publicado dia 10/10/2017

Como a arquitetura escolar pode dialogar com a educação integral?

Reportagem:

Para uma boa educação, basta um bom professor, certo? Nem sempre. Na verdade, a arquitetura escolar exerce também influência no processo de ensino-aprendizagem. A disposição das cadeiras e a iluminação, por exemplo, podem fazer toda a diferença na hora de trabalhar um conteúdo com os alunos.

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“O ambiente muda toda a qualidade daquilo que você está fazendo. É preciso ventilação natural, acústica adequada, mobiliário e iluminação”, afirma Beatriz Goulart, arquiteta, urbanista e coordenadora do Cenários Pedagógicos.

Para Doris Kowaltowski, professora titular da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp e autora do livro “Arquitetura Escolar: o projeto do ambiente de ensino”, ter um ambiente projetado com elementos de humanização faz com que os estudantes se sintam mais confortáveis e se reconheçam naquele espaço, o que terá relação direta com o aprendizado.

Doris explica que a arquitetura humanizada aplicada a uma escola deve levar em conta elementos naturais e vegetação, evitar a monumentalidade, ter alguma relação com a arquitetura residencial e apresentar o que a professora chama de “detalhamento”, ou seja, um acabamento final indicando preocupação do arquiteto com aquele espaço.

“É importante retomar esse histórico de que a escola foi criada para controlar, vigiar e punir e mudar essa perspectiva para uma educação transformadora, democrática e integral”

No entanto, nem sempre esses pontos são levados em conta quando uma nova escola é projetada. Para Beatriz, isso é um reflexo do histórico da arquitetura escolar no Brasil e da falta de diálogo entre pedagogia e arquitetura.

“A história da arquitetura das escolas brasileiras está ligada ao custo, à velocidade, nem sempre à qualidade e, muito menos, a um ambiente propício para a aprendizagem. A escola era apenas a sala de aula e a lousa”, comenta.

Doris acredita que a falta de tempo e recursos também é algo que contribui para que os projetos não levem em conta o desenvolvimento integral do aluno. “No geral, só pensamos em resolver o problema da vaga do aluno e não sobra dinheiro para fazer um projeto completo”, diz.

“É importante retomar esse histórico de que a escola foi criada para controlar, vigiar e punir e mudar essa perspectiva para uma educação transformadora, democrática e integral”, completa Beatriz.

Diálogo com o programa pedagógico

Repensar a configuração tradicional da sala de aula é o primeiro passo para uma transformação dos espaços escolares. “O mobiliário e os espaços precisam ser flexíveis, onde os próprios estudantes e professores possam mexer”, aponta Beatriz.

Para ela, a sala em formato de U ou em O, onde todos os alunos conseguem se observar e trocar experiências, é uma boa saída. No entanto, Beatriz alerta para essas alternativas não se tornarem uma nova regra onde não há possibilidade de mudança. A arquiteta ainda fala que mais interessante do que uma sala fixa para cada turma, são espaços adaptados a determinadas práticas e atividades.

“Cada pedagogia e método de ensino precisa do seu espaço apropriado”

Doris acredita que ao pensar em um projeto arquitetônico completo, o diálogo com o programa pedagógico é essencial. “Cada pedagogia e método de ensino precisa do seu espaço apropriado”, afirma. Para a professora, a solução está na flexibilidade de uso de uma sala de aula tradicional.

Além disso, Beatriz sugere que refletir sobre a organização dos espaços escolares faça parte do dia a dia de alunos, professores e gestores. “Eu diria que a fórmula é o diálogo, é dedicar um tempo do currículo para pensar o que é o espaço da escola”

Participação

A participação de alunos, professores e comunidade nesse processo é essencial. “Professores e alunos devem participar de forma horizontal, de igual para igual, levantando elementos do cotidiano, o que sentem faltas e o que acham que pode dar certo na escola”, sugere Bia.

Doris acredita que envolver a criança no trabalho de mudança e projeto de uma escola contribui para ela se reconheça e se sinta parte daquele espaço. “Um processo participativo onde você envolve as crianças tem uma oportunidade educacional muito grande e forte. Elas vão olhar a cidade, o lar, a vizinhança e a escola de outra forma”.

 

Território

Beatriz retoma que o fato de a escola ser pensada como um lugar de regras e punição faz com que as pessoas se esqueçam que aquele espaço é também um equipamento público. Elementos arquitetônicos como grades, muros altos e cadeados nos portões também contribuem para isso. “O equipamento escolar não é só para aprender. É para toda a comunidade”, diz.

Para Beatriz, a arquitetura escolar deve sempre dialogar com o território, o clima, a topografia e a história daquele entorno. “Precisamos pensar se estamos falando de uma escola em uma aldeia, uma cidade violenta ou em uma praia”.

“É um processo profundo e intersetorial de entender que a construção de uma escola significa um novo equipamento público que pode ser utilizado por todos”

Como exemplo de integração entre escola e território, a arquiteta cita os Centros Educacionais Unificados (CEUs), criados em São Paulo durante a gestão de Marta Suplicy (2001-2005), que além de equipamentos educativos oferece espaços como teatro, quadra, biblioteca e piscina que podem ser utilizados por moradores do entorno.

Levando em conta esses elementos para a construção de uma escola, a chance de não só o aluno, mas toda a comunidade se identificar e se sentir confortável naquele ambiente é maior. “É um processo profundo e intersetorial de entender que a construção de uma escola significa um novo equipamento público que pode ser utilizado por todos”, finaliza.

Arquitetura e educação devem ampliar o diálogo

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