publicado dia 16/02/2023
UNICEF aponta prioridades para tirar 32 milhões de crianças da pobreza
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 16/02/2023
Reportagem: Ingrid Matuoka
Nesta terça-feira, 14 de fevereiro, o UNICEF publicou a pesquisa “As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil“. Os dados revelam que ao menos 32 milhões de crianças e adolescentes brasileiros (63% do total) vivem na pobreza, em suas múltiplas dimensões.
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Isso significa que, na maioria das vezes, as privações de renda, educação, moradia, água, alimentação, saneamento e informação, bem como a exposição ao trabalho infantil, se sobrepõem.
O estudo, realizado com apoio da Fundação Vale, utiliza dados da Pnad Contínua e de uma análise específica sobre a renda para a alimentação. O último ano para o qual há informações disponíveis para todos os indicadores é 2019, antes da pandemia. Para os anos seguintes, só há dados de educação e renda, incluindo renda para alimentação – e todos pioraram.
“Se uma criança não tem renda suficiente, não tem uma moradia adequada, acesso a água, é muito difícil que ela tenha um desenvolvimento adequado”, aponta Liliana Chopitea, chefe de Políticas Sociais, Monitoramento e Avaliação do UNICEF no Brasil.
A privação de direitos dessas crianças e adolescentes reflete, também, o contexto que suas famílias vivem. “É um efeito devastador para o país como um todo, a médio e longo prazo”, avalia Liliana.
A pobreza multidimensional impactou principalmente quem já vivia em situação mais vulnerável, agravando as desigualdades no País. Entre crianças e adolescentes negros e indígenas, 72,5% estavam na pobreza multidimensional em 2019, versus 49,2% de brancos e amarelos. Entre os estados, seis tinham mais de 90% de crianças e adolescentes em pobreza multidimensional, todos no Norte e Nordeste.
Entre as principais privações que impactam a infância e a adolescência estão a falta de acesso a saneamento básico (alcançando 21,2 milhões de meninas e meninos), seguida pela privação de renda (20,6 milhões) e de acesso à informação (6,2 milhões). A elas se somam a falta de moradia adequada (4,6 milhões), privação de educação (4,3 milhões), falta de acesso a água (3,4 milhões) e trabalho infantil (2,1 milhões).
Na Educação em 2019, mais de 4 milhões de crianças e adolescentes apresentavam alguma privação no direito à educação no Brasil. Eles frequentavam a escola com atraso escolar ou sem estar alfabetizados, ou estavam fora da escola. Com a pandemia, houve piora em diferentes indicadores, em especial a alfabetização.
Em 2022, o percentual de crianças privadas do direito à alfabetização dobrou em relação a 2020, passando de 1,9% para 3,8%. A privação de alfabetização impacta diretamente a aprendizagem e a trajetória escolar dos(as) estudantes, afetando principalmente crianças e adolescentes negros e indígenas, das regiões Norte e Nordeste e meninos.
Já em relação ao trabalho infantil, em 2019 mais de 2 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil no Brasil. Entre 2017 e 2019, não houve melhorias significativas nessa área.
Confira os dados completos, por Estado, aqui.
Para enfrentar as múltiplas dimensões da pobreza no Brasil, é fundamental que haja um trabalho intersetorial entre os agentes públicos para atender crianças, adolescentes e suas famílias de maneira integral.
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” – Artigo 227 da Constituição Federal.
“Por parte das escolas, é ir atrás de todos os estudantes que não voltaram, trabalhar para melhorar a qualidade da educação e a formação integral, e cuidar da alimentação dessas crianças, que foi muito prejudicada pela pandemia”, indica a oficial do UNICEF.
Retomando o Artigo 227 da Constituição Federal, que determina absoluta prioridade aos direitos de crianças e adolescentes, Liliana argumenta que esta é uma das maiores urgências do país hoje.
“As políticas públicas precisam ser desenhadas olhando onde estão os vazios e esse estudo mostra justamente uma fotografia de onde estão os desafios. Agora, os gestores públicos precisam priorizar essas políticas públicas e alocar o orçamento necessário para tanto”, explica Liliana, complementando que trata-se de “um investimento nessas vidas que precisa ser feito com urgência”.