Professora usa a cultura africana para ensinar matemática
Publicado dia 24/04/2018
Publicado dia 24/04/2018
Ao imaginar a calculadora mais antiga do mundo, é provável que pensemos no início dos computadores, com dimensões enormes, ou lembremos do ábaco, o instrumento de cálculo composto por bastões e contas. Mas a primeira ferramenta para calcular de que se tem notícia é o osso de Ishango, desenvolvido por africanos 20 mil anos antes de Cristo, a partir do fêmur de um macaco babuíno.
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“Esse é o tipo de informação que raramente temos na escola, porque só estudamos os matemáticos de sempre, quando desde muito antes dos árabes e gregos, os africanos, além dos egípcios, já dominavam os conhecimentos que estudamos hoje”, diz Andreia Viliczinski, professora que tomou para si a iniciativa de ensinar matemática por meio da cultura e da história africana, com o projeto que denominou “África, berço da matemática”.
A etnomatemática propõe ensinar matemática levando em consideração outras culturas que também produzirem e produzem conhecimento, de variadas maneiras, mas que são frequentemente apagadas das narrativas da sociedade e da escola. A afroetnomatemática, por sua vez, apresenta a matemática a partir da cultura africana.
As atividades para ensinar matemática por meio de projetos envolvendo a cultura africana tiveram início em 2016, na Escola Estadual de Ensino Médio Governador Celso Ramos, em Joinville (SC), quando Andreia pesquisou sobre etnomatemática e apresentou a ideia para os alunos, que se entusiasmaram com o assunto.
“Eu não conhecia a história dos negros no Brasil, só sabia o que aprendi no Ensino Básico. Pesquisando, passei a compreender as questões das relações raciais no País e perceber nas salas de aula e na comunidade muito preconceito e racismo. Mas durante o projeto notei também que alguns alunos se sentiram representados, se identificaram”, comenta a professora.
O início do projeto consistiu em assistir ao filme Besouro (2009), que traz parte da memória dos afrodescendentes no Brasil, ao relatar a história da capoeira e das religiões desse povo. Depois, a professora dividiu os alunos em turmas para realizarem, durante um mês, pesquisas sobre matemática e cultura africana.
Ao final do período, os alunos fizeram apresentações sobre o que descobriram. Estas primeiras atividades introduziram o tema, permitindo que os alunos fizessem suas primeiras descobertas e as compartilhassem com os colegas.
Em seguida, começaram os estudos matemáticos propriamente ditos: números primos, raciocínio lógico, geometria, ângulos, e probabilidade, envolvendo a contribuição de africanos para a ciência e sua cultura.
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Andreia usou os gráficos de Sona – representações simbólicas e narrativas da África central – para explicar análise combinatória e os búzios para tratar probabilidade
Andreia conta que usou os gráficos de Sona – representações simbólicas e narrativas da África central desenhadas na areia – para explicar análise combinatória e os búzios para ensinar probabilidade, já que eles, assim como a moeda, também têm dois lados. “Eu propunha exercícios como: qual a probabilidade de, em um jogo com quatro búzios, dois caírem abertos e dois fechados?”, conta.
Com o osso de Ishango, estudaram números primos e sequências matemáticas, fazendo reproduções da calculadora primitiva em argila, aprendendo que ela foi também o primeiro calendário lunar.Ao mesmo tempo, discutia com os jovens a história de como os búzios vieram para o Brasil, os tipos de jogos, quais são as religiões africanas e afro-brasileiras que os utilizam e os seus significados.
Para estudar fractais – figuras da geometria não-
“Os alunos se interessaram, se envolveram, e trouxeram a questão da música africana, que eu aproveitei para falar não só da música nos países do continente africano, mas também sobre o som, que nada mais é do que uma onda. Então fomos para trigonometria, amplitude, frequência”, conta Andreia.
Para finalizar o projeto, trabalharam dados do IBGE sobre as violências contra as mulheres negras, analisando sua incidência, atores, tipos de violência, entre outros pontos. “É nosso dever discutir as questões étnico-raciais e uma das maneiras é mostrar toda a contribuição dos negros construtores do conhecimento, porque eles têm um papel muito grande para a comunidade científica”, finaliza a professora.