publicado dia 11/12/2024

Visão de mundo africana Bantu aponta outros futuros para a Educação

Reportagem:

🗒 Resumo: Conheça mais sobre a filosofia Bantu e como seus princípios podem contribuir para transformar as escolas brasileiras e a vida de seus estudantes e famílias. 

Em tempos de crise ambiental, política e social, como pensar outros futuros? E como construir a escola necessária para tanto? Este foi o centro do debate da live Hora do Intervalo de outubro, que ouviu especialistas sobre a filosofia Bantu, uma visão de mundo – ou cosmovisão – africana que pode contribuir com a construção de saídas para problemas contemporâneos.

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Quem é o povo Bantu?

O povo Bantu abarca toda a África subsaariana, com mais de 2500 etnias. Com suas diversidades, elas compartilham de alguns princípios comuns.

Entre os anos 1580 e 1850, 75% dos africanos sequestrados e traficados para o Brasil eram do povo Bantu. Foram eles também os primeiros exemplos de resistência à escravização em solo brasileiro, organizando lutas e reconstruindo o modelo africano do quilombo. 

Quais são alguns dos princípios da filosofia Bantu?

Eduardo Oliveira, doutor em Educação pela Universidade Federal do Ceará, pesquisador, assessor de movimentos sociais populares, além de ensaísta, poeta e Babalawô, apresenta alguns dos pilares da filosofia Bantu.

Ela traz uma forma de conceber o mundo que é comunitária e não tem como base o individualismo. Nesse mesmo sentido, ela também pensa e vive a convivência com a natureza. 

“Não tem nada de romântico ou idílico, ela é baseada em uma ciência ancestral que garante a vida de todos nós até hoje em dia, sem apartar o humano da natureza”, explica Eduardo, que também é professor na Universidade Federal da Bahia e foi professor visitante sênior na Universidade Pedagógica de Moçambique.

Além disso, é poética como estilo de vida, para quem a vida deve ser vivida como obra de arte. “Um cesto de palha além de ser funcional e bonito também faz uma mediação entre todos os viventes e o sagrado”, diz.

Dessa forma, um cesto de palha reúne toda a cosmovisão preservada como experiência comunitária, de natureza e poética. 

“A filosofia Bantu é uma cultura de alegria, de festa, que agrega e não separa. Mesmo tendo sistematicamente sofrido violência ao longo do tempo, responde com cultura, riqueza e generosidade à violência que sofreu”, observa Eduardo, que é autor de diversos livros sobre a cultura, história e filosofia brasileira, afro-brasileira e africana.

Como a filosofia Bantu pode transformar a Educação? 

Durante o debate, Suely Virgínia dos Santos, que é mestra em Psicologia Social pela Universidade Federal de Minas Gerais e consultora em relações étnico-raciais e de gênero, lembra que a maior parte da escola pública brasileira é feita por estudantes e famílias negras e, com base nisso, traz aspectos essenciais de serem considerados nessa escola.

“O ser humano só é humano a partir da convivência com os outros. A pessoa só se constrói como ser humano a partir das ações que consegue realizar junto à comunidade para beneficiá-la”, explica. Bantu, inclusive, deriva da palavra banto que significa “pessoa” ou “humano”. 

“A escola precisa considerar essas expressões culturais [africanas] como parte da sociedade brasileira e respeitá-las. É complicado para uma criança que nasceu em uma comunidade congadeira, em um quilombo ou é de terreiro, e vai para a escola e não encontra nenhuma referência do que ela identifica como o mundo e a comunidade dela. […] Elas sentem vergonha, se fecham e a tendência é que se afastem da escola. Que prazer vão encontrar ali se não faz sentido para elas?”, aponta a especialista.

Outro aspecto relevante a se considerar é a perspectiva em que as decisões e a convivência na escola se dão.

“Na filosofia Bantu, os interesses da comunidade vêm antes dos interesses individuais, o que é diferente da escola europeizada, que prioriza os interesses individuais”, diz Suely, que também foi professora-pesquisadora no primeiro curso de formação docente da Educação Escolar Quilombola realizado em Minas Gerais e seguiu fazendo projetos de formação docente para a Educação das Relações Étnico-Raciais (ERER) na UFMG.

Confira uma lista de materiais para conhecer mais sobre a filosofia Bantu

Live Hora do Intervalo aborda a filosofia Bantu 

Com a presença de Eduardo Oliveira e Suely Virgínia dos Santos, os especialistas apresentaram aspectos centrais da filosofia Bantu e indicaram caminhos para repensar a Educação à luz dessa cosmovisão.

O livro africano sem título — Cosmologia dos Bantu-Kongo, por Kimbwandende Kia Bunseki Fu-Kiau (Cobogó, 2024)

O autor, um dos mais importantes acadêmicos e pesquisadores da cultura africana, condensa os princípios da cosmologia dos Bantu-Kongo e usa figuras e diagramas para apresentar os ensinamentos, princípios, provérbios e a concepção de mundo que constituem esse sistema de pensamento.

Filosofia da ancestralidade: Corpo e mito na filosofia da Educação brasileira, por Eduardo Oliveira (Ape’Ku Editora, 2021)

Neste livro, o autor convida a pensar a filosofia da Educação brasileira em perspectiva afrocentrada. A obra faz parte de uma trilogia que conta ainda com os volumes A ancestralidade na encruzilhada: Dinâmica de uma tradição inventada e Cosmovisão africana no Brasil: Elementos para uma filosofia afrodescendente. No vídeo a seguir, Eduardo fala mais sobre a obra:

Podcast O Canto dos Recuados – Afrobarroco em Palestra Musical, por Mateus Aleluia

Ao longo de seis episódios, o projeto do cantor e compositor Mateus Aleluia propõe, a partir da sua trajetória, uma viagem por temas históricos, filosóficos e sociais para refletir sobre a cultura brasileira e sua diversidade intrínseca. 

Tese Modos de ser criança no quilombo Mato do Tição, Jaboticatubas (MG), por Patricia Maria de Souza Santana

Em tese orientada pela educadora Nilma Lino Gomes, Patricia observa e descreve as diversas possibilidades de aprendizagens que as crianças vivem neste quilombo e o modo singular de viverem suas infâncias – uma janela para compreender mais sobre esta visão de mundo. 

Hora do Intervalo apresenta as Diretrizes de Educação Integral Antirracista

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