Tutoria: um dos eixos centrais da Educação Integral em Contagem (MG)
Publicado dia 29/06/2023
Publicado dia 29/06/2023
Quando os estudantes chegam retraídos e com baixa autoestima às escolas de Contagem (MG), costuma ser por meio da tutoria que eles se transformam. Presente em quase todas as escolas da rede, a proposta é acompanhar de perto cada um dos estudantes, desde como vão as aprendizagens até a vida para além dos muros da escola. A tutoria tornou-se, assim, uma das principais ferramentas de implementação e manutenção da Educação Integral no município.
Leia + Educação Integral, escola e o universo de saberes das comunidades
“A tutoria reconhece o valor de cada um, os saberes que já trazem consigo, e está atenta para possíveis violações de direitos. A partir dela, encaminhamos casos para a rede de proteção intersetorial e descobrimos meninos e meninas extremamente habilidosos na oralidade, no desenho. Essa valorização acabou contribuindo para que eles estabelecessem outro tipo de relação com os colegas, professores e a aprendizagem”, celebra Anderson Cunha, Subsecretário de Educação de Contagem (MG).
Na rede, o trabalho a partir da concepção de Educação Integral e em jornada expandida ganhou força entre 2005 e 2012, sobretudo por meio do Mais Educação e de programas do próprio município. Juntos, alcançaram cerca de 10 mil estudantes.
Após esse período, houve uma descontinuidade das políticas públicas federais e municipais, que só puderam ser retomadas em 2021, quando apenas 1200 estudantes eram contemplados pelo tempo integral.
Essa retomada por parte do município se deu por meio do Programa de Educação Integral e Integrada, que apelidaram de Escola Viva, e foi instituída em lei em 2010.
A meta em 2023 é atender 6 mil estudantes em tempo integral e, em 2024, 12 mil. Com isso, cumpririam a meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de atender ao menos 25% dos estudantes do Ensino Fundamental em tempo integral.
“Apesar de todos os nossos esforços, precisamos de uma política federal indutora de Educação Integral para fazer essa expansão, a exemplo do que foi o Mais Educação”, diz Anderson.
A rede, que conta aproximadamente 60 mil estudantes e 6 mil servidores, possui 70 escolas municipais de Ensino Fundamental, 43 centros municipais de Educação Infantil, 23 creches conveniadas e 10 instituições municipais de Ensino Médio.
Para concretizar a Educação Integral no município, contrataram agentes culturais, que são oficineiros de atividades como circo, capoeira, artesanato e robótica, professores tutores, que são licenciados ou pedagogos para fazer o acompanhamento pedagógico, e os coordenadores de atividades educativas, que organizam as atividades ao longo das jornadas ampliadas.
Todos eles recebem formação continuada da Secretaria de Educação e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com quem têm uma parceria.
Das 70 escolas de Ensino Fundamental, 63 possuem tutores que realizam atividades com as turmas duas vezes por semana. Destas 63, 24 são de tempo integral com as oficinas e o apoio de coordenadores de atividades educativas.
A tutoria do ponto de vista das educadoras e educadores
As tutorias têm início na pandemia como forma de auxiliar a aprendizagem dos estudantes. “Seu papel não é fazer um reforço ou só pensar no déficit de aprendizagem. O tutor considera as possibilidades de personalização do ensino, as potências e tudo mais que o sujeito traz em sua integralidade. Ele é aquele que acompanha, orienta e escuta com proximidade afetiva”, define Anderson.
Cada professor acompanha 30 estudantes, que são divididos em dois grupos e se reúnem duas vezes por semana. Em um primeiro momento, os educadores se mostraram receosos com a proposta, afinal, eles próprios foram formados em outra lógica. Aos poucos, com formação continuada, a proximidade com um pequeno grupo de estudantes trouxe transformações de relação humana e pedagógica.
“Hoje eles falam de como a tutoria mudou, inclusive, o sujeito educador que eles são, que eles levam também para as aulas regulares. Com isso, eles vão se tornando militantes de uma nova forma de educar, porque isso não vai acontecer por decreto ou portaria. Tem que partir dos desejos das pessoas que estão na escola e das trocas entre os pares. Nosso papel de gestão é provocar esse desejo e dar condições para que eles trabalhem”, relata Anderson.
A importância da tutoria para as famílias
Durante a pandemia, as famílias ficaram muito preocupadas com o desenvolvimento de suas crianças e adolescentes, e evidenciaram a importância que a escola têm para elas. Na volta presencial, as tutorias foram um alento para essas ansiedades.
“Vemos a satisfação das famílias de ter de volta um programa de Educação Integral que acolhe com qualidade seus filhos em um tempo maior na escola. Que não se trata de reforço, que eu brinco que é força duas vezes, mas é de aprendizagens significativas, de encontro, respeito, convivência e formação humana integral”, observa Anderson.
Desafios e outras mobilizações para fazer a educação integral acontecer
Na rede, há apenas uma unidade em que o currículo é integrado e os professores têm dedicação exclusiva durante todo o período. O desafio, agora, é expandir essa conquista para as demais unidades, superando a fragmentação entre os turnos e do currículo.
“Nosso esforço é fazer com que os saberes culturais e comunitários se conectem aos acadêmicos e científicos, em outros tempos e espaços. Um primeiro avanço veio em 2021, com as Trilhas do Saber, um documento da época do ensino remoto que apostava em trabalho integrado entre os componentes curriculares”, diz o Subsecretário do rede que também vem investindo em tecnologias digitais, conectividade nas escolas e formação de professores para apoiar esse trabalho.
Na adesão à política de educação integral, cada escola discutiu suas possibilidades e fez a adesão parcial ou integral à proposta. “Não quisemos fazer um processo de cima para baixo”, afirma Anderson.
Para monitorar e avaliar a política, contam com as reuniões periódicas com as escolas e com o acompanhamento realizado pela assessoria pedagógica da rede. “Também vamos construir instrumentos de avaliação mais qualitativos para medir os impactos do programa. Não pensamos em processos de avaliação sistêmicos e externos somente”, diz o gestor.
A formação para os educadores(as) do Ensino Fundamental é realizada pelo Grupo TEIA (Territórios, Educação Integral e Cidadania) da UFMG. Como resultado, vão produzir uma cartografia participativa dos territórios, com as manifestações culturais, espaços e todo o potencial educativo do entorno das escolas.
“Ofertar uma formação em serviço é uma forma de valorização dos professores. Eles têm a oportunidade de uma formação continuada de qualidade e junto à universidade pública, que traz os debates mais contemporâneos da educação e uma relação efetiva com a prática docente”, pontua Anderson.
*Crédito pelas fotos: Secretaria Municipal de Educação de Contagem (MG)
Gestão Pública