publicado dia 30/01/2015
Os desafios da educação integral para 2015
Reportagem: Juliana Sada
publicado dia 30/01/2015
Reportagem: Juliana Sada
“Para educar uma criança, é preciso uma aldeia inteira.” O dito africano, já conhecido de muitos educadores, revela que o desenvolvimento integral de um indivíduo não é tarefa simples. São necessários diferentes lugares, momentos e pessoas para educar uma criança, adolescente ou adulto – já que a educação é um processo que acontece ao longo de toda a vida.
Se estas ideias já vêm sendo debatidas há bastante tempo e são conhecidas de muitos, ainda persistem dificuldades para colocá-las em prática. O desafio se torna ainda maior com as demandas trazidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE), que determina, em sua 6ª meta, o aumento de vagas e escolas em tempo integral e, para isso, aponta a para a educação integral com diversificação do currículo e a ampliação dos espaços e agentes educativos, conectando a escola a uma ampla rede de proteção e efetivação dos direitos e oportunidades educativas para os estudantes.
Ao mesmo tempo em que inúmeros municípios e estados estão começando a construir seus programas, políticas e concepções de educação integral, outros muitos já possuem alguma experiência. Desde que foi lançado em 2007, o programa Mais Educação, do governo federal, impulsionou programas de educação integral em municípios e estados de todo o país. Em 2013, a iniciativa chegava a 4.836 municípios, dos cerca de 5.500 que o Brasil tem. E mesmo as experiências mais antigas seguem se reformulando e buscando se consolidar como política de Estado.
Para debater os desafios da educação integral em 2015, o Centro de Referências em Educação Integral conversou com especialistas e gestores públicos para saber quais os nós para que essa agenda avance no país.
Para aquelas escolas, municípios e estados que estão começando a se planejar, o principal elemento para a construção de um programa de educação integral é conhecer a comunidade, para detectar tanto suas necessidades quanto o que ela tem para oferecer. “Para começar é importante fazer um diagnóstico inicial da rede, perceber suas potências, ver o que já há e averiguar quais condições precisam ser criadas para a educação integral”, explica a especialista em Educação da Fundação Itaú Social, Tatiana Bello Djrdjrjan. “Há um terreno muito fértil de cultura e vocação locais para fazer a interface com a aprendizagem dos estudantes.”
Um programa de educação integral não pode vir de cima para baixo. Para a assessora de Relações Institucionais da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, Neuza Macedo, o principal desafio é a construção coletiva “por meio de reuniões e assembleias com as famílias, a comunidade, enfim, todas as pessoas e instituições que integram o território escolar”. A opinião é partilhada por Tatiana, “as experiências mais bem sucedidas e que conseguem se estruturar como uma política de estado são aquelas em que o projeto é mais coletivo”.
Como muitos municípios e estados começaram suas políticas de educação integral a partir do Mais Educação, as especialistas apontam que é necessário que eles se tornem mais autores das propostas . “O Mais Educação serviu e serve como um grande indutor de políticas públicas de educação integral, mas precisamos repensar um pouco a estrutura do programa para estruturar nos municípios e estados as capacidades técnicas e administrativas para que eles possam projetar suas próprias iniciativas”, defende Tatiana.
Já Neuza destaca que os gestores municipais e estaduais tomem para si a tarefa de estabelecer uma política de educação integral. “Ela deve ser construída a várias mãos, na perspectiva da intersetorialidade, sem nunca perder o foco, a centralidade do programa, que é o estudante.”
Ao trazer um novo paradigma às escolas, a educação integral demanda que se repense a atuação dos professores. Assim, é necessário realizar formações e capacitações constantes e também estruturar uma carreira que seja compatível com as demandas da educação integral.
Para Neuza, a jornada de dedicação exclusiva é um dos pontos centrais já que permite o acompanhamento próximo da trajetória escolar dos estudantes. “Esse tempo junto, de maneira mais informal, favorece a criação de um vínculo maior que pode contribuir com o desenvolvimento emocional e afetivo, que são também dimensões da formação humana”, argumenta.
Com a ampliação do tempo e diversificação das atividades, é comum que as escolas dividam a jornada entre os conteúdos tradicionais e as oficinas culturais e esportivas, separando os conhecimentos. “Há que se construir um currículo mais articulado, em que as experiências dialoguem e componham uma aprendizagem”, aponta Tatiana. “É preciso pensar currículo um que busque integrar os conteúdos do horário dito regular com outros próprios de cada território. O saber escolar não pode estar dissociado da vida dos estudantes”, complementa Neuza.
Precisamos melhorar a infraestrutura de muitas escolas. De 54 escolas, cerca de 15 precisam de melhorias no que diz respeito ao espaço físico – seja do ponto de vista de salas e até de construção de refeitórios.
Outro ponto é a formação para os coordenadores comunitários, que são os que coordenam a educação integral no território; temos um por escola. Queremos um processo maior de aprofundamento do ponto de vista pedagógico para estarem mais alinhados com a proposta da Secretaria.
Temos também que pensar um processo de formação mais didático para os monitores e oficineiros. Como estamos trazendo gente das comunidades para estas funções, muitas vezes é preciso uma formação do ponto de vista didático e também pedagógico.
Precisamos ampliar e aprofundar as relações com a comunidade, com as associações de moradores e também as culturais e com os comerciantes, ou seja, com as forças vivas do território. A educação integral é abrir as portas da escola, permitindo que ela se espraie pelo bairro e torne a cidade mais educadora. Para que isto não fique apenas no discurso, nós estamos planejando ampliar e aprofundar essas relações das escolas com as suas comunidades.
Queremos reformular o Programa Escola Aberta que acontece aos finais de semana. O modelo se esgotou e temos que melhorar, queremos fazer isso de uma maneira mais parceira com algumas entidades e promover atividades que tenham mais a ver com o que a comunidade quer.
Este ano vamos lançar um novo projeto chamado “Escola Coruja: inteligência comunitária”. Todas as escolas vão se transformando em espaços de ensino e aprendizagem por meio da pesquisa, nos quais a pedra de toque será a discussão, por meio de temas que sejam problemas da comunidade.
Alberto Carabajal, Secretário de Educação de Novo Hamburgo (RS). Conheça do programa de educação integral do município.
Nosso maior desafio na Educação Integral em 2015 é a questão estrutural em três vertentes:
Mudança no formato de contratação dos educadores: contratávamos por sistema de voluntariado com auxílio financeiro. Agora teremos parceria com OS e entidades conveniadas que realizarão a contratação dos educadores, porém, como os custos aumentam, tivemos que realizar a redução do quadro, garantindo segurança e qualidade.
Locação de espaços: perdemos dois espaços que eram cedidos ou locados por valor reduzido, pois, nossos alunos são atendidos em dois formatos – escola de período integral e núcleo. Os núcleos são locais cedidos ou alugados e precisam estar localizados próximo às escolas. Isto nem sempre é possível e dependemos também da locação de ônibus para o transporte das crianças.
Formação: temos uma equipe de formação da própria secretaria que realiza mensalmente a formação de educadores e coordenadores do Programa. Porém, para atender ao Ensino Regular que estava desfalcado de pessoas com este perfil de formador, tivemos que remanejar alguns formadores que não poderão fazer o acompanhamento semanal aos núcleos para verificação das atividades e propostas.
Débora Marreiro, integrante da Equipe de Orientação Pedagógica do Programa Escola Total-Jornada Ampliada de Santos (SP). Conheça o programa de educação integral da cidade.