publicado dia 30/11/2015
Especialistas defendem que escolas se autoavaliem
Reportagem: Ana Luiza Basílio
publicado dia 30/11/2015
Reportagem: Ana Luiza Basílio
Qual seria um método justo para avaliar as escolas brasileiras, colaborando para a qualificação da educação? Para os especialistas presentes no seminário “Avaliação Institucional e o Sistema Nacional de Avaliação Básica”, um dos caminhos é apostar na autoavaliação institucional, na qual a escola se torna uma das referências do processo avaliativo, na medida que reflete sua prática pedagógica.
Tal proposta corrobora com o artigo 11º do Plano Nacional de Educação (PNE), que trata da implementação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb), um dispositivo que deve atuar em duas frentes: a institucional (voltada para as escolas) e a de rendimento (voltada aos estudantes).
O que uma unidade da rede deve levar em consideração nessa reflexão sobre si mesma? A análise deve considerar, conforme descrito no texto do PNE, “o perfil do alunado e do corpo dos (as) profissionais da educação, as relações entre dimensão do corpo docente, do corpo técnico e do corpo discente, a infraestrutura das escolas, os recursos pedagógicos disponíveis e os processos da gestão, entre outras relevantes”.
Durante o seminário, realizado pela Ação Educativa no dia 25/11, foram discutidos o papel das avaliações como indutoras de um processo de qualificação da educação, essencialmente quando os fatores internos e externos são pensados de forma dialógica; além disso, chamou-se a atenção para a importância de se constituir a avaliação institucional de acordo com a realidade vivenciada por cada escola.
Segundo especialistas, a ausência de tradição da avaliação institucional na educação básica torna o seu momento de construção bastante oportuno. Para a integrante do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Rosilene Cerri, é fundamental ter clareza a respeito de qual concepção de avaliação se quer trabalhar. Segundo, é necessário ter coerência entre o desenho proposto, os marcos legais e as condições de operacionalização do processo e capacidade técnica para acompanhar e orientar as ações propostas.
Segundo Rosilene, é essencial definir se o objetivo é apenas criar um novo sistema, porém sem mudar a lógica atual de avaliação, ou se é criar um novo paradigma, no qual as avaliações externas não pautem unilateralmente os caminhos das instituições.
Durante a discussão, muito se falou da necessidade de considerar outros indicadores para avaliar a educação, a partir de uma visão mais integradora, capaz de considerar os processos internos e externos à escola e que impactam em seu desenvolvimento. Nesse sentido, também se condenou o fato do Índice do Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) ser tratado como sinônimo dessa equação.
Para a consultora da Fundação Carlos Chagas e professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Elba de Sá Barreto, o Ideb facilita a culpabilização das escolas. “Se a escola não tem professor ou infraestrutura adequada a culpa é só dela?”, questionou. “Essa ampliação da avaliação é importante porque desloca a responsabilidade do ‘ombro dos professores’ para o sistema. Quais políticas públicas integradas dariam conta disso?”, sentenciou a especialista.
Para o representante do Conselho Nacional de Educação, Antônio Carlos Caruso Ronca, a autoavaliação “é indispensável para que o trabalho coletivo da escola possa servir de reflexão a ela mesma. E também como forma de checar se o Estado está garantindo as condições e os mecanismos necessários”, considerou. Ronca ainda falou da necessidade dos processos avaliativos considerarem o direito à aprendizagem mas, sobretudo, o direito à educação, com vistas às populações mais vulneráveis socialmente, como negros, pessoas com deficiências, indígenas e outras.
Durante o debate também foram colocadas algumas preocupações relativas à configuração do Sinaeb. Um dos representantes da Diretoria e Avaliação da Educação Básica do Inep, Adolfo Samuel de Oliveira, chegou a apresentar parte dos indicadores que a instituição têm trabalhado no sentido de facilitar o diálogo entre a avaliação interna e externa, como Indicador Adequação Formação Docente, Indicador de Regularidade Docente, Indicador Complexidade Gestão, entre outros.
Ronca, no entanto, entende que ainda é preciso amadurecer esse debate. “A relação entre avaliação e política pública no Brasil é precária, frágil. Temo que consideremos diversos indicadores e a avaliação não dê conta de olhar para a realidade de cada escola. Aí tenderíamos à pausterização, com avaliações que consideram a média e, por isso, acabam por tendenciar à elevação dos índices”, observou.
No mesmo sentido, Elba teme que a educação se torne “apêndice do Sistema Nacional de Avaliação”. A especialista colocou que o ensino superior acaba por ter mais tradição do que a educação básica devido à implementação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Ainda assim, elencou algumas experiências com destaque na avaliação participativa: caso do Ceará que, na segunda metade dos anos 90, trabalhou com a avaliação da escola por todos os atores que a compunham; e também os municípios de Igrejinha (RS) e Campinas (SP); esta última contou com a assessoria da professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Mara de Sordi, também presente no Seminário.
Em sua fala, Mara destacou a importância da avaliação institucional ter um caráter democrático, com uma responsabilização participativa, a partir de uma interlocução entre os vários atores sociais envolvidos, por meio de diálogos plurais que permitam posições diversas.
A coordenadora de educação da Ação Educativa, Denise Carreira, também elencou condições para que o processo qualifique a escola e almeje a incidência em políticas públicas. “É preciso superar a comparação entre escolas, a cultura de avaliação autoritária, respeitar a adesão das unidades e conferir governabilidade a elas; também se faz necessário considerar articulação, gestão democrática, planejamento e contextualização, com foco no território e participação da família em uma perspectiva plural”.
A Ação Educativa vem trabalhando desde 2003 com a proposta de desenvolver um sistema de indicadores populares de qualidade da escola. Desde o lançamento, o projeto teve aplicação em cidades como Londrina (PR), Curitiba (PR), Ituiutaba (MG), Salvador (BA), Itaguaí (RJ), Cuiabá (MT), Bebedouro (SP), entre outras.
A professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Sandra Zákia Sousa reforçou a necessidade do debate ser situado no contexto do Sistema Nacional de Educação (SNE), garantindo um regime de colaboração como condicionante do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb). “Hoje, quase todas as unidades federadas têm sistemas de avaliação feitos por equipes externas. E se os resultados vêm apontando rendimento não satisfatório por parte dos alunos, continuar na mesma direção é mais do mesmo”, avalia.
A especialista defende uma proposta colaborativa entre os entes federados. Além do mais, esclarece Sandra, é preciso medir insumos e processos, e não só resultados. “Essa avaliação pressupõe expandir focos, considerar diversos fatores que incidem na qualidade da educação”, sintetizou.
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