publicado dia 13/11/2015
10 anos de Escola Integrada: programa é avaliado durante audiência pública
Reportagem: Ana Luiza Basílio
publicado dia 13/11/2015
Reportagem: Ana Luiza Basílio
Diversas representações da sociedade civil puderam colocar as suas impressões sobre os dez primeiros anos do Programa Escola Integrada (PEI). A oportunidade se deu durante a audiência pública “10 anos da Escola Integrada: avaliação e desafios”, realizada na Câmara Municipal de Belo Horizonte, nos dias 11 e 12 de novembro, e organizada pelo vereador Arnaldo Godoy (PT), autor da Lei 8432/2002, que instituiu a jornada escolar de tempo integral no ensino fundamental da rede municipal de ensino.
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A partir dos diferentes lugares em que atuam, os participantes puderam contribuir com uma leitura do cenário, destacando os ganhos para a educação integral do município e também os desafios que acompanham a política e recaem sobre a atual gestão. Confira o posicionamento de diversas lideranças ao Centro de Referências em Educação Integral durante a audiência:
1. Universidade
A relação da Universidade com a educação básica, especificamente a partir do Programa Escola Integrada (PEI) significa aprendizagem para as duas partes. Eu gosto da ideia de formação híbrida, onde ao mesmo tempo que se tem a discussão, se tem a atuação e a troca.
A parceria que foi proposta no início do programa com as universidades possibilitou que os estudantes pudessem vivenciar experiências educativas ao longo de sua formação. Esta é uma forma da universidade se aproximar da educação básica, questão ainda vista com distanciamento no Brasil, e de possibilitar o refletir sobre o fazer”.
Lucinha Alvarez, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
2. Gestão escolar
Acredito que qualquer dificuldade na execução do Programa é inferior ao ganho que se tem com a promoção dos direitos de nossas crianças e adolescentes. Como gestora, vejo certa instabilidade – não só dessa iniciativa, mas também de outras, tão importantes quanto para a promoção da educação em tempo integral -, relacionadas a ideologias políticas e interesses partidários.
Precisamos priorizar a educação integral que lida com a concepção de direito, da educação para a cidadania, para a autonomia desses sujeitos em suas várias dimensões. Vejo que a Escola Integrada vem se afirmando principalmente em relação às diversas linguagens que o professor, mesmo com seu doutorado ou mestrado, não daria conta; por exemplo, a capoeira e outras manifestações culturais que acabamos por descobrir em nossos monitores da comunidade.
Nailda Conceição Ferreira Silva, vice-diretora da Escola Municipal União Comunitária, localizada no Barreiro de Cima.
3. Professor
Em 2012, entrei na Escola Municipal União Comunitária e, em 2013, assumi a Escola Integrada como docente, a convite da instituição. Vejo que o programa tem uma importância enorme por ser um retrato da sociedade. Quando esses meninos vêm para a escola o dia todo, todos os seus problemas sociais desaguam por aqui. Só que o que vejo é que a escola ainda acaba ficando sozinha para resolver essas questões, por isso a importância de ampliarmos o PEI, para que possamos qualificar esse atendimento. Isso também passa por investir nos professores, na nossa formação, que, muitas vezes, ainda esbarra em agendas administrativas e não formativas”.
Ianá Costa de Andrade, professora coordenadora do Escola Integrada na Escola Municipal União Comunitária
4. ONG
A nossa ideia não é competir com as escolas de maneira alguma, mas de compor a busca por uma educação pública de qualidade a partir de nossa trajetória. As ONGs têm uma rede de articulação que pode contribuir com as discussões acerca dos estudantes como sujeitos de direitos e vejo que o Programa contribui com essa corresponsabilização da sociedade pensar nas crianças, professores, educadores das ONGs, agentes culturais, famílias. Um grande desafio ainda é o encontro da educação formal e não formal, é preciso valorizar os monitores que estão dentro da escola como educadores”.
Luana Campos de Silva, coordenadora da unidade de Lagoa Santa da ONG Corpo Cidadão
5. Monitor
Eu procuro mostrar a essas crianças que, mesmo morando na favela, é possível fazer diferente. Só que, hoje, a forma como os agentes culturais são tratados preocupa; queremos reconhecimento pelo nosso conhecimento sobre a arte e a cultura. Digo isso porque eu já pensei em desistir, porque financeiramente é nada, mas sou movido pelo amor e paixão que tenho pelo trabalho com as crianças.”
Ramon Wesley Paixão Ferreira, monitor na Escola Municipal Ulisses Guimarães
6. Família
Continuidade e desafios
Desde a sua criação em 2006, ainda como projeto piloto, em sete escolas, o PEI não parou de crescer. Dados da Secretaria Municipal de Educação apontam 173 escolas participantes do programa e atendimento a 65 mil estudantes, o que equivale a aproximadamente 60% dos alunos do ensino fundamental. No entanto, especialistas presentes durante a audiência colocaram alguns desafios importantes ao programa, para qualificar a sua continuidade.
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O programa
Criado em 2006 como resposta à Lei 8432, o PEI ampliou a jornada escolar para nove horas diárias, prevendo a diversificação das oportunidades educativas a partir de oficinas ministradas no contraturno, pensadas com o apoio de agentes culturais da comunidade e bolsistas universitários. Nesse sentido, a iniciativa passou a ampliar os tempos e espaços educativos para além dos escolares.
Lucinha Alvarez avalia que a Escola Integrada viveu um “divisor de águas” com a passagem para a atual gestão municipal e que, com isso, precisa enfrentar alguns desafios colocados: “por exemplo, o lugar do agente cultural dentro do programa, sua valorização e condições de trabalho, a própria questão da arquitetura das escolas e pensar o bairro para receber esta educação integral“. Ela reforça a necessidade de fóruns constantes para criar reflexões e diálogo em torno dessas questões.
Embora julgue o programa benéfico à população infanto juvenil de Belo Horizonte, no que diz respeito à variedade das oportunidades educativas, o vereador Arnaldo Godoy também entende que a prioridade da nova gestão, mais focada em metas e números, fez com que a iniciativa perdesse parte de sua principal característica de base: a de ordem participativa.
A gerente de Educação Integral, Direitos Humanos e Cidadania, da Secretaria Municipal de Educação, Arminda Aparecida de Oliveira, por sua vez, coloca que a Escola Integrada passa por um momento de avaliação de 10 anos. Também enumera alguns feitos atuais ao programa, dentre os quais: a conclusão das diretrizes pedagógicas do PEI, a instituição sistemática do processo de formação de monitores e professores coordenadores e, por fim, a inserção do Programa no Plano de Melhoria de Aprendizagem da Secretaria.
Para o futuro, aponta principais desafios: “a necessidade de um maior envolvimento dos alunos de 3º ciclo no programa, e a qualificação dos espaços de apoio, para que os estudantes não fiquem o tempo todo dentro da escola”, finaliza.