publicado dia 04/12/2024
Nilma Lino Gomes: “Educação Integral articulada com Educação para as relações étnico-raciais é uma proposta transgressora”
Reportagem: Da Redação
publicado dia 04/12/2024
Reportagem: Da Redação
🗒 Resumo: Em vídeo, professora Nilma Lino Gomes explica a indissociabilidade entre a Educação Integral e a Educação para as relações étnico-raciais.
A Educação Integral e a Educação para as relações étnico-raciais são campos de luta diferentes que compartilham os mesmos princípios e objetivos. É o que argumenta Nilma Lino Gomes, professora na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em vídeo do grupo de pesquisa Territórios, Educação Integral e Cidadania (TEIA/UFMG).
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A pedagoga e antropóloga, expoente da luta antirracista no Brasil, começa sua fala citando a definição de Educação Integral do Centro de Referências em Educação Integral:
“A Educação Integral é uma concepção que compreende que a educação deve garantir o desenvolvimento dos sujeitos em todas as suas dimensões – intelectual, física, emocional, social e cultural e se constituir como projeto coletivo, compartilhado por crianças, jovens, famílias, educadores, gestores e comunidades locais.
É uma proposta contemporânea porque, alinhada as demandas do século XXI, tem como foco a formação de sujeitos críticos, autônomos e responsáveis consigo mesmos e com o mundo;
É inclusiva porque reconhece a singularidade dos sujeitos, suas múltiplas identidades e se sustenta na construção da pertinência do projeto educativo para todos e todas;
É uma proposta alinhada com a noção de sustentabilidade porque se compromete com processos educativos contextualizados e com a interação permanente entre o que se aprende e o que se pratica;
Promove a equidade ao reconhecer o direito de todos e todas de aprender e acessar oportunidades educativas diferenciadas e diversificadas a partir da interação com múltiplas linguagens, recursos, espaços, saberes e agentes, condição fundamental para o enfrentamento das desigualdades educacionais“.
Nilma explica que a Educação Integral e a Educação para as relações étnico-raciais são “interligadas” porque ambas visam uma Educação emancipatória.
“Uma Educação antirracista só pode se realizar em um terreno democrático, jamais em um terreno autoritário, que vê o conhecimento de forma conteudista […] ela precisa de um chão para existir e esse chão tem que ser democrático, ético e emancipatório”, afirma a educadora.
A valorização dos sujeitos e suas diferenças, bem como o pleno desenvolvimento humano de todos e de cada um, que passa por garantir direitos, são outros objetivos compartilhados por ambas concepções.
“Não há como pensar em um pleno desenvolvimento humano se as pessoas vivem sujeitas às mais diversas formas de preconceito, discriminação racial e racismo […] nós não somos sujeitos pela metade, embora as situações de desigualdade, discriminação, racismo, machismo e LGBTQIA+fobia, nos tratem como se nós fôssemos não integrais”, diz Nilma.
Para apoiar as redes e escolas a praticarem o combate ao racismo em todas as suas facetas, a especialista lança indagações acerca das várias dimensões dos sujeitos, que podem disparar reflexões e práticas no chão das escolas. Confira algumas delas:
Dimensão cognitiva: Superamos a ideia de que negros e negras possuem baixo desenvolvimento intelectual, apregoada pelo racismo científico, que se reedita em todas as cenas racistas da nossa sociedade? Já pensamos como essa concepção cognitivista da Educação tem um peso do racismo?
Dimensão física: Nossas práticas de Educação Integral consideram a corporeidade negra, a beleza, a potência? Nós agimos de forma pedagógica e firme diante de situações de racismo entre estudantes, quando envolve a depreciação dos sinais fenotípicos dos negros e das negras? Tais como cabelo, cor da pele? A gestão intervém de forma mais firme em relação às práticas racistas que nós percebemos e que podem acontecer entre docentes, entre docentes e estudantes, entre docentes e outras pessoas, outros profissionais que atuam na escola, entre a escola e familiares?
Dimensão social: Como o antirracismo se faz presente ao considerarmos nas políticas e nas práticas de Educação Integral a importância das interações sociais? Incluímos que o antirracismo também tem que ser um desses eixos dessa concepção de interação social, de participação, de responsabilidade, de cooperação, de trabalho?
Dimensão emocional: É possível afirmar que as nossas práticas, as nossas políticas, elas educam para o reconhecimento, o respeito, ética, em relação à diversidade e nesta incluímos a diversidade étnico-racial? Crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, que vivenciam práticas de Educação Integral, vivem experiências afirmativas no que se refere à raça que as leve emocionalmente a se sentirem aceitas, acolhidas, valorizadas, reconhecidas, com uma autoestima elevada? A forma como nós consideramos essa integralidade do ser humano, ao focalizar as relações raciais, nas experiências de Educação Integral, tem formado subjetividades insurgentes, contrárias a todo e qualquer tipo de discriminação, de violência, e dentre elas a violência racial?
Dimensão cultural: As nossas práticas e experiências de Educação Integral vão sempre reconhecer a força da cultura. Como a cultura afro-brasileira entra? É com a valorização da diversidade étnico-racial ou ela se apaga, se invisibiliza e fica diluída no meio de todos, todas, uma homogeneidade cultural? Como fica essa dimensão da cultura, dos movimentos sociais, dos grupos culturais, dos grupos religiosos não hegemônicos?
“Tudo isso tem que ser considerado para nós pensarmos uma educação que de fato abarque a integralidade dos sujeitos e das sujeitas”, sintetiza Nilma, destacando que “a Educação Integral que articula a Educação das relações étnico-raciais é uma proposta transgressora”.