publicado dia 26/09/2017

Qual o papel das escolas na prevenção do suicídio?

Reportagem:

A cada hora e 25 minutos, uma pessoa comete suicídio no Brasil. No mesmo período, outras três tentam tirar a própria vida. Entre jovens de 15 a 29 anos, esta já é a segunda maior causa de óbito no mundo, e a quarta maior no Brasil. 

Leia + Trabalhar as emoções é condição para uma educação integral

Estes números não param de crescer — entre 2011 e 2015, a taxa aumentou 12%, segundo o Ministério da Saúde — e o assunto se mostra cada vez mais presente na mídia, nas redes sociais, entre jovens e, portanto, dentro das escolas.

Mas se os dados mostram a urgência de debater o assunto, conversar com os alunos sobre suicídio não é uma tarefa simples.   

Para José Manoel Bertolote, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade Estadual de São Paulo e do Instituto Australiano pela Pesquisa e Prevenção do Suicídio da Universidade Griffith, oferecer uma educação integral é um caminho eficaz para a prevenção do suicídio entre jovens.

Em entrevista ao Centro de Referências em Educação Integral, o psiquiatra falou, entre outros pontos, sobre como o ambiente escolar pode auxiliar crianças e adolescentes a identificarem seus estados emocionais e expressá-los de formas construtivas. Confira:

Centro de Referências em Educação Integral: Como o senhor analisa este contexto em que tantos jovens cometem suicídio?

Um estudo publicado no Boletim de Psicologia de 2015 analisou os principais fatores que levam adolescentes a ter ideações suicidas. Dentre eles, aparecem brigas ou problemas com/dos pais, não ser escutado, solidão e sentimento de desproteção, bem como violências em geral (bullying, preconceito e discriminação, por exemplo). Ter a família próxima e alguém confiável para se abrir, por outro lado, são fatores de proteção.

José Manoel Bertolote: Trata-se de uma constante do mundo inteiro. O jovem não morre por doenças, mas de causas externas: acidentes, homicídios ou suicídios. No Brasil, a taxa de homicídios é muito maior.

Por enquanto, não é possível analisar no País quais são os fatores de risco, porque precisaríamos de estudos de autópsia psicossocial em todos os casos de suicídio, quando pessoas próximas de quem faleceu são entrevistadas para reconstruir o passado recente dessa pessoa e identificar estes fatores, mas ele ainda não foi feito.

Mas sabemos que no Brasil há vários fatores de risco e não há fatores de proteção adequados.

CR: A escola tem papel na prevenção do suicídio?

JMB: Tem, porque a escola é lugar de educação, mas ainda assim é limitado, porque o grande fator de prevenção do suicídio é a família, e ela vem falhando muito.

O que a escola pode fazer é dar informações e oferecer uma educação integral que ajude crianças e adolescentes a identificar seus estados emocionais, expressá-los de formas construtivas, e a saber procurar e pedir ajuda. Assim, estes jovens terão condições de trabalhar suas emoções desde cedo e, se for o caso, identificar o quanto antes um estado depressivo e as ideações suicidas e saberão agir sobre isso de maneira saudável.

Mas aí temos um problema seguinte. Onde procurar ajuda no Brasil? A rede básica de saúde e assistência social não está preparada para isso. Temos uma grande deficiência na rede pública de atendimento.

CR: Como tratar deste assunto com jovens?

JMB: Não adianta ir à escola fazer programas de prevenção de diabetes ou de prevenção de hipertensão especificamente, porque são poucos os alunos que estão em risco destas doenças. O que a escola tem que ensinar são regras gerais de alimentação e estilo de vida, porque falar diretamente e pontualmente sobre diabetes ou hipertensão vai gerar muita ansiedade. E com o suicídio é similar. Temos que ajudar os jovens a identificar seu sofrimento psíquico.

CR: Uma pessoa com ideações suicidas dá indícios disso?

JMB: A maioria dá sinais inequívocos. Diz literalmente que não aguenta mais a vida, que vai desaparecer, postam nas redes sociais falando sobre isso. E, ao mesmo tempo, quem está ao redor ignora ou finge que não viu e não ouviu. Ninguém faz nada, prefere acreditar que é só para chamar a atenção, até que acontece. Por isso, cada sinal de tendência suicida deve ser sempre levado muito a sério.

CR: E como um professor deve proceder ao enxergar estes sinais em um aluno?

JMB: Ele deve avisar a direção e a família imediatamente. E se o jovem tiver uma família estruturada, já será um passo muito grande.

CR: Se um aluno cometer suicídio, como lidar com a turma, os colegas e os próprios professores?

JMB: Quando isso ocorre, ou quando há uma tentativa séria, que a escola fica sabendo, existe o que se chama de programa de pósvenção. Trata-se de um conjunto de intervenções que podem ser feitas depois que ocorreu o fato. Isso vale para escolas, locais de trabalho e com as famílias.

Com a ajuda de profissionais, cria-se um ambiente seguro para as pessoas poderem falar sobre seus sentimentos, porque um suicídio desperta sentimentos violentos, como culpa, solidão, raiva, e isso tem que ser elaborado o quanto antes, e sempre de forma voluntária, para quem quiser falar.

Em geral, ninguém fica de fora, todos querem conversar. Se alguém ficar, isso deve chamar a atenção, porque às vezes ela é a pessoa mais atingida, e isso mexe tanto com ela, que nem consegue admitir.

Contate a qualquer hora, por telefone ou e-mail, o Centro de Valorização à Vida, um serviço gratuito de prevenção ao suicídio.

Telefone: 188
E-mail: [email protected]

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