Qual o papel da equipe gestora nas escolas?
Publicado dia 23/09/2013
A escola é sem dúvida construída por sua comunidade – e é o gestor escolar ou a equipe diretiva da unidade que dá a tônica para as relações que se estabelecem no espaço. Fundamentalmente é o gestor que convida a comunidade escolar a participar de um projeto coletivo; é ele que mobiliza as pessoas e as articula a construir colaborativamente as normativas, a função social e os processos da escola. E é a condução dessa gestão, quando amparada por instrumentos democráticos, que possibilita que todos sejam corresponsabilizados e trabalhem juntos na construção de uma educação de qualidade.
Nessa perspectiva, mais de 50 especialistas (organizações e indivíduos) em Educação Integral* indicam as seguintes recomendações aos gestores escolares:
Papel de gestores e coordenadores pedagógicos
Uma escola só consegue implementar a educação integral de forma adequada quando a proposta tem o total comprometimento da equipe gestora. Diretores e coordenadores pedagógicos devem assumir a responsabilidade de orientar e liderar os processos de gestão, mobilização e articulação necessários à plena realização do programa.
Assim, cabe à equipe gestora:
Informação: assegurar que toda comunidade escolar tenha uma visão clara e compartilhada do que é e como acontece a educação integral, a partir das diretrizes oferecidas por sua rede.
Mobilização: convocar a comunidade escolar para aderir com convicção e entusiasmo ao programa, por meio de oficinas com alunos, encontros formativos com professores, ações de comunicação com famílias, reuniões com diferentes representações da comunidade.
Adesão: negociar com a rede para que professores que não desejem participar do programa sejam transferidos para outras escolas e aqueles que aderirem trabalhem em regime integral (40 horas).
Diretrizes: liderar um processo coletivo de reformulação do projeto político pedagógico da escola à luz da educação integral, gerando um documento coerente e factível – com metas concretas e definição de responsáveis –, que contemple as expectativas (os sonhos) da comunidade escolar.
Pactuação: assegurar que todos os atores da comunidade escolar estejam comprometidos com o novo projeto político pedagógico e tenham clareza sobre seus novos papéis.
Autonomia: criar comissões de trabalho na escola que se responsabilizem pelas diversas áreas da educação integral (atividades pedagógicas, articulação com a comunidade, comunicação e mobilização, infraestrutura, monitoramento e avaliação etc.)
Democracia: oferecer canais de escuta e participação, garantindo que professores, funcionários, familiares e estudante possam opinar sobre a proposta pedagógica e a gestão da escola, de forma que compartilhem sonhos, desejos e responsabilidades.
Transparência: compartilhar dificuldades, convocar a comunidade escolar para ajudar a resolvê-las e disponibilizar planilhas orçamentárias para que todos possam opinar e repensar os investimentos conjuntamente com a direção.
Acompanhamento: criar mecanismos para monitoramento permanente do programa de educação integral, a fim de que os envolvidos possam identificar as necessidades de mudança e celebrar os avanços alcançados.
Avaliação: construir coletivamente indicadores de qualidade e progresso do programa e indicadores de aprendizagem para todas as ações educativas, inclusive atividades complementares.
Comunicação: divulgar ações e resultados para orientar e motivar todos os envolvidos.
Integralidade: assegurar que o novo projeto político pedagógico supere a separação entre turno e contraturno, promovendo a integração entre disciplinas tradicionais e atividades complementares (oficinas, trilhas, disciplinas optativas), bem como entre professores e oficineiros da comunidade.
Inovação: criar oportunidades para que a comunidade escolar possa ter acesso a novas referências e identificar e/ou gerar soluções para as novas demandas geradas pelo programa de educação integral.
Infraestrutura: garantir as condições físicas necessárias para a realização das atividades de educação integral, otimizando recursos da escola, da rede e de parceiros externos.
Engajamento: integrar a escola ao seu entorno, participando da vida da comunidade e envolvendo-a em todas as etapas do programa de educação integral.
Parcerias: mobilizar o apoio de diferentes setores da comunidade – empresas, organizações da sociedade civil, serviços públicos, lideranças, moradores, familiares, artistas, entre outros -, de forma a ampliar os espaços e agentes da aprendizagem.
Educador comunitário: designar um educador da escola para articular oficineiros, parceiros, comunidade e professores, a fim de que criem um cardápio de oportunidades educativas que integrem o território ao currículo e ao projeto político pedagógico da escola.
Formação: promover ações sistemáticas de formação em educação integral para professores, oficineiros, parceiros da comunidade, entre outros agentes da educação integral.
Trilhas: disponibilizar horários de planejamento, apoiar e empoderar professores para que construam roteiros educativos que integrem disciplinas tradicionais e atividades complementares, saberes acadêmicos e populares, de forma a promover o desenvolvimento integral dos alunos.
Veja as propostas e depoimentos na íntegra
A partir de diretrizes básicas dadas pelas secretarias, o gestor escolar deve construir as diretrizes da escola. É preciso estabelecer um diálogo entre a visão que a Secretaria tem para um determinado projeto ou programa e a visão da escola e seu papel na comunidade.
O gestor escolar precisa acessar as normativas do programa, bem como as respectivas linhas orçamentárias que garantam a efetivação do mesmo. É preciso que o gestor pressione sua respectiva secretaria para ter acesso ao “como fazer”.
É preciso ter uma visão clara do que a escola defende e entende por educação integral. Para isso, o gestor deve buscar que a escola discuta internamente – com seus diferentes setores representativos –, qual o papel e a função social da escola. É preciso que a escola determine com clareza seus princípios orientadores, identificando qual o projeto de sociedade que defende. O gestor escolar deve construir seu projeto dialogicamente, “lendo e praticando Paulo Freire”.
Os professores devem poder aderir ao programa voluntariamente a partir da apresentação do gestor escolar das metas, objetivos e proposta do programa – a rede deve proporcionar essa possibilidade e o gestor deve discutir essa questão em sua secretaria.
Nos Ginásios Experimentais Cariocas (GECs), no Rio de Janeiro (RJ), os professores puderam aderir voluntariamente ao programa. Os que não concordavam ou não se reconheciam na proposta passaram a atuar em outras escolas da rede e os que permaneceram efetivamente pactuaram com as transformações propostas pelo programa, assumindo com segurança os esforços necessários para atuar no novo modelo.
Para apoiar a mobilização dos estudantes, o gestor deve investir em metodologias de educação de pares, convidando estudantes que já vivenciaram escolas de Educação Integral para apresentar a nova rotina e estrutura aos demais estudantes, que ingressarão no novo modelo.
O gestor escolar pode estimular a participação dos alunos na construção do projeto adotado pela escola por meio de atividades de sensibilização e projeção futura (como Oficinas de Sonhos ou Oficinas de Projetos de Vida), metodologias que tangibilizam a concepção e proposta da educação integral para o projeto individual de cada jovem.
Da mesma forma como se dá com os alunos é interessante que os professores tenham espaços para construírem suas expectativas em relação ao programa ou projeto e que também tenham espaços de sensibilização por seus pares. É interessante convidar outros professores da rede que já tenham vivenciado a experiência.
O gestor deve ser a ponte entre as expectativas dos estudantes (levantadas nas oficinas de sensibilização) e dos professores. O programa e o currículo devem refletir efetivamente essas expectativas, tomando-as como construção do projeto colaborativo da escola.
Experiências
Nos GECs, no Rio de Janeiro, jovens que já haviam vivenciado experiências de educação integral formavam jovens que ingressariam nos ginásios. O mesmo aconteceu na Rede Estadual de São Paulo, nas escolas de tempo integral.
É importante que o gestor crie espaços de acolhimento para as necessidades e projetos de cada segmento da comunidade escolar.- Da mesma forma, o gestor deve trazer parceiros externos (professores, estudantes e familiares) que já vivenciaram programas semelhantes para dialogar com as famílias.
No processo de construção é fundamental que o gestor se apoie nas famílias para conscientizá-las da importância do tema e do papel que devem desempenha como atores educativos e na escola.
O gestor deve criar comissões representativas oriundas desses espaços de acolhimento; elas podem ser mistas ou representativas por segmento. Essas comissões devem ser acionadas para apoiar democraticamente a gestão do espaço escolar e da relação da escola com a comunidade em que se insere.
O gestor deve criar espaços de avaliação permanente, para que todos os envolvidos vejam a culminância dos seus esforços e percebam quais mudanças são necessárias. Novamente, o gestor deve investir nesses espaços como processos de co-responsabilização a partir da construção coletiva.
O gestor precisa inicialmente reconhecer que a construção do Projeto Político Pedagógico na escola (que tem como base a práxis e o conceito da Educação Integral) é um processo de médio prazo. É um processo de repactuação de todos os envolvidos da escola. Considerando que a instituição escolar foi concebida a partir de outra lógica, é preciso reconhecer a necessidade desse espaço de amadurecimento da comunidade escolar em relação ao tema e à proposta.
Ele deve ser desenvolvido pelas comissões representativas da comunidade escolar. É preciso que o gestor participe ativamente desse processo e dê tempo a essas comissões para que elas percebam as necessidades de mudança e quais pontos devem ser alterados em relação ao modelo tradicional de educação vivido até o momento.
Fundamentalmente esse documento precisa ser operacionalizável. O gestor precisa entendê-lo e fortalecê-lo como uma condição necessária para a escola funcionar.
Ele pode ser criado em metodologias colaborativas, em encontros periódicos no cotidiano da escola, envolvendo representantes de todos os segmentos da comunidade escolar.
É preciso que o gestor escolar crie estratégias para aproximar a comunidade escolar do documento; é preciso que essas estratégias combatam o deslocamento do documento do cotidiano escolar. Ele precisa ter uso cotidiano e ser apropriado por todos os segmentos da escola.
O documento
O sucesso do projeto ou programa de educação integral está na sua construção: se o processo for construído de forma colaborativa, não haverá dificuldade na sua implementação.
O gestor precisa descentralizar seu poder, dando autonomia às comissões setoriais da escola. Para tanto, ele precisa sensibilizar a equipe e comunidade escolar para que estejam todos cientes do papel que desempenham e que juntos, se reconheçam no todo, na missão da escola e no seu respectivo Projeto Político Pedagógico.
O gestor deve estimular na escola, em espaços de formação, uma discussão profunda com os diretores e funcionários sobre o papel do educador na sociedade e na escola, convidando-os a pensarem permanentemente sobre a importância que têm na formação dos estudantes.
O gestor escolar precisa estimular a motivação dos envolvidos, reconhecendo a partir do seu trabalho individual que ninguém é líder a todo o momento. Dessa forma, ele precisa conhecer sua equipe, ouvi-la permanentemente e a partir desse esforço, identificar as lideranças da sua escola. Precisa reconhecer a multiplicidade de papeis que cada um pode ocupar: que existem líderes e não líderes, que existem os proativos, os calados, os executores, os mobilizadores…e que todos são necessários na construção e gestão de um projeto coletivo e colaborativo de uma escola.
O gestor precisa investir na sua autonomia e trabalhar junto com sua respectiva administração (Diretoria ou Secretaria de ensino) para investir em sua equipe. É preciso que todos que façam parte da escola possam pactuar livremente com o projeto – é preciso partir da escolha dos indivíduos de pertencer ou não ao modelo proposto.
O gestor efetivamente deve ser o responsável por garantir a realização de todas as atividades da escola – do planejamento escolar à avaliação. Embora não seja “quem executa”, deve ser o grande articulador da escola, organizando as comissões e segmentos representativos nas ações pactuadas colaborativamente.
Assim, ele precisa se autoavaliar, reconhecer sua importância e garantir que efetivamente tenha paixão pelo que faz.
O gestor precisa ser direto e transparente com a sua comunidade. Deve assumir dificuldades e convocar a participação de todos para resolvê-las. Mas, para tanto, é preciso que a comunidade se sinta envolvida no processo desde o início – o gestor deve compreender a relação de confiança com a sua comunidade como um processo dialógico.
Da mesma forma, o gestor precisa ter a coragem de propor inovações. Ao mesmo tempo em que não deve negar a opinião do coletivo, precisa ter clareza na implementação da agenda da escola e garantir que os segmentos atuem conforme o pactuado em diálogo com as propostas e construção das normativas do programa ou projeto elaborado na política pública.
Para garantir esse diálogo, deve gerar espaço de escuta com todos os representantes setoriais e sempre que possível, encaminhar as resoluções internas e ações e estratégias desenvolvidas na escola à sua respectiva Diretoria ou Secretaria de ensino. É preciso que o gestor identifique interlocutores que assumam a agenda como sua, gerando corresponsabilidade pelo projeto.
Uma vez que o gestor identifica os líderes da escola, as comissões podem debater e dispor/ decidir sobre os temas. É preciso que paulatinamente o gestor conceda autonomia para as comissões. Os temas podem ser tanto os que agregam quanto os que desagregam a comunidade na cultura e dinâmica escolar. Deve haver espaço para se debruçar sobre o que não dá certo no programa e propor novas estratégias para resolver situações.
O gestor escolar precisa ter clareza dos temas que mobilizam e criam sentido para a participação da comunidade escolar. Para entender esses temas, ele pode fazer um diagnóstico com os segmentos representativos ou estimular que as comissões levantem e apresentem seus anseios.
A exemplo da metodologia de Comunidades de Aprendizagem (CREA), o gestor pode convocar planejamentos coletivos a partir dos sonhos da comunidade escolar. O planejamento pode então ser feito a partir do que foi sonhado coletivamente, traçando metas concretas e assumindo os responsáveis por cada ação. Este planejamento necessariamente deve contemplar toda a comunidade escolar e as famílias dos estudantes.
Por fim, o gestor precisa visibilizar os resultados, assumindo veículos e formas de comunicação internas que deem conta da divulgação do que está sendo construído. Visibilizar resultados gera motivação e convoca novos envolvidos.
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