Em San Miniato, crianças são protagonistas no processo de ensino-aprendizagem
Publicado dia 01/03/2016
Publicado dia 01/03/2016
Por muitas vezes, as crianças são tratadas pelos adultos como recipientes vazios que precisam ser preenchidos com cultura, lições de História, Matemática, Ciências, capacidade de aprender a ler e escrever etc. Muitas escolas, no entanto, trabalham na perspectiva oposta, defendendo que os pequenos têm plena capacidade de protagonizar uma série de atividades, se for dado a eles a necessária autonomia.
Segundo essa concepção, a educação infantil não é aquele primeiro momento no qual a criança recebe de forma unilateral uma série de conteúdos, como se chegasse vazia à escola, mas como um espaço onde ela deve aprender brincando e desenvolver autonomia sobre si. Esses são alguns dos pressupostos com a qual a rede de ensino de San Miniato, na Itália, trabalha para educar os seus pequenos.
Inspiradas pelas ideias do pedagogo Loris Malaguzzi (1920-1994), que veio a desenvolver a pedagogia da escuta, e na experiência da vizinha Reggio Emilia, a cidade de San Miniato tem um processo intenso de formação de professores, segundo Valéria Andreeto Gonçalves, autora da dissertação de mestrado sobre as experiências de Reggio Emilia e San Miniato.
Essa formação é baseada em alguns aspectos que ela considera essenciais para o desenvolvimento de boa qualidade na educação infantil. “A relação criança-educador representa um elemento fundamental para a relação educativa. Sabemos que para conseguir se comunicar e interagir com outras pessoas é necessário tempo, principalmente se nos referimos a uma criança pequena”, escreve em sua dissertação.
Para Valéria, um primeiro elemento importante na prática docente, e um dos marcos da formação em San Miniato, é o estabelecimento de uma relação de confiança entre o estudante e o professor para que a criança se sinta à vontade para se expressar. Isso tem reflexo direto na no processo de ensino-aprendizagem.
“O educador se vale de instrumentos e competências para criar um contexto seguro, através do qual entra em relação com a criança, mediante ações, posturas e linguagens. Verbalizar a expressão em relação à criança (o educador fala com ela, explica, lhe dá segurança antes de agir, etc) serve para dar uma resposta e um sentido às suas mensagens”, escreveu Valéria.
Ao invés de um conteúdo pré-determinado pelos professores, o que é trabalhado na sala de aulas são projetos pensados e desenvolvidos pelos alunos em parceria com os docentes. A linguagem, as metas, a forma de desenvolvimento do tempo do estudante são construídos junto com eles.
Para isso é necessário organizar um espaço físico que seja agradável e de fácil adaptação para novas atividades. As escolas da cidade italiana são compostas por mesas leves, papéis, tintas, cordões, canetas, lápis de cor. Tudo à disposição das crianças e daquilo que elas desejam criar.
Nessa lógica pedagógica baseada num espaço físico mais flexível e no trabalho do projeto de cada estudante, o papel do professor é pensar processos que ajudem as crianças a consolidar os conceitos que estão aprendendo.
“Da mesma forma como o aprendizado não é dividido nem isolado em categorias, as crianças voltam a projetos e aprendizados prévios para pensar novamente sobre as mesmas ideias. As coisas se movem em espiral e se estendem. Há um sentido de continuidade e de concatenação. Esse é um ambiente criado por milhões de perguntas, pensamentos e ideias, cuidadosamente elaborados a partir da contínua colaboração entre todas as pessoas envolvidas: pais, professores, administradores e as criança”, relata em seu mestrado.
Ela estabelece ainda que, tanto Reggio Emilia quanto San Miniato apresentaram resultados expressivos em termos educacionais, mas que isso não aconteceu do dia para a noite e foi fruto de um intenso debate e de investimentos na educação pública.
“Uma das características que distinguiu Reggio Emilia e San Miniato das demais regiões da Itália foi o intenso investimento e envolvimento na educação das crianças pequenas, um sistema público integrado, apoiando o empenho de diferentes entidades gestoras, vinculadas a convênios recíprocos de natureza financeira, social e formativa”.
“Uma escolha de pluralidade, sustentabilidade, participação social, que permitiu responder à questão da multiplicidade de referências culturais e pedagógicas, de promover um aumento da qualidade dos serviços através da troca e do diálogo, e de aumentar o número de lugares com um investimento de recursos múltiplos: privados, estatais e municipais”, completa Valéria.