Projeto apresenta a cultura africana para crianças por meio de brincadeiras

Publicado dia 23/11/2015

“O projeto nasce a partir do momento em que começo a me dar conta de que os alunos mantinham brincadeiras preconceituosas entre eles”. A observação da professora Maria Fernanda Luiz está na origem do projeto “Brincando conhecemos a África”, que nasceu em 2012, época em que ela lecionava para o 3° ano do ensino fundamental na Escola Estadual Narciso da Silva Cesar, em Araraquara, interior paulista. O intuito é apresentar a cultura africana para os estudantes.

O desejo de intervenção veio em prol da formação cidadã dos estudantes e também como forma de fazer um contraponto às posturas racistas consolidadas na sociedade e, por vezes, reproduzidas pelos alunos. A docente conta que, inicialmente, procurou observá-los durante os intervalos, aulas de Educação Física e Artes, para buscar estratégias de como abordar o tema.

Foi então que entendeu que um dos caminhos possíveis era por meio de uma linguagem universal entre as crianças: as brincadeiras. Maria Fernanda queria construir um repertório de atividades lúdicas africanas com os estudantes, para que tivessem a oportunidade de conhecer mais sobre aquela cultura e valorizar suas diversas representações.

Conhecendo a cultura africana

Para iniciar o trabalho, a professora – também integrante do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal de São Carlos (Neab), fez contato com alguns estudantes africanos para pedir apoio. A ideia era convidá-los para ir à escola vivenciar o momento das brincadeiras com as crianças, ação que ainda seria acompanhada de outras atividades.

O projeto considerou os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (Palop): Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Guiné Bissau e Moçambique. Para começar a inserir as crianças nas respectivas culturas, a docente previu algumas etapas. De início, ofertou rodas de conversa com apoio de textos informativos, imagens e vídeos de cada país.

Depois, já contando com o apoio dos estudantes do Neab, as crianças formularam coletivamente um roteiro de entrevistas com cada um deles. Algumas foram feitas pessoalmente, com a ida das crianças à casa dos entrevistados, acompanhadas pela professora, outras por telefone ou Skype.

“Elas tinham um olhar bastante pejorativo da África. Então, traziam inicialmente questões como: ‘você tem família? Como é a sua casa?’ Depois, essa curiosidade foi se diluindo”, conta. “Eu só pedia a eles que a última pergunta fosse sobre as brincadeiras africanas pra que já pudessem entrar em contato com a temática”, explica Maria Fernanda.

Hora de experimentar

As propostas de brincadeiras chegaram com o apoio dos estudantes do Neab. Alguns deles iam até a escola e, para isso, Maria Fernanda contou com o apoio dos professores de Educação Física e Artes para colocá-las em prática. Algumas das brincadeiras experimentadas pela turma foram: “Nome-nome”, da Guiné Bissau, “Labirinto”, de Moçambique e “Garrafinhas”, de Angola. Quando esse contato presencial não era possível, a professora se encarregava de aprender as atividades e repassá-las aos alunos.

Crianças conhecem sobre o repertório de brincadeiras africanas.

Crianças conhecem sobre o repertório de brincadeiras africanas. Crédito: divulgação

Para possibilitar a multiplicação do projeto aos demais estudantes da escola, que atende os anos iniciais do ensino fundamental em período integral, a docente também pensou na produção de um livro contendo as brincadeiras vivenciadas, com suas regras e materiais necessários.

Uma leitura sobre o projeto

O “Brincando conhecemos a África” aconteceu por dois anos na instituição, de 2012 a 2013, e chegou a atingir média de 33 alunos. Maria Fernanda conta que na época um dos indicadores de que a escola tinha mudado o olhar para as questões raciais foi o fato de ser incluída no currículo uma disciplina para tratar das relações étnico raciais.

Reconhecimento
O projeto foi vencedor do 7º Prêmio Educar para a Igualdade Racial e de Gênero, promovido pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT), na modalidade Processo Universal, categoria professor.

Para além disso, a docente – que hoje toca um projeto de música com o mesmo recorte em outra escola da rede estadual – pôde perceber duas grandes mudanças a partir da proposta. “Primeiro, para a criança branca, no sentido de reconhecer e valorizar a cultura do outro. Já para a criança negra, um apoio em sua construção identitária”, avalia.

Isso fica ainda mais evidente em uma de suas memórias: “Me lembro do caso de um aluno negro que ficava bravo ao ser associado aos personagens afrodescendentes que íamos conhecendo; as demais crianças diziam que ele tinha o mesmo tom de pele e ele se irritava. Já ao término do projeto, falávamos sobre a história de Zumbi dos Palmares e pensávamos em fazer uma peça teatral para apresentar aos pais. Foi então que ele veio e me pediu para representá-lo. Nesse momento, entendi que o projeto tinha alcançado seu objetivo: contribuir com a questão identitária”, finaliza Maria Fernanda.

Escola Estadual Narciso da Silva Cesar
Fone: (16) 3336-8398
Email [email protected]

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