publicado dia 19/07/2024

Como implementar políticas de Educação Integral em territórios de comunidades tradicionais

Reportagem:

🗒️Resumo: Baixe o ebook gratuito Diretrizes para Implementação de Políticas de Educação Integral em Territórios de Comunidades Tradicionais, fruto da formação com 33 Secretarias Municipais de Educação da Amazônia brasileira. Seu objetivo é promover políticas de Educação Integral com a participação das comunidades tradicionais do território, bem como valorizar sua cultura e conhecimentos nos projetos, ações e currículo da rede.

As Secretarias Municipais de Educação localizadas em territórios de comunidades tradicionais, como quilombolas, indígenas e ribeirinhos, têm a seu dispor uma vasta diversidade cultural e de conhecimentos que pode enriquecer o trabalho da rede como um todo. 

Para além da valorização, durante a pandemia essa aproximação tornou-se ainda mais indispensável para garantir direitos. De acordo com pesquisa realizada pelo Unicef em 2021, crianças e adolescentes negros(as) e indígenas foram os mais afetados pela exclusão escolar. 

Diante deste cenário, 33 Secretarias Municipais de Educação da Amazônia Legal decidiram implementar políticas de Educação Integral que levassem em conta o território e suas comunidades, para ofertar uma Educação contextualizada e relevante para aquelas pessoas – tanto para enfrentar os efeitos da crise quanto para valorizar a cultura local. É assim que surge o NÓS – Iniciativa pela Educação Integral em Territórios Amazônicos

O projeto NÓS – Iniciativa pela Educação Integral em Territórios Amazônicos foi realizado pelo Centro de Referências em Educação Integral (CR), em parceria com a Roda Educativa (antiga Comunidade Educativa CEDAC), Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais (FLACSO Brasil) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Ao longo de dois anos, municípios do Amapá, Amazonas e Maranhão exercitaram a capacidade de reconhecer as contribuições dessas comunidades e a escutá-las e incorporá-las às políticas públicas e outras ações da rede. 

“Vimos comunidades que passaram a ter fala e poder de decisão, bem como a sua língua materna respeitada. Vimos redes incluindo no currículo a história e cultura dessas comunidades, priorizando a realização de atividades de artes, música, e idiomas na zona rural, constituindo territórios educativos e convidando lideranças comunitárias para ministrar cursos para professores da rede”, observa João Gabriel do Nascimento Nganga, pesquisador e formador do projeto, sobre algumas das transformações constatadas.

A partir dessa experiência, surge o documento Diretrizes para Implementação de Políticas de Educação Integral em Territórios de Comunidades Tradicionais, que está disponível para ser baixado gratuitamente, e oferece reflexões para outros municípios que se interessarem em conduzir formações no tema. 

Ebook Diretrizes para elaboração de Políticas de Educação Integral em territorios de comunidades tradicionais (1)

O município de Alcântara (MA) foi um dos que participou da formação. Com cerca de 18 mil habitantes, a região é uma das que concentram a maior população quilombola do Brasil. Das 44 escolas, 39 são dedicadas às comunidades tradicionais.

“Conseguimos realizar rodas de conversa nas escolas com a participação dos mais velhos dessas comunidades, que compartilharam seus saberes. Também levamos as crianças para visitar os territórios, como os lugares que os contadores de lendas e histórias retratam. Há projetos de estudar a vida das mulheres que são lideranças locais, oficina de dança do coco marajá, e outras atividades que aproximam a todos”, relata Hewerton Ricardo Trindade Praga, Secretário Adjunto de Educação de Alcântara.

Entre os desafios encontrados no processo, Hewerton destaca a formação de professores, uma vez que muitos docentes da rede não são oriundos das comunidades em que atuam. “Foi um trabalho intenso para que os professores pudessem conhecer a fundo a turma e o território, e adequar o currículo e as atividades à realidade local”, afirma Hewerton.

A proposta da formação

As Diretrizes para Implementação de Políticas de Educação Integral em Territórios de Comunidades Tradicionais propõem realizar um diagnóstico participativo da rede, levando em conta as desigualdades e o racismo enquanto obstáculos a serem enfrentados para implementar as transformações desejadas.

“O grande investimento do projeto é criar subsídios para que as secretarias formulem políticas públicas que possibilitem que as escolas pratiquem uma Educação Integral ancorada em equidade e que leve em consideração as particularidades de raça, etnia, gênero, território e inclusão, para além de apenas as pessoas com deficiência”, explica João Gabriel. 

Há também uma etapa dedicada a mapear o território, as comunidades e seus saberes, bem como sua presença – ou ausência – nos processos educacionais da Secretaria. E outra fase para criar um plano de ação e formação para tornar as práticas efetivas, duradouras e contextualizadas..

O que são as comunidades tradicionais?
De acordo com a
Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, considera-se povos e comunidades tradicionais os “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

A proposta é que secretários de Educação, técnicos da Secretaria e representantes de outras áreas da política pública possam participar da formação em um primeiro momento para, depois, formarem-se junto às escolas, estudantes e famílias. 

O material também incentiva a colaboração intermunicipal. “É interessante oportunizar que os municípios estejam em grupo para aprender um com o outro, ouvir relatos, trocar práticas e os desafios nas tentativas e esforços de incluir as comunidades tradicionais”, indica o pesquisador e formador.

As Diretrizes também apontam caminhos para garantir que as ações desenvolvidas não acabem ou sofram alterações nocivas com o fim da gestão municipal vigente. “E também como fazer dialogar as legislações específicas de ensino das comunidades tradicionais com o Programa Escola em Tempo Integral, que tem fomentado a ampliação da  jornada escolar pelo Brasil”, diz João Gabriel.

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