publicado dia 15/08/2024

Como garantir o direito à Educação dos estudantes com deficiência com a ampliação da jornada escolar?

Reportagem:

Resumo: O atendimento médico pode ser necessário para alguns estudantes com deficiência e apoiar seu desenvolvimento integral. Contudo, há casos em que essa agenda acaba por impactar os compromissos escolares – em especial em escolas de tempo integral – e pode reduzir o tempo de convivência e oportunidades do estudante com deficiência na escola. Nesta reportagem, especialistas convidam educadores e familiares a refletirem sobre essa questão. 

Para alguns dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades que precisam de terapias, consultas e atendimento psicológico, a agenda médica pode impactar o tempo educativo, com casos de estudantes que chegam a faltar na escola várias vezes todas as semanas. 

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O atendimento médico pode ser essencial em vários cenários e apoiar a permanência e o desenvolvimento dos estudantes na escola e fora dela. Contudo, há casos em que essa agenda tem efeito inverso e pode até mesmo cercear o direito inegociável daquela pessoa à Educação. 

“As terapias e a Medicina são importantes, mas é preciso avaliar a intensidade e a forma delas para cada um. E são elas que têm que se adequar ao horário escolar, até porque temos visto essa sobreposição acontecer não só em escolas de tempo integral, mas até nas de 4 horas. Quando se abrem concessões, desconsidera-se que o acesso à escola comum é um direito inegociável”, aponta Nathália Meneghine, psicóloga, professora há 20 anos na rede municipal de Juiz de Fora (MG) e integrante do Instituto Cáue – Redes de Inclusão

“Temos visto cada vez mais protocolos de tratamento prontos para cada diagnóstico, independentemente do que cada um precisa na sua singularidade. Só é cuidado se for personalizado. Senão, é uma visão capacitista, em que a deficiência seria um problema a ser constantemente tratado, consertado”, aponta Nathália, que tem formação específica e atua no serviço do Atendimento Educacional Especializado (AEE). 

Bianca Soares Ramos, Coordenadora de Desenvolvimento Institucional do MAIS/Movimento Down e Gestora de projetos na Associação Cidade Escola Aprendiz, reforça: “As barreiras que precisam ser superadas não estão no sujeito, mas no ambiente, nas relações e nas atitudes”. 

As especialistas ouvidas pela reportagem convidam as famílias a considerarem se o atendimento terapêutico possibilita ao sujeito usufruir mais da vida ou se ele está sendo um fim em si mesmo, que retira a criança das oportunidades de aprendizagem, desenvolvimento e de fazer laços sociais no ambiente escolar.

“É preciso avaliar também se essas abordagens médicas podem estar se aproximando de uma tentativa de normalização dos sujeitos”, complementa Bianca.

Para ajudar a discernir melhor a questão, é fundamental ouvir as próprias crianças e adolescentes sobre como tem sido a agenda médica para elas. “Mesmo as crianças pequenas conseguem responder de forma consistente se aquilo faz sentido ou não para elas”, afirma Bianca.

Para os casos eventuais de ausência na escola, alguns cuidados seguem sendo necessários. Na Escola Municipal Polo de Educação Integrada (EMPOEINT), em Belo Horizonte (MG), a gestão pede às famílias um atestado médico para justificar a falta.

“Em Belo Horizonte essa é a forma de regulamentação das faltas de todos os estudantes. Assim, eles não ficam prejudicados em detrimento dos seus tratamentos, e sempre podem ir à escola antes ou depois da consulta, a não ser os casos que requerem o dia inteiro ausente”, explica Shirlei Lopes, gestora da unidade. 

Mas o trabalho não se encerra nesta etapa burocrática. A escola realiza um acompanhamento próximo a cada um para garantir seu desenvolvimento integral e evitar o distanciamento da escola e uma eventual evasão. 

A EMPOEINT também conta com o trabalho dos professores tutores, que são responsáveis por acompanhar de perto o desenvolvimento integral e as demandas escolares, e para além delas, de um pequeno grupo de estudantes.

“O tutor vai garantir que o estudante não perca o vínculo com os colegas e que participe das atividades. Além disso, tem o fato de que todos os estudantes têm seus próprios tempos e modos de aprender. Então este tutor vai poder articular tudo isso para garantir direitos e o desenvolvimento integral”, afirma Shirlei.

A Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte também possui, desde a pandemia, uma diretoria destinada a acompanhar as demandas intersetoriais de cada estudante, a fim de dialogar com a Saúde, Assistência Social e outras políticas sociais para garantir acesso, permanência e aprendizagem dos estudantes.

Esse tipo de acompanhamento, que parte de uma lógica de cuidado compartilhado e considera os sujeitos em sua integralidade, é um fundamento essencial tanto da Educação Integral, quanto da Educação Inclusiva.

“A Educação Inclusiva torna a escola melhor para todos, porque passamos a considerar que todas as pessoas têm múltiplas necessidades e múltiplos meios de fazer e de expressar o que pensam, sentem e conhecem, o que nos convida a potencializar as várias formas de ser e estar no mundo. Também a considerar o tempo e a forma que cada um tem de aprender e ensinar, independentemente de ser uma pessoa com deficiência ou não”, diz Deigles Amaro, especialista em gestão educacional no Instituto Rodrigo Mendes.

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