Qual o papel do educador comunitário na perspectiva da Educação Integral?

Publicado dia 18/12/2013

Quando li a frase “A educação integral não é uma tecnologia social, é uma nova forma de viver a vida”, proferida por Jaqueline Moll, na palestra de abertura do IV Seminário Teias de Cidadania, no último 24 de setembro, pus-me a refletir, sob esta perspectiva, o que fazemos e pensamos sobre educação integral e educação comunitária.

Em 2005 participei do projeto com a Cidade Escola Aprendiz – “O centro de São Paulo pode ser uma sala de aula”, – que pode assim ser resumido: trabalhávamos com as educadoras comunitárias em algumas escolas de prefeitura, com objetivo de criar uma relação entre a escola e a comunidade. Participei de outros projetos com esta perspectiva e sempre esbarrávamos na mesma questão: desenvolver uma tecnologia, uma metodologia, um roteiro que derrubasse os muros da escola possibilitando assim que o aluno se conectasse com mundo no seu processo de aprendizagem.

A convite do Centro de Referências, o professor de Responsabilidade Social da Universidade Paulista (UNIP) e consultor em terceiro setor, educação comunitária e responsabilidade social, Zelito Sampaio, escreveu, a partir de suas experiências, sobre o papel do educador comunitário em ações, processos e escolas de Educação Integral. Em sua carreira, Sampaio gerenciou projetos de educação, sempre com a perspectiva de promover a integração entre escolas e suas respectivas comunidades, tomando o estudante e suas necessidades de aprendizagem e desenvolvimento como ponto central do processo educativo.

Mas, a questão principal da educação integral, não é a metodologia, e sim, como enxergamos a vida e a vivemos. Jaqueline Moll afirma ainda “Estamos falando de uma mudança de paradigma, de uma nova forma de pensar nossas relações sociais, pressupondo horizontalidade nos processos educativos, valorização dos saberes comunitários no currículo e uma efetiva ação intersetorial para garantir os direitos sociais dos indivíduos”.

Desta forma, estamos precisando de uma “pedagogia”, uma forma de pensar, de valores, como a Pedagogia Freinet, Pedagogia Paulo Freire e muitos outros como Rubem Alves, José Pacheco, Tião Rocha, que pensam a educação como um processo de aprendizagem interligado, orgânico, com bases em interesses, motivação com a possibilidade do erro, conceitos estes que são destruídos quando transformados em “metodologia”.

O grande problema é a necessidade do estado em burocratizar a “pedagogia”, para poder “Tayloristicamente” avaliar a eficiência do método, em relação ao volume de conhecimento e a eficiência dos agentes.

O educador comunitário e o desenvolvimento de comitês locais

correnteE, assim, volto a refletir sobre a figura do educador comunitário que, nas experiências que tivemos, foi fundamental no desenvolvimento de ações de Educação Integral. O seu papel dentro da rede de relações sociais comunitárias é de facilitador, animador, catalisador, aquele que une os pontos da rede, que faz a ligação com a comunidade, com as ONGs, com as empresas e com todos os atores sociais, aqui entendidos como parceiros na intenção de educar, alcançando oportunidades educativas na comunidade, derrubando e atravessando os muros da escola tradicional.

Para que isso funcione será necessário que todos da rede estejam dispostos, motivados em um paradigma horizontal, com o diretores capazes de estimular a comunidade escolar e professores que concretizarão estas possibilidades de aprendizagem nos planos de aula e em ações coletivas e interdisciplinares. O importante é fazer. Mas, novamente, para que isso aconteça, será necessário criar condições para transformar a visão de como a comunidade, a família e a escola veem a educação e a vida.

Podemos começar este processo criando um Comitê de Articulação Comunitária, um comitê local, com objetivos educativos, contribuindo para a autonomia e fortalecimento das unidades escolares, integrando as discussões curriculares com os diversos colegiados que já existem na escola e com os segmentos da comunidade.

Atribuições

pessoasNessa perspectiva, as atribuições do educador comunitário nas escolas pressupõem sua função de estimular a criação e a animação de um comitê local, como um espaço de articulação da comunidade. Um coletivo que atue de forma orgânica e democrática em áreas geográficas definidas com objetivo de desenvolver as oportunidades educativas da comunidade, a partir de uma rede local, envolvendo a escola, o governo, a iniciativa privada, a sociedade civil organizada e as organizações e indivíduos da comunidade.

Uma estrutura em rede significa que seus integrantes estão conectados horizontalmente a todos os demais, diretamente ou por meio dos que os cercam, formando uma “teia” de múltiplos fios. É o conjunto resultante, que se espalha para todos os lados, sem que nenhum dos seus elos seja considerado representante dos demais ou o mais importante. Trabalhar em rede pressupõe que não existe um “chefe”, mas um grupo de pessoas ou de organizações que estão trabalhando com os mesmos valores e com uma vontade coletiva de realizar determinado objetivo.

Na construção desses comitês locais o que unirá as pessoas à rede não é apenas uma orientação comum em relação a determinados objetivos, mas sim a existência de um conjunto de valores que se estabelecem como comuns.

Neste processo, o educador comunitário deverá fomentar as relações nos comitês, criando condições para que cada unidade dessa composição local – grupos, escolas, ONGs, empresas, pais, alunos e professores -, se articule às demais e desenvolva adequadamente parcerias com objetivos educativos e valores comuns, na intenção de atender as motivações e necessidades de aprendizagem dos estudantes.

Trabalho colaborativo

conexoes_2Partindo das parcerias espontâneas e das conexões pontuais que possam existir no território, o educador comunitário poderá iniciar o processo pedagógico de construção de rede. É trabalhando os valores e objetivos da comunidade, cuja vocação, personalidade e “DNA” deverão ser respeitados e incorporados em suas ações e relações, que o educador possibilitará que surjam ações transformadoras.

Outra função do educador comunitário neste processo é a de zelar pelo funcionamento democrático, participativo e horizontal dos comitês comunitários, garantindo que estes sejam um espaço aberto e sem dono, garantindo que seus membros sejam autônomos, mas, conscientes de que “fazem parte” da rede, de uma estrutura coletiva.

O educador comunitário é um facilitador, que tem como função mapear as oportunidades educativas da comunidade, buscar novos elos externos ao limite geográfico, delinear as competências, afinidades e a história comum entre os participantes do comitê e da comunidade, animar as relações, propor a divisão de tarefas (evitando sobrecarga e personalização), comunicar as ações realizadas, conectar grupos, enviar boletins, criar um ambiente amigável para que as informações circulem e sejam compartilhadas e organizar encontros presenciais.

Por outro lado, o educador comunitário não terá modelos ou regras para seguir, mas a função de criar, de forma coletiva e democrática, conexões que façam sentido para os envolvidos e desenvolver o processo de decisão por consenso e de auto-organização.

Na escola e da escola para a comunidade

Além de zelar pelo funcionamento do comitê, o educador comunitário deverá trabalhar em duas frentes: junto ao professor, como facilitador, contribuindo com os aspectos operacionais e no planejamento pedagógico, disponibilizando informações sobre oportunidades educativas fora da sala de aula e respondendo às motivações dos alunos. Como articulador, ele deverá apoiar, incrementar e relacionar as ideias do professor e dos alunos com as do comitê local, com atenção especial às necessidades de desenvolvimento integral dos estudantes.

registroOutra frente de ação do educador comunitário será a de integrar a escola ao comitê local, atuando no plano de trabalho da escola, a partir das conexões desenvolvidas no comitê, constituindo uma rede de relações na comunidade e articulando as ações que estão sendo desenvolvidas pelos participantes dos comitês e com outras escolas da região. Ele deverá buscar oportunidades educativas, descobrindo o que está acontecendo no entorno da escola, o que outras secretarias, organizações, indivíduos, igrejas e empresas estão desenvolvendo, planejando e integrando-as na escola como opção de motivação dos estudantes.

Para que esta rede de pessoas, entidades, espaços públicos, empresas, pais, professores e alunos se unam a uma vontade coletiva, a atuação do educador comunitário no comitê local é determinante. Deve estar voltada para a facilitação das relações entre as partes para atingir um objetivo comum, garantindo a conexão dos elos da rede para melhorar a qualidade dos saberes e a formação humana. Portanto, o educador deverá conhecer cada um desses participantes, seus objetivos e valores individuais e assim, buscar formas de uni-los para um mesmo fim.

Por fim, o educador deve saber que o formato que a rede assumirá é imprevisível e existem inúmeras possibilidades de relação entre esses elos. Fundamentalmente, elas deverão refletir as motivações individuais e coletivas dos participantes, em diálogo com a motivação e necessidades dos alunos. O educador deve compreender então que sua função mais importante é a de é criar um cenário horizontal para o “fazer acontecer” de forma democrática e participativa, uma nova forma de viver a educação, trazendo o estudante para o centro, como protagonista dos processos de ensino e aprendizagem e a comunidade como uma poderosa aliada da escola nesse percurso.

Escola

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