publicado dia 29/04/2019

Os impactos do corte de vagas de tempo integral em Minas Gerais

Reportagem:

A Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais anunciou que reduzirá em quase 70% a quantidade de escolas em tempo integral no Estado. A medida afeta mais de 1.000 escolas e 80.000 estudantes. Em nota, a secretaria afirma que os cortes ocorrem em decorrência de “extrema precariedade financeira” e que serão mantidos os atendimentos em escolas com alunos de menor índice socioeconômico. 

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Cecília Cristina Resende Alves, ex-coordenadora do Programa de Educação Integral e Integrada da Secretaria de Educação de Minas, explica que o estado vive uma situação financeira grave e que cada matrícula de educação integral aumenta o custo-aluno em 65%.

Mas para além disso faltam no Brasil indicadores específicos para mensurar concretamente o impacto da educação integral na aprendizagem dos alunos, dificultando a justificativa da manutenção do programa para a sociedade. “É uma decisão que faz sentido se a sua perspectiva for a neoliberal, mas é equivocada porque há outros cortes possíveis”, aponta Cecília.

Ex-secretária de Educação de Minas Gerais, Macaé Evaristo lembra que a raiz da escassez de recursos está na aprovação da Emenda Constitucional 95, que congelou os investimentos em Educação. “Serão 20 anos de menos recursos para a Educação. Então estamos só no começo dessa história. Por isso, é um imperativo não só revogar essa EC, mas também ampliar a contribuição da União para o Fundeb.”

A decisão da Secretaria de Minas Gerais também vai na contramão das diretrizes postas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e pelo Plano Nacional de Educação (PNE), que priorizam o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.

Enquanto esteve no comando da Secretaria, Macaé conta que já sentia os efeitos dos cortes de investimentos do governo federal. “Em lugar de ceder, mobilizávamos mais esforços para conseguir continuar o atendimento”, diz.  

Lucinha Alvarez, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), endossa essa estratégia. “Quando falta dinheiro, é preciso buscar parcerias, cortar outros gastos. Mas dizer que não tem recurso e simplesmente cortar indica uma escolha política”, diz. 

A afirmação dialoga com o favorecimento que o governador Romeu Zema (Novo) dá à criação de escolas cívico-militares no estado. “Uma semana antes do anúncio do corte de vagas houve uma audiência pública sobre o assunto. Mas seguiremos defendendo que educação não é caso de polícia, é de política pública”, acrescenta Lucinha.

Contribuições da Educação Integral para Minas

O estado de Minas Gerais foi um dos pioneiros em ofertar educação integral em larga escala. Em 2018, por meio do programa Educação Integral e Integrada foram ofertadas vagas em tempo estendido em 1.640 escolas, atendendo 111.528 alunos. “A educação integral é indispensável para construir outras sociabilidades, promover a convivência democrática e uma nova forma de pensar o território e seu desenvolvimento sustentável”, defende Macaé, uma das idealizadoras da iniciativa.

Cecilia, que foi coordenadora do programa, conta que percebeu, a partir da expansão das vagas de educação integral, uma maior proximidade com a comunidade. “A educação integral permite que a comunidade veja que ali os professores dão aulas de Português e Matemática, mas que vão além: promovem também reflexões e interações com o território, conhecimentos sobre cultura e arte, comunicação e mídias e novas tecnologias”, afirma.

A especialista também destaca que, em mais de 230 municípios de Minas Gerais, a escola é o único equipamento público presente, e que mesmo sem um indicador oficial para mensurar os impactos da educação integral, pesquisadores e educadores que lidam no cotidiano com as famílias e estudantes desta modalidade percebem que as crianças e adolescentes aprendem mais e melhor, criam projetos de vida, e se sentem mais pertencentes à escola. “Esse cenário ajudava a lidar com a evasão escolar. Por isso, é preciso enxergar a educação integral como política de estado, e não de governos”, pontua Cecilia.

 

*Procurada pela reportagem, a Secretaria do Estado de Educação de Minas Gerais não retornou até a data de publicação da matéria

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