publicado dia 16/01/2015

Novo lema do governo, “Brasil, Pátria Educadora”, demanda mudanças na atual política

Reportagem:

Colaborou Danilo Mekari

Em pouco tempo e com poucas palavras, o lema repercutiu na sociedade. O “Brasil, Pátria Educadora”, novo slogan do governo federal, foi anunciado pela presidenta Dilma Rousseff em seu discurso de posse no Congresso Nacional. O discurso veio também com a promessa de que a educação será a “prioridade das prioridades” nos próximos quatro anos.

Ainda pouco estruturada, a ideia da “Pátria Educadora” gira em torno das prioridades apontadas no discurso da presidenta. Procurados pela reportagem, tanto o Ministério da Educação (MEC) quanto a Presidência da República disseram não ter mais informações sobre o que consiste o lema. Em seu pronunciamento, Dilma apontou desafios que persistem há anos no Brasil, como a universalização do ensino e a alfabetização na idade certa, e também demandas latentes como a reformulação do ensino médio.

Ao bradarmos “BRASIL, PÁTRIA EDUCADORA” estamos dizendo que a educação será a prioridade das prioridades, mas também que devemos buscar, em todas as ações do governo, um sentido formador, uma prática cidadã, um compromisso de ética e um sentimento republicano.

Democratizar o conhecimento significa universalizar o acesso a um ensino de qualidade em todos os níveis – da creche à pós-graduação; Significa também levar a todos os segmentos da população – dos mais marginalizados, aos negros, às mulheres e a todos os brasileiros a educação de qualidade.

Ao longo deste novo mandato, a educação começará a receber volumes mais expressivos de recursos oriundos dos royalties do petróleo e do fundo social do pré-sal. Assim, à nossa determinação política se somarão mais recursos e mais investimentos.

Vamos continuar expandindo o acesso às creches e pré-escolas garantindo para todos, o cumprimento da meta de universalizar, até 2016, o acesso de todas as crianças de 4 e 5 anos à pré-escola. Daremos sequência à implantação da alfabetização na idade certa e da educação em tempo integral. Condição para que a nossa ênfase no ensino médio seja efetiva porque através dela buscaremos, em parceria com os estados, efetivar mudanças curriculares e aprimorar a formação dos professores. Sabemos que essa é uma área frágil no nosso sistema educacional.

O Pronatec oferecerá, até 2018, 12 milhões de vagas para que nossos jovens, trabalhadores e trabalhadoras tenham mais oportunidades de conquistar melhores empregos e possam contribuir ainda mais para o aumento da competitividade da economia brasileira. Darei especial atenção ao Pronatec Jovem Aprendiz, que permitirá às micro e pequenas empresas contratarem um jovem para atuar em seu estabelecimento.

Vamos continuar apoiando nossas universidades e estimulando sua aproximação com os setores mais dinâmicos da nossa economia e da nossa sociedade. O Ciência Sem Fronteiras vai continuar garantindo bolsas de estudo nas melhores universidades do mundo para 100 mil jovens brasileiros

Dilma Rousseff, em seu discurso de posse no Congresso Nacional, no dia 01/01 

Muitas das propostas contidas no “Brasil, Pátria Educadora” se referem a questões que hoje estão sob responsabilidade de estados e municípios, que gerem as redes de educação básica. Para o professor da Universidade de Brasília, Luiz Araújo, o governo propõe metas que devem ser concretizadas por outros atores e não ele próprio. “Em que a União vai apoiar os municípios? Há questões que não são de competência do MEC, então como ele vai ajudar? Porque se dependermos só da inércia de cada cidade, as crianças vão continuar fora da escola”, problematiza.

Entre as possíveis ajudas, o aumento no financiamento é uma demanda recorrente. Atualmente a educação pública é custeada conjuntamente entre os três níveis de governo – federal, estadual e municipal. No entanto, existem pedidos para que a União contribua mais, já que é o ente com mais recursos. “Existe uma grande expectativa de que o governo federal faça um repasse maior”, relata a coordenadora-geral da Ação Educativa, Vera Masagão.

O professor Luiz Araújo destaca a desigualdade presente no atual sistema. “De cada cinco reais investidos na educação, apenas um sai do cofre da União”, revela o docente da Universidade de Brasília (UnB), Luiz Araújo. “O formato atual não permite nem cumprir o Plano Nacional de Educação”, complementa.

Ainda que exista uma forte demanda por mais financiamento da União e do slogan do governo, o Ministério da Educação foi o mais atingido pelo corte de gastos nos primeiros dias da gestão. Foram suspensos 7 bilhões do orçamento em prol do equilíbrio das contas do Executivo. “Esse valor corresponde a 70% do valor que a União contribui no Fundeb“, revela Luiz, apontando que se aplicado ao Fundo, por exemplo, poderia contribuir para complementar o investimento dos municípios e estados em educação.

Vera explica ainda que ações como universalização do acesso à educação básica ou ampliação de vagas em escolas de tempo integral são especialmente caras. “Essa áreas especificamente envolvem grandes custos e temos um déficit nisto. Se pensarmos no Custo Aluno Qualidade (CAQ), que é um parâmetro de recurso por aluno para qualidade ainda estamos muito aquém”, explica.

A pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Carla Linhares, defende uma maior colaboração, também para além do financeiro, com diálogo constante. “Por meio de propostas, projetos e programas de indução, estímulos e ofertas. O [programa] Mais Educação é um bom exemplo dessa proposta”, explica.

O debate sobre o aperfeiçoamento do regime colaboração entre os três níveis de governo dialoga com a proposta da instituição de um Sistema Nacional de Educação, que foi um dos grandes temas da última Conferência Nacional de Educação. “Em um país continental, a descentralização é inevitável mas por outro lado precisamos que haja maior protagonismo do governo federal. No entanto, que contemple a diversidade regional e que não fique engessado, dependendo do governo federal para fazer tudo”, argumenta Vera.

 Luiz Araújo destaca que a grande descentralização criou desigualdades na educação recebida no Brasil. “Apesar de a educação ser um direito, dependendo de onde a pessoa mora, ela recebe um direito diferente”, argumenta. O docente compara com a saúde que criou um sistema nacional [SUS]:  “a educação se pulverizou em vários sistemas, é preciso um sistema nacional para regulamentar a colaboração”, defende.

Como construir uma “Pátria Educadora”? 

O aprimoramento do sistema federativo é apontado como fundamental para a construção de uma pátria educadora, segundo Vera Masagão. “Temos que construir pactos intergovernos, com o aumento das responsabilidades dos governos federal e estaduais. Precisamos de mais recursos e de um pacto para manter os investimentos”, argumenta.

Já Carla Linhares aponta uma série de pontos que devem ser modificados no atual panorama: a construção de uma política sólida de formação e valorização dos professores; repensar o tempo escolar, a partir da educação integral; ampliar a participação da comunidade na gestão escolar, entre outros.

No entanto, ela ressalta que é necessário vontade política para isso aconteça: “tem que realmente colocar isso como prioridade na mídia e em outros espaços para que todos se envolvam, porque não é uma questão só de governo. A Pátria Educadora precisa da participação da sociedade para que se concretize”.

O professor Luiz Araújo argumenta que é necessário inverter a lógica atual, mudando o lugar onde a educação se situa. “Temos que questionar que educação precisamos para que o Brasil alcance um outro patamar de desenvolvimento e a partir da resposta, vermos quanto custa e como cada ente federado pode contribuir”, explica o pesquisador. “Hoje se vê quanto temos de orçamento para ver o que poderia ser feito.”

Além disso, o professor aponta que é necessário a definição de um padrão de qualidade. “Isso seria estabelecer um patamar aceitável de ensino e contribuiria para mudar a lógica de financiamento, determinando a educação que queremos.”

Em sua análise, Vera, da Ação Educativa, defende que ao lançar o lema, o governo está correspondendo a uma expectativa que existe na sociedade em relação à educação. “Precisamos transformar essa consciência em ação para que o lema se transforme em realidade”, defende. “Sabemos que ele pode ser só um slogan, fazê-lo acontecer depende da pressão social.”

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