publicado dia 18/11/2024
Seminário Nacional de Educação Integral: Como construir uma Educação Integral e democrática?
Reportagem: Da Redação
publicado dia 18/11/2024
Reportagem: Da Redação
🗒️Resumo: Organizações da sociedade civil e educadores debateram caminhos para o fortalecimento de uma Educação Integral, democrática e humanizadora no 3º Seminário Nacional de Educação Integral.
A convergência para a construção de uma Educação Integral com características democráticas e humanizadoras foi o centro da mesa realizada na manhã da quinta-feira (14/11) no 3º Seminário Nacional de Educação Integral.
Reunindo educadores, pesquisadores, gestores e representantes do poder público, o evento aconteceu em Brasília (DF), entre 11 e 14/11.
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Ao lado do gestor do Centro de Referências em Educação Integral, Fernando Mendes, do educador português José Pacheco e da integrante do Conselho Nacional de Educação (CNE), Pilar Lacerda, participaram da rodada de discussão 10 organizações da sociedade civil e movimentos sociais. A mediação foi de Wilson da Costa Barroso, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Assista ao evento na íntegra:
Idealizador da Escola da Ponte, o educador português José Pacheco abriu as discussões.
“Aprendi que escola não é um prédio, escolas são pessoas. Na biblioteca pública, aprendi que Educação é uma só. Aprendi que currículo não é algo prescrito, mas é tridimensional, subjetivo, comunitário e universal”, defendeu, ressaltando que, em sua visão, Educação Integral é incompatível com provas, turmas, diretores.
O educador explicou que é através dos vínculos que é construída a aprendizagem. “Quando cheguei ao Brasil, achei que tinha inventado a roda com a Escola da Ponte. E depois, comecei a desfazer o mito. Porque percebi que a melhor Educação do mundo não está no Norte, está no Sul”, afirmou. “Só que o educador brasileiro tem baixa autoestima e busca modelos externos, como o da Finlândia”, disse.
Pacheco descreveu os projetos e iniciativas que conheceu no Brasil, onde está radicado há 23 anos, destacando os liderados pelos povos indígenas e quilombolas. “No Brasil, fui ao encontro dos povos originários, quilombolas e das favelas”, afirmou.
Ao mesmo tempo, destacou que os projetos educacionais, via de regra, são hierárquicos, pouco democráticos, hegemônicos, obsoletos e moralmente corruptos.
“É possível a escola pública, é possível a escola de Anísio (Teixeira), mas para isso, teremos que regenerar o sistema de ensino, humanizar a relação pedagógica e criar uma nova construção social de aprendizagem”, defendeu.
Na sequência, Helena Singer, representante das Escolas 2030, contou sobre as ações do programa. “O programa Escola 2030 acontece em 10 países do Sul Global. É um programa focado em enfrentar o eurocentrismo. No Brasil, é coordenado pela Ashoka e pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP)”, explicou.
Definido como um programa de pesquisa-ação, que inclui países africanos e asiáticos, além do Brasil e de Portugal, o Escolas 2030 se organiza a partir da articulação da universidade com escolas e organizações educativas não-escolares. No Brasil, as iniciativas são pautadas pelas perspectivas da Educação Integral e da Educação Popular.
Representando o Instituto Cultiva, Rudá Ricci trouxe questões políticas para dialogar. A primeira delas, é que a Educação é um campo em disputa. “O Ideb é exatamente o eixo da crítica que Paulo Freire fazia à Educação Bancária. O Ideb transforma o aluno em número e discute o ranking. Isso é o inverso de tudo o que Anísio Teixeira e Paulo Freire falavam”, criticou.
A segunda questão é a disputa por verbas públicas na Educação entre diferentes setores. Como no exemplo da abertura de escolas cívico-militares ou da atuação de ONGs ou de fundações empresariais em projetos educacionais.
A seguir, detalhou ações do projeto Comunidades Educadoras, promovido pelo Instituto Cultiva. Entre elas, a centralidade na figura da mãe (ou da avó) dos estudantes, ou seja, das mulheres, na Educação.
“Ao investir e olhar para as mães, o resultado é imediato. O cuidado é o eixo da Educação Integral, cuidado com o professor, com a escola, com o entorno”, disse. “Por isso, precisamos de uma rede articulada de apoio para a mãe”, defendeu.
Valdo José Cavallet, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e representante do Movimento de Alternativas para uma Nova Educação (MoANE), destacou as trocas proporcionadas pelo 3º Seminário Nacional Educação Integral. Ele também compartilhou as experiências da MoANE.
“Se há uma coisa que aprendemos é a navegar contra o vento. Intergeracionalmente, trabalhamos com 6 inter-relações, intersaberes, inter-organizações, inter-culturas e interterritório. “Todos aprendem com todos. São mais de 70 projetos”, disse, destacando a importância das experiências educacionais desenvolvidas nos territórios brasileiros. “Está cheio de experiências pelo Brasil inteiro. Nós não precisamos aprender com ninguém, temos que olhar mesmo para cada um de nós”, defendeu.
Jeanne Marie, do Movimento Pedagogia das Virtudes, arquiteta e educadora, apresentou algumas propostas da Pedagogia das Virtudes, que visa promover aspectos e valores como respeito, cuidado, colaboração e compaixão.
“A Educação deve preparar o ser humano para ser um humano integral, que deve levar em conta diferentes dimensões”, explicou. Para isso, é preciso desenhar um novo modelo educacional.
Atualmente no Conselho Nacional de Educação (CNE) e na Secretaria Nacional de Direito da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, a educadora Pilar Lacerda falou sobre o contexto de luta pela defesa de direitos em meio ao avanço conservador.
No caso da Educação, apesar de mudanças nas gestões, o trabalho das escolas e das professoras permanece. “É nesse lugar que precisamos trabalhar”, apontou, destacando a relevância da intersetorialidade. “O trabalho intersetorial precisa ser costurado com todo mundo. A gente viu que sem intersetorialidade na Educação, sem aldeia para cuidar de uma criança, nada acontece”, disse.
‘Sou radicalmente a favor da concepção de Educação Integral e de tudo que ela traz em termos de mudança da sociedade”, defendeu.
Representando o Movimentos Verdes, Rachel Trajber abordou a construção da Educação Integral no Novo Regime Climático. O termo, cunhado pelo antropólogo Bruno Latour, descreve a nova realidade de crise climática global em curso.
“Nós estamos no Novo Regime Climático, precisamos fazer prevenção, adaptar, mitigar”, explicou a coordenadora do Programa Cemaden Educação, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
“Com a Educação, conseguimos criar uma abordagem integrada e transformadora”, defendeu Rachel.
Assim, como criar uma Educação Integral para o enfrentamento da emergência climática? Para Rachel, é possível criar na Educação uma abordagem integrada e transformadora. Como exemplos, a coordenadora do Cemaden Educação citou ações como “Escolas e comunidades na prevenção de riscos de desastres” e a definição de Diretrizes para a Educação Ambiental Climática.
Valter de Jesus Leite, integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), trouxe a perspectiva do movimento social e explicou o funcionamento das escolas do entorno de acampamentos de reforma agrária. “São escolas públicas de gestão municipal e estadual”, explicou, descrevendo o trabalho com a Pedagogia do Movimento Sem Terra. “Nós temos desenvolvido ricos processos formativos via agroecologia, de preservação de fontes de água, de desenvolvimento de agroflorestas, hortas, recuperação de nascentes”, exemplificou.
Vera Lúcia Santana abordou a experiência da Escola de Saberes Conexão Felipe Camarão, iniciativa desenvolvida em Natal (RN).
Além da abordagem intersetorial, projetos de Educação Integral devem observar o território e acolher a cultura desenvolvida pelas comunidades, defendeu a educadora.
Para Fernando Mendes, gestor do Centro de Referências em Educação Integral, é preciso reconhecer que o modelo de escola atual não é suficiente e nem querido pelas juventudes.
“É urgente ressignificar o que é ser escola. Como essa escola vai ser, quais seus princípios e como essa escola vai trabalhar são questões fundamentais para a construção da política [de Educação Integral]”, defendeu, ressaltando a importância dos saberes das comunidades indígenas e do movimento negro educador como referências nesse processo.