Como planejar um projeto de educação sexual na escola
Publicado dia 20/02/2020
Publicado dia 20/02/2020
A educação sexual na escola passa por oferecer informações e debater sobre métodos contraceptivos, planejamento familiar, infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), direitos LGBTQ+ e atuar pela prevenção de violências e da gravidez não planejada.
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Mas para que tudo isso tenha algum significado para os estudantes e garanta a aprendizagem, é preciso que a prática pedagógica inclua a participação dos alunos e compreenda a todos e todas de maneira integral.
É nessa perspectiva que a Reprolatina atua desde 1999, em diversos países da América Latina, formando educadores, profissionais da Saúde e adolescentes em educação integral para a sexualidade.
O que é a educação sexual?
A educação sexual na escola engloba uma série de conhecimentos sobre saúde, corpo, identidade, sentimentos, bem-estar, consentimento, responsabilidade, autoproteção, direitos humanos, autonomia, projeto de vida e inclusão, considerando todas as diversidades: de gênero, sexual, étnicas-raciais, entre outras. Nenhuma educação sexual visa ensinar ou estimular que os alunos pratiquem algum tipo de ato sexual em si, tampouco incentiva que eles se identifiquem com algum gênero ou orientação sexual.
A presidenta da organização, Margarita Díaz, destaca que a educação sexual é um direito de todos, e na escola ela é garantida pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), em seus Parâmetros Curriculares Nacionais. Ela deve, portanto, fazer parte do currículo, porém não apenas como mais um conteúdo escolar: “a educação sexual precisa vir por meio de uma metodologia libertadora e crítica, para permitir aos estudantes transformarem suas realidades”.
É por isso que práticas pedagógicas relacionadas ao tema devem fazer parte de um projeto permanente e interdisciplinar, com educadores capacitados, tendo por base evidências científicas, e incluindo as questões de diversidade, direitos sexuais reprodutivos e igualdade de gênero. “Esses são os fatores que diferenciam a educação sexual que ocorre na escola da que ocorre em casa”, afirma.
Em entrevista ao Centro de Referências em Educação Integral, a especialista destacou os principais pontos que uma escola precisa levar em consideração no momento de planejar um projeto de educação sexual com seus estudantes, independentemente da etapa de ensino:
Promova algum método de escuta dos estudantes de sua escola para entender o que eles acham que é a educação sexual, e o que esperam aprender a partir de um projeto relacionado ao tema.
Em seguida, é hora de ouvir o território, tentando entender de que maneira o contexto político, social e econômico da área influencia em questões relacionadas à sexualidade, e quais afetam mais diretamente os estudantes. Por exemplo, se é uma área com altas taxas de gravidez na adolescência, ou a que distância fica o posto de saúde da escola.
As escolas não dão conta de resolver todos os problemas sozinhas — é preciso toda uma rede de proteção. Por isso, converse com as famílias para detalhar como vai funcionar o projeto, quais assuntos serão abordados, e de que maneira. Também mantenha um canal de comunicação aberto para que as famílias possam acessar a coordenadoria ou a direção em caso de dúvidas.
Outro ponto crucial é buscar agentes da Saúde e da Assistência Social ou representantes de Organizações da Sociedade Civil (OSCs) para firmar parcerias, promover ações conjuntas e, se for necessário, acionar a área mais facilmente.
Todo e qualquer trabalho de educação sexual deve fazer parte de um projeto de vida dos estudantes. Ou seja, ele envolve discutir causas e consequências de nossas ações pessoais, traçar planos e objetivos, e caminhos para atingi-los.
Isso oferece uma perspectiva mais ampla para os jovens sobre o que representa uma gravidez não planejada, as ISTs e até mesmo o uso abusivo de drogas. “Trata-se de uma habilidade que eles têm que desenvolver para construir projetos de vida e tomar decisões mais saudáveis”, explica Margarita.
Durante o desenvolvimento do projeto, vale dedicar um tempo para conversar com os estudantes sobre a importância da comunicação e de expressar sentimentos. “Isso é crucial porque a comunicação entre jovens e adultos é muito prejudicada — se não houver um vínculo de confiança, quando esse adolescente precisar do apoio de um adulto, ele não vai contar”, afirma a especialista.
Para além disso, é entre os pares que a maior parte das informações circulam, daí a importância de trabalhar a afetividade e a empatia, bem como os sentimentos negativos e o que se pode fazer com eles para além de agredir o outro. “Isso tende a reduzir a discriminação e o bullying, e a fortalecer a rede de apoio”.
A maneira de organizar a prática pedagógica também é parte importante do processo. Por isso, privilegie metodologias ativas, que promovam debates e reflexões e, sobretudo, deem espaço para os estudantes expressarem o que sabem, o que desejam entender e o que sentem sobre o tema. “É para fazer com os adolescente, e não para os adolescentes. Eles têm que participar de todo o processo”, diz Margarita.
Rodrigo Correia é educador da Reprolatina, e explica que o principal objetivo de um projeto em educação sexual deve ser o de criar espaços e possibilidades de compartilhar saberes e sentimentos.
“O importante é que tudo seja feito de maneira igualitária, e que os profissionais possam ouvir e entender quais são as informações que os estudantes têm e que precisam ser ressignificadas ou aprendidas”.
Confira algumas práticas pedagógicas que o educador recomenda e que podem ser realizadas com poucos recursos:
A caixa de perguntas: Coloque em um ponto estratégico da escola uma caixa aberta para receber perguntas anônimas dos estudantes ligadas à sexualidade. Um profissional capacitado responde as dúvidas semanalmente, afixando as respostas em um mural. “Os alunos obtêm suas respostas e a disseminação da informação se amplia para a escola inteira, porque às vezes a dúvida de um é a mesma de outro”, explica o educador.
Nessa prática, só vale um ponto de atenção, para que as informações contidas no mural sejam adequadas para a faixa etária que circula pelo local. Se não for possível separar os murais de acordo com as turmas, coloque uma caixa por sala, com seus próprios murais.
Rodas de diálogos: As rodas de conversa também funcionam para o caso de ter uma caixa por sala. A partir das dúvidas, um profissional pode ir respondendo as perguntas e conversando com a turma. Também é possível promover rodas temáticas periodicamente e convidar especialistas para debates.
Vídeo-debate: Usar vídeos pedagógicos e animações para disparar um debate também é uma maneira de engajar os estudantes na conversa. A Coletânea ECOS e o curta Minha Vida de João são alguns exemplos de produções audiovisuais que podem fazer parte desse momento.
Cartazes informativos: Proponha que os estudantes elaborem cartazes informativos sobre diferentes temas ligados à educação sexual, que serão espalhados pela escola. A atividade pode ser feita em conjunto com as disciplinas de Língua Portuguesa e Artes. “Quando eles produzem os cartazes, eles usam uma linguagem acessível, que faz sentido para eles”, diz Rodrigo.