Em parceria com escola de São Paulo (SP), Pé na Escola realiza metodologia para empoderar jovens

Publicado dia 24/11/2014

Começar desde cedo a trabalhar valores democráticos é certamente a forma mais adequada para criar uma cultura de direitos humanos: valores e experiências aprendidos quando se é criança permitem que durante toda a vida eles sejam base e guia da atuação das pessoas em sociedade. Nesse cenário, a escola possui um papel fundamental para a consolidação da democracia, referendando a educação como um direito e a própria instituição como um lócus de formação cidadã, de ensino e valorização da diversidade e da participação democrática, para equidade e justiça social.

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E foi justamente a partir dessa percepção que surgiu o Pé na Escola, um projeto educacional que tem a proposta de conectar Direito e Educação, duas áreas aparentemente distantes, mas que quando unidas potencializam a transformação da realidade.

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Formada por quatro jovens que se graduaram em Direito, e que sempre enxergaram a educação como o melhor caminho para que as pessoas realmente se apropriassem de seus direitos básicos, a iniciativa tem o objetivo de fazer com que cada vez mais pessoas saibam se posicionar e participar das decisões públicas com consciência, entendendo o funcionamento o Estado e conhecendo a rede de direitos que protege a todos.

Para tanto, o Pé na Escola tem como uma de suas atividades, a realização de oficinas de “Educação em Direitos”, em escolas públicas e privadas e em qualquer instituição ou espaço educativos abertos ao tema.

Experiência na EMEF Amorim Lima

Estuantes aprendem enquanto discutem. Foto: Pé na Escola

Estuantes aprendem enquanto discutem. Foto: Pé na Escola

Logo no início de atuação do Pé na Escola, a proposta de oficinas foi apresentada à Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, em São Paulo, que recebeu de julho a outubro de 2014, uma experiência piloto com os estudantes do ensino fundamental II.

A iniciativa, segundo os organizadores, casou diretamente com um desejo da escola, que sempre teve preocupação em trabalhar com seus alunos questões relacionadas à cidadania, mas que até então nunca tinha conseguido desempenhar um trabalho que realmente aprofundasse noções básicas de Direito, fundamentais para a formação integral de todas as pessoas.

No caso da Escola Amorim Lima, buscando diálogo com o currículo e proposta pedagógica da instituição, foi sugerido que as oficinas abordassem os conteúdos de Direito a partir do de discussões sobre os povos originários do Brasil, tema da Festa da Cultura da escola em 2014.

Assim, em oficinas dinâmicas e participativas, foram discutidas questões relacionadas à afirmação e proteção dos direitos dos povos originários, apresentando os fundamentos dos Direitos Humanos, a origem histórica da discussão e sua importância para assegurar direitos mínimos, em relação direta com a democracia e com as instituições do Estado.

Metodologia

Para apresentar o tema aos estudantes do ensino fundamental, a equipe do Pé na Escola buscou problematizar com as turmas o que cada um entendia pela expressão, apoiando-os com imagens dos povos originários brasileiros que facilmente identificavam temas dos direitos humanos, como liberdade de expressão, direito de manifestação, direito à moradia, liberdade cultural, entre outros.

Com a atividade, os educadores buscaram tanto apresentar a discussão histórica dos Direitos Humanos como valores elementares que se tornaram lei universal em 1948, por meio da Declaração Universal dos Direitos Humanos, quanto estimular que os alunos, a partir da discussão das imagens, problematizassem que esses temas fazem parte do cotidiano de toda a sociedade e, infelizmente, continuam sendo sistematicamente violadas.

Paralelamente, com a intenção de aproximar as crianças das instâncias políticas brasileiras, foram realizadas diversas simulações baseadas no funcionamento dos três poderes que constituem os pilares do Estado brasileiro: Executivo, Legislativo e Judiciário, sempre relacionando suas funções às questões ligadas aos povos originários do Brasil, tema central da discussão na escola.

“A vivência dos pilares do Estado se mostrou extremamente rica junto aos alunos porque ao mesmo tempo que vivemos em um regime democrático, há uma grande aversão da sociedade em relação à política, que é reduzida à política partidária, quando, na verdade, a política é muito mais ampla. E a escola um espaço privilegiado para mudança dessa concepção.” Equipe Pé na Escola

Na oficina que teve como tema o Poder Judiciário, os alunos se dividiram em dois grupos: enquanto um grupo advogava em favor da liberdade de expressão e da preservação da cultura indígena, o outro defendia a imposição de limites ao direito de manifestação. De forma prática, os estudantes foram convidados a compreender melhor a função do Judiciário, e sua difícil missão de observar o estrito cumprimento da legislação e a importância da contraposição de ideias de maneira respeitosa.

Para discutir o papel do poder executivo, o Pé na Escola propôs a simulação de uma audiência pública sobre a construção de uma usina hidrelétrica, os alunos foram divididos em três grupos com interesses distintos: aqueles que defendiam a construção da usina em virtude da alta demanda energética do país, outros que queriam preservar os direitos das populações afetadas pela construção e terceiro que acreditavam existir outras alternativas àquela empreitada. Novamente de forma prática e privilegiando o aprender fazendo, os estudantes foram convidados a ver o papel da Presidência da República e como, em decisões governamentais, é preciso equacionar diferentes demandas e interesses.

Já para imersão no Poder Legislativo, foi proposto aos alunos que debatessem sobre um projeto de lei que está em discussão no Congresso Nacional, de modo a permitir que eles pudessem entender melhor como uma lei é criada e a importância dos Direitos Humanos como uma rede de proteção contramajoritária [a garantia da preservação de princípios fundamentais, mesmo quando não são da decisão da maioria]. No caso, o projeto escolhido para debate foi a PEC 215, que propõe a alteração nos procedimentos de demarcação das terras indígenas. A partir do debate da PEC foi possível trabalhar o que é e qual é o papel da Constituição, como se organizam os representantes no legislativo e o que está em jogo ao se propor uma mudança no rol de direitos que ela garante aos povos indígenas.

Diálogo e diversidade

Como parte fundamental da metodologia, o Pé na Escola busca que os estudantes percebam que o diálogo entre os diferentes é inerente à democracia e, portanto, fundamental em todas as esferas de poder no país.

Assim, simultaneamente ao desenvolvimento de conteúdos relacionados à Educação em Direitos, ocorreram práticas que destacaram a importância da diversidade cultural, do diálogo respeitoso, da relação saudável das pessoas com seu ambiente, da participação política. Valores, que segundo a equipe do Pé na Escola, são tão sensíveis quanto necessários para o aperfeiçoamento da democracia.

Ao final do ciclo de oficinas foi realizado um encontro de síntese, em que os alunos produziram um mapa das instituições políticas sobre as quais aprenderam. Os trabalhos e as discussões foram expostos na Festa da Cultura da escola, em uma sala de direitos humanos, onde os alunos se reconheceram nos temas e conceitos expostos.

A Escola Amorim Lima

A Amorim Lima é uma escola pública cuja proposta pedagógica é profundamente marcada pela autonomia dos estudantes e pela intensa participação da comunidade. Para os organizadores do Pé na Escola, essa vivência democrática dentro do ambiente escolar sem dúvida contribui para que os Direitos Humanos sejam assimilados com maior facilidade pelos alunos, que já se encontram habituados com o debate de ideias e respeito pelas posições contrárias. “Isso porque é vivendo os valores e a democracia que se pode perceber a sua real importância e a sua potência enquanto forma de convivência social”, justificam.

Para tanto, o Pé na Escola entende que a metodologia de trabalho tem que ser construída em diálogo com as demandas e características de cada comunidade escolar. Para os organizadores, cada escola possui uma realidade própria e pode encontrar caminhos diversos para aprimorar a cidadania em seu cotidiano: não existe uma única saída aplicável a todas as realidades, pois as especificidades locais e os pensamentos das pessoas que compõem a comunidade escolar são importantes ferramentas para delinear, democraticamente, as melhores soluções.

 

Por meio das simulações do funcionamento das instituições do Estado, os alunos puderam se colocar no lugar dos gestores, compreendendo o papel da democracia e da garantia de direitos na tomada de decisões, seja por um juiz, pela Presidência da República ou pelo Congresso Nacional.

Para os organizadores, os estudantes, ao defenderem seus pontos de vista, puderam assimilar conceitos fundamentais de direitos humanos, que permearam todos os debates. Exemplo disso foi a manifestação de uma aluna em simulação sobre o Poder Legislativo, quando convidada a debater sobre a possibilidade de a maioria, pelo voto, retirar de uma população o direito de expressar de algum modo sua cultura: “Não. Expressão cultural é um direito humano, portanto a maioria não decide sobre ele; ele existe e pronto”, afirmou, em conclusão, que segundo a equipe do Pé na Escola, expressou o puro pensamento jurídico. “A simplicidade e a beleza dessa afirmação nos mostra o quanto a Educação em Direitos propicia que os Direitos Humanos sejam vistos com a naturalidade que lhes deve ser própria”, afirmaram os organizadores.

“Multiplicar essas reflexões pelos espaços educativos Brasil afora é o objetivo e a motivação do Pé na Escola, para que crianças e jovens se sintam empoderados para realizar a mudança que querem ver no mundo, valorizando a democracia e suas instituições e convencidos de que os Direitos Humanos “são as garantias mínimas que precisamos para viver e ser feliz”, como dito por um aluno ao final das oficinas”, afirma a equipe da iniciativa.

Além da atuação direta com os jovens, o Pé na Escola apoia escolas e instituições de ensino para autonomia escolar, buscando ferramentas legais, em diálogo com o Poder Público, que salvaguardem o direito das escolas de serem diversas entre si. E, com o objetivo de ampliar as discussões em Educação e Direitos, a equipe publica conteúdos livres em canais de comunicação virtuais: na seção Serendipidade do site e na página no facebook.

 

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