempo integral pelo bem estar dos funcionários e estudantes, mas nos preparamos para essa ampliação e reestruturamos a escola”, diz Reinan Alessandro de França, que foi gestor da escola entre 2017 e 2023 e hoje atua como coordenador administrativo-financeiro.

“Estamos muito felizes de conquistar isso, principalmente porque estamos em uma região altamente vulnerabilizada, com crianças e adolescentes passando fome e submetidos a violências em casa e na rua”, acrescenta Reinan, afirmando que o tempo integral também vai permitir um melhor enfrentamento a essas violações de direitos.

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Fanfarra da escola realiza apresentações pelo bairro.

Crédito: Reinan Alessandro de França

Apesar das reformas, não foi possível ampliar as salas de aula, o que não permitiu à escola seguir com o atendimento de seus 333 estudantes de Ensino Fundamental. A partir do ano que vem, a previsão de atendimento é de 265 (80%) crianças e adolescentes.

Para conduzir esse processo, a gestão organizou reuniões e formações com toda a comunidade escolar para ouvir o que esperavam da escola, dialogar sobre a proposta do tempo integral e pactuar acordos sobre o regimento e o Projeto Político Pedagógico.

“Algumas famílias não queriam o tempo integral e assim chegamos nessa quantidade de matrículas possível”, explica Reinan. 

“Precisamos de plano de carreira e salário para os professores. Nosso sonho é ter todos eles com dedicação exclusiva”, diz Reinan Alessandro de França

Em relação aos recursos para implementar o tempo integral, o coordenador ressalta que falta apoio da União e Estado: “A maioria dos programas envia verbas de acordo com a quantidade de alunos na escola. Se duplicamos o tempo, duplicamos os gastos, mas eles não contabilizam dessa forma e nosso recurso vai diminuir. Por enquanto, só o Programa Nacional de Alimentação Escolar permite esse cálculo, mas custeio e capital, não”.

A organização da equipe docente também traz desafios. Parte dos professores vai deixar a escola principalmente porque tem dois vínculos, com o Estado e o município, e a dedicação exclusiva neste caso significaria uma redução da remuneração. 

“Precisamos de plano de carreira e salário para os professores. Nosso sonho é ter todos eles com dedicação exclusiva, mas está complicado conseguir isso”, lamenta Reinan. 

Dessa forma, novos professores foram contratados e a escola contará com 28 docentes, quatro a mais do que possui atualmente. Os professores que não têm dois vínculos aceitaram 10 horas suplementares às 30 atuais e vão realizar as oficinas, ateliês e projetos do tempo integral, que já conta com a parceria de ex-estudantes e voluntários da comunidade.

O trabalho pedagógico da Amoroso Lima

Para implementar a concepção de Educação Integral em 2017, a escola partiu de uma escuta da comunidade. Foi assim que descobriram que mais de 55% dos estudantes não moravam mais com o pai e a mãe.

“Eram muitas famílias perdidas para o tráfico, que inclusive funcionava de maneira institucionalizada na unidade. Saber quem são nossos estudantes e famílias foi necessário para começar o trabalho e entender como realmente poderíamos contribuir com uma mudança na vida dessas pessoas”, indica Reinan.

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A horta da escola, que mobiliza uma série de projetos e atividades práticas

Crédito: Reinan Alessandro de França

Começaram as movimentações na escola. A equipe de esportes passou a treinar para competir em jogos escolares e ex-estudantes voltaram à unidade para compartilhar suas trajetórias de sucesso e inspirar os adolescentes. A comunidade e a Prefeitura ajudaram a pintar e arborizar a escola e o trabalho pedagógico deixou de ser conteudista e passou a visar o desenvolvimento das múltiplas potencialidades dos estudantes. 

“A maioria dos projetos não partiu da gestão, mas foram pensados dentro de sala de aula, por professores e estudantes. A gestão alinha as condições e dá autonomia para eles desenvolverem”, evidencia Reinan sobre um dos principais fatores que levou a escola a se transformar.

Parar de usar materiais descartáveis na escola, por exemplo, foi implementado por sugestão de um estudante. Também foram as crianças que ajudaram a construir a horta e até hoje fazem o plantio e manutenção.

“Quando trazemos os conteúdos para a realidade deles, colocamos o aluno dentro daquela situação, o que também traz pertencimento, engajamento e consciência de que ele precisa cuidar de onde vive”, diz Alexandre Jurema

Em torno dessa horta se articulam várias áreas do conhecimento e projetos, como Matemática, Ciências, Educação Financeira e Alimentar, e pesquisas sobre plantas medicinais. Parte de sua produção enriquece a merenda escolar e a outra será doada às famílias, que poderão consumir e vender os vegetais.

A escola também possui aulas de taekwondo, capoeira, futsal, artes, coral, fanfarra e a Rádio Alceu. Um professor é responsável por coordenar cada um desses projetos junto a um estudante ou ex-aluno voluntário. 

A todo tempo os professores costuram o currículo básico às questões do território e executam metodologias que instigam os estudantes a construir conhecimentos coletivamente e aplicá-los em situações práticas. 

“Quando trazemos os conteúdos para a realidade deles, colocamos o aluno dentro daquela situação, o que também traz pertencimento, engajamento e consciência de que ele precisa cuidar de onde vive”, observa o professor Alexandre Jurema, que leciona Geografia na escola há 11 anos. 

Sempre que possível, as turmas realizam atividades fora da escola para fortalecer esse vínculo com as questões reais da sociedade. Recentemente, visitaram um campo eólico e estudaram sobre fontes de energia, fizeram a geolocalização e tombamento de árvores do entorno da escola, e uma aula de campo na feira livre da cidade, além de visitas ao Forte dos Reis Magos e aos museus do minério e de Câmara Cascudo.

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Registro da visita ao campo eólico da cidade.

Crédito: Reinan Alessandro de França

“Queremos que eles descubram a potencialidade do território, seus aspectos culturais, profissionais e esportivos, e valorizem a cultura indígena, que é muito forte no bairro”, diz Reinan.

Para organizar as saídas, os professores realizam um planejamento no início do ano e listam os lugares que gostariam de visitar na cidade. Quanto antes fazem a solicitação à Secretaria de Educação, maiores são as chances de conseguir transporte.

“Em todas essas atividades os estudantes sabem que estão sendo avaliados e com quais critérios. Não deixamos para fazer só uma prova no final. Valem as atividades, trabalhos, seminários, produções artísticas, participação em aula, porque eles têm diferentes formas de mostrar o que aprenderam”, aponta o professor Alexandre.

“Nosso maior reconhecimento é a mudança na vida dos estudantes”, diz Reinan.

“Não temos o objetivo de preparar os estudantes para avaliações internas ou externas – nosso compromisso é com o preparo para a vida e os obstáculos que eles vão enfrentar”, reforça Reinan.

Nos anos seguintes à implementação da concepção de Educação Integral, a escola recebeu diversas premiações da Secretaria de Educação, reconhecimento social, passou a integrar a Rede de Escolas Associadas da UNESCO (Rede PEA) e se tornou uma das escolas com mais medalhas no taekwondo do Estado. 

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Crianças da Amoroso Lima conhecem mais sobre as culturas dos povos originários

Crédito: Reinan Alessandro de França

Kelma de Azevedo, mãe de dois ex-estudantes da escola, conta que eles começaram e concluíram o nível fundamental na Alceu. “Agora eu tenho gêmeos que a partir de 2026 vão para o 1° ano e é na Alceu que eu quero que eles estudem, mesmo com outras escolas mais perto da minha casa”, diz. 

Ela conta que seus dois filhos maiores ingressaram em instituições de renome de Natal após o Ensino Fundamental e um deles sempre visita a escola para rever os amigos que fez. “A Educação começa em casa, mas a escola forma eles para um futuro ainda melhor, e vejo quanto meus filhos mudaram na Alceu”, relata. 

“Nosso maior reconhecimento é a mudança na vida dos estudantes. É ver quanto eles aprendem, se desenvolvem e o fato de que nunca mais perdemos nenhum jovem para o tráfico de drogas, que sempre foi um dos nossos maiores problemas”, afirma Reinan. 


Ficha técnica | Especial Escolas de Educação Integral

Coordenação técnica: Fernando Mendes, Natacha Costa e Raiana Ribeiro
Edição: Tory Helena
Reportagem: Ingrid Matuoka
Conteúdo digital: Larissa Alves
Design: Vinicius Corrêa

Centro de Referências em Educação Integral
O Centro de Referências em Educação Integral promove, desde 2013, a pesquisa, o desenvolvimento metodológico, o aprimoramento e a difusão gratuita de referências, estratégias e instrumentais que contribuam para o fortalecimento da agenda de Educação Integral no Brasil.

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