publicado dia 05/07/2023
Um balanço do primeiro semestre de revisão do Novo Ensino Médio
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 05/07/2023
Reportagem: Ingrid Matuoka
Nesta quinta-feira (6/7) se encerra a consulta pública sobre o Novo Ensino Médio (NEM), aberta pelo Ministério da Educação (MEC) em março. A expectativa é que nas próximas semanas o órgão apresente um parecer sobre o destino da política.
Leia + “Novo Ensino Médio está ferindo os direitos dos adolescentes”, diz Cesar Callegari
Nos últimos meses, a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, o Senado Federal, o Fórum Nacional de Educação (FNE), e outras entidades vêm realizando audiências, debates e seminários sobre o tema.
O Movimento de Inovação na Educação, por exemplo, ouviu estudantes que trazem proposições para a última etapa da Educação Básica pensadas por quem mais é impactado pela política.
Já a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), que realizou uma série de escutas, consolidou as múltiplas percepções em um relatório final encaminhado ao MEC e que recomenda a revogação da política.
Assim como a entidade, boa parte dos educadores, estudantes e especialistas pedem a revogação do Novo Ensino Médio. Na Câmara dos Deputados corre um projeto de lei (PL 2601/2023) com essa defesa. Na segunda (03/07), secretários estaduais de educação entregaram ao MEC, em conjunto, uma proposta de readequação do Novo Ensino Médio.
“O MEC tem tido resistência em seguir a demanda popular, dos profissionais da Educação e dos estudantes, dado que está no centro da disputa de modelos educacionais, contando com influência de instituições ligadas ao mercado, inclusive com quadros dentro da pasta advindos de fundações e institutos empresariais que fizeram parte da construção do NEM. Em meio a esse cenário, esperamos que, finalmente, o MEC ouça a ampla maioria da comunidade educacional e científica, suspenda essa reforma e reestruture, com qualidade e financiamento adequado, essa etapa essencial para a trajetória de nossos jovens”, diz Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Para Kaillany Victória, de 18 anos, que cursa o 3° ano do Ensino Médio na rede pública do Rio de Janeiro (RJ), a implementação do NEM em sua escola representou a perda de professores queridos e a desesperança com seu futuro.
“Minha escola tinha uma proposta pedagógica humana, de educar para a autonomia intelectual, a criatividade e o compromisso social. Foi ela que me deu uma nova visão de vida, porque antes não me via ocupando certos espaços do mercado de trabalho e do Ensino Superior. Entre 2021 e 2022, a política foi implementada e metade (30) dos professores foram demitidos. Isso me doeu muito e, além disso, sinto que estou cada vez mais distante de poder alcançar os sonhos que encontrei quando entrei nessa escola”, lamenta a jovem.
Kaillany, que faz parte do grêmio de sua escola e da Associação dos Estudantes Secundaristas do Rio de Janeiro, está em contato com vários colegas estudantes do Estado e relata que suas percepções e realidade, infelizmente, são comuns.
“Vemos um cenário caótico de estudantes que têm duas opções de itinerários formativos na escola. Que faltam professores e, os que têm, vários estão internados por causa de mofo nas escolas. Já as unidades que tinham melhores condições financeiras, conseguiram manter a qualidade do ensino”, observa Kaillany.
Os dados do balanço do Plano Nacional de Educação (PNE), realizado pela Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, mostram a exclusão escolar de estudantes da etapa. Entre 2020 e 2021, saltou de 433 mil para 521 mil o número total de jovens de 15 a 17 anos ainda fora da escola, 6 anos depois do prazo de universalização previsto pelo PNE ter se esgotado.
“Os alunos me falam que acham os itinerários formativos pura ‘encheção de linguiça’; coisas pouco significativas, fragmentadas, por mais que eu traga tudo de melhor que eu posso para essas aulas – falta material, formação e uma coordenação melhor do que são esses itinerários,”, afirma a professora Letícia Teruel, que leciona para o Ensino Médio na rede pública de São Paulo (SP).
A questão do Projeto de Vida, destaca Kaillany, é uma contradição diante desse cenário que se apresenta:
“Falam sobre quanto preciso ser a protagonista da minha vida e que vai dar tudo certo se eu estudar e trabalhar. Só que eu sei que sou eu pegando transporte público lotado às 5 da manhã para chegar na escola e não ter acesso à Educação que tenho dinheiro, enquanto essa não é a realidade de quem vai competir comigo no vestibular. Como vou projetar uma vida se não consigo estudar para o vestibular e com uma série de problemas aqui na escola?”, indaga.
Para a secundarista, a saída para essa política não tem como ser outra: é preciso ouvir os jovens e fortalecer as instância de participação estudantil. “Há um movimento muito grande para afastar os estudantes da política, de não colocar a gente à frente das decisões e impedir que a gente tenha tempo para debater questões atuais da sociedade e das políticas. Precisamos revogar essa política e criar uma reforma protagonizada pelos estudantes. Minha experiência tem sido ensurdecedora e não dá mais para viver nessa realidade”, diz.