publicado dia 25/02/2021
Entenda o papel da vigilância epidemiológica na decisão de reabertura das escolas
Reportagem: Ingrid Matuoka
publicado dia 25/02/2021
Reportagem: Ingrid Matuoka
Não há consenso em relação a abrir ou fechar escolas no Brasil. Um dos motivos talvez seja a diversidade dos cenários que se apresentam pelos territórios, tanto em relação à gravidade da pandemia do novo coronavírus, quanto à variedade de infraestrutura que as escolas possuem. Soma-se a isso o fato de que vários professores e membros da comunidade escolar integram o grupo de risco ou sentem medo, mais do que legítimo, de exporem a si e às suas famílias a uma contaminação, especialmente porque muitas escolas não possuem a infraestrutura adequada para garantir o distanciamento social, a ventilação dos ambientes e as condições de higiene.
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Enquanto isso, a situação de vulnerabilidade de crianças e adolescentes se amplia no país. Durante o ano de 2020, de acordo com o estudo “Enfrentamento da cultura do fracasso escolar”, lançado pelo UNICEF (Fundo das Nações Unidas pela Infância), em parceria com o Instituto Claro, e produzido pelo Cenpec Educação, mais de 5,5 milhões de crianças e adolescentes não tiveram acesso a nenhuma atividade escolar, impacto que atinge principalmente a população negra e indígena.
Outro estudo, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), concluiu que em territórios onde a pandemia está sob controle, é possível considerar o retorno presencial. Contudo, isso não deve ser interpretado como uma volta à realidade antes da pandemia, mas como um processo de adaptação segura do ambiente escolar. “Com uma estratégia bem implementada para controle da Covid-19, em contextos onde a doença está controlada, é possível manter as escolas abertas sem consequências significativas na transmissão comunitária do vírus.” Outro aspecto levantado indica que, para ajudar a balancear a disseminação do vírus, o fechamento de outras atividades não essenciais, como bares e restaurantes, facilitaria a reabertura das escolas.
No Brasil, além da pressão por reformas e melhorias nos espaços escolares, medidas necessárias desde antes da pandemia e agora inadiáveis, cresce a demanda para garantir a vacinação de todos os profissionais da educação de forma prioritária. A questão, segundo especialistas, é que embora a vacina diminua a gravidade da doença e as chances de contaminação, ela não garantirá o retorno à normalidade.
Confira como estão as discussões sobre vacinação dos professores
“A vacina leva um tempo para fazer efeito, ainda não sabemos quanto tempo essa imunização dura, e nem todo mundo está vacinado e nem terá como vacinar a todos a médio e longo prazo”, explica Gulnar Azevedo, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Além disso, a escassez de vacinas e a demora do governo federal em adquirir mais doses, aliado ao surgimento de novas cepas, podem estender esse cenário por tempo indefinido.
Em um contexto de baixo índice de transmissão do coronavírus no território, analisa Gulnar, a reabertura segura das escolas deve ser resultado de “uma parceria entre o setor da educação e saúde que possa avaliar o número de casos notificados e de óbitos para controlar como está a epidemia no território, e implementar a vigilância sanitária e epidemiológica”.
Uma vez abertas, as escolas devem adotar os protocolos de distanciamento social, higiene, uso de máscara, cuidados com o ambiente e a preferência por atividades em locais abertos. É fundamental que se faça o monitoramento diário de todas as pessoas que circulam pelo espaço escolar. Caso alguém apresente sintomas ou seja diagnosticado com a doença, é preciso rastrear todas as pessoas com quem teve contato e avaliar como bloquear a continuidade da transmissão.
As escolas de rede de Jundiaí (SP) reabriram em fevereiro, promovendo atividades ao ar livre, seguindo os protocolos e realizando a vigilância epidemiológica. Se você quiser saber mais, confira o Guia de Aprendizagem ao Ar Livre em Jundiaí, desenvolvido em parceria com o Instituto Alana.
Em São Paulo, a Secretaria Municipal de Saúde divulgou o documento “Orientações para retorno seguro às aulas no município de São Paulo, diante da pandemia da Covid-19”, que descreve a implementação de estratégias de vigilância epidemiológica. Dentre elas, figuram a busca ativa de profissionais e estudantes com sintomas gripais, com afastamento imediato seguido por investigação laboratorial (RT-PCR). As orientações versam também a respeito das medidas que devem ser adotadas em caso de contaminação e indica quando notificar o Departamento de Vigilância Epidemiológica (DVE) para reavaliar a situação da unidade.
“Pesando a situação de cada local, o que significa ficar com as escolas fechadas para a população em geral e a necessidade de proteção contra o vírus, é possível encontrar caminhos. Mas essas soluções precisam envolver a Saúde, Educação e outros setores, os professores e funcionários, as famílias e os estudantes. E, para embasar tudo, é fundamental que haja uma política pública orientando e definindo. Por isso, precisamos nos mobilizar e pressionar o governo municipal e estadual para que essa construção funcione”, orienta a presidente da Abrasco.
Criada por 32 pesquisadores de várias áreas dedicados a estudar a evolução da pandemia no Brasil, a iniciativa “Ação Covid-19” propõe um modelo de simulação para o avanço das infecções de acordo com a densidade demográfica e o desenvolvimento humano de cada área analisada. Mais recentemente, o mesmo modelo foi adaptado às escolas.
Colocando as características de espaço físico da unidade escolar e o respeito aos protocolos de segurança e higiene e às regras de distanciamento social, é possível simular cenários que indicam o sucesso ou o risco aproximado de reabrir aquela unidade. Esses dados são expressos em porcentagem de infectados e imunes por dia, ao longo dos dias letivos.
Conheça o simulador de dispersão do vírus nas escolas, elaborado pelo grupo Ação Covid-19.
“Como as escolas são muito diferentes entre si, usamos duas públicas de São Paulo que consideramos como extremos. A primeira fica em Pinheiros, é muito arejada, com espaços abertos e corpo escolar pequeno. A segunda, da Brasilândia, tem espaço físico reduzido e muito fechado, com maior quantidade de alunos e professores”, explica Patrícia Magalhães, pós-doutoranda em Física na Universidade de Bristol (Inglaterra) e integrante da equipe.
No vídeo abaixo, Patrícia Magalhães explica como utilizar o simulador:
Para as escolas, esse simulador pode apoiar duas frentes de trabalho: a pedagógica e a de tomada de decisões. “O simulador pode ajudar as pessoas a entenderem o impacto direto que o cumprimento dos protocolos tem, o que facilita que eles sejam cumpridos. Além disso, possibilita que cada escola compreenda a sua especificidade baseada nessas condições básicas e, assim, possa buscar a sua forma mais adequada para voltar a funcionar”, analisa Patrícia.
O que é a #Reviravolta da Escola?
Realizado pelo Centro de Referências em Educação Integral, em parceria com diversas instituições, a campanha #Reviravolta da Escola articula ações que buscam discutir as aprendizagens vividas em 2020, assim como os caminhos possíveis para se recriar a escola necessária para o mundo pós-pandemia.
Leia os demais conteúdos no site especial da #Reviravolta da Escola.