publicado dia 19/03/2015

Especialistas problematizam a gestão do Ministério da Educação

Reportagem:

O anúncio da demissão do ministro da Educação Cid Gomes, na última quarta feira, cria expectativas sobre a futura nomeação e também chama a atenção para o fato de que, após a gestão de Fernando Haddad, de 2005 a 2012, nenhum outro líder ocupou a cadeira por mais de dois anos.

Em pronunciamento nesta quinta, a presidente Dilma diz não se tratar de uma reforma ministerial, mas uma alteração pontual. Questionada sobre um possível nome para a pasta, ela diz não pautar a decisão por interesses partidários, e que a escolha será feita em breve.

Nessa perspectiva, o Centro de Referências em Educação Integral convidou educadores, gestores e líderes de movimentos sociais para opinar sobre o cenário e colocarem suas expectativas sobre as diretrizes ministeriais, especialmente no papel da educação para o desenvolvimento integral.

Lucia Alvarez, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

aspaslucinhaÉ importante colocar o contexto de que a educação não é neutra e o Ministério da Educação é um projeto em disputa. Essa inconstância de ministros revela o caráter conflituoso da educação no Brasil refletido nas políticas. Um dos principais desafios para quem assumir essa cadeira é entender quem são as forças sociais que discutem a educação. O lema ‘Pátria Educadora‘ diz de perspectivas, agendas diferentes entre os grupos. E esse é um debate forte, em que a educação é, de um lado, representada pela avaliação dos números, pelos rankings e, de outro, discutida do ponto de vista do direito, agenda esta na qual me coloco. O quadro que temos hoje reflete tensões que sempre existiram na história do país e que transparecem dentro do Ministério. O ministro não garante uma proposta ou linha única: esses projetos tem que ser colocados no espaço público para discussão, pois o que está em jogo é a formação das novas gerações. Se pensarmos a educação como estratégia de valorização de conteúdos, a intersetorialidade não faz sentido. Agora, se pensarmos no desenvolvimento integral dos indivíduos, o Ministério não dará conta sozinho. Precisamos de um projeto mais aglutinador. Não adianta termos palavras de ordem na mídia, se elas não são refletidas em nossas ações.”

Pilar Lacerda, diretora da Fundação SM

aspaspilar1Essa inconstância é ruim para os processos e para fortalecer as relações entre o Ministério da Educação e a sociedade. A questão é que os deputados podiam ter aproveitado a ida do ministro para debater isso, a Pátria Educadora e os programas que farão ela se tornar palpável. O parlamento perdeu uma chance histórica de mudar de posição e demonstrar que se importa sim com a educação. Quanto ao futuro ministro, penso que ele deveria conversar calmamente com as equipes do MEC que tocam, desenvolvem e defendem os projetos e programas; ler tudo do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE) e imprimir as metas do Plano Nacional de Educação e afixá-las em seu gabinete. Desde 2005, com o Fundeb, PDE, PAR, Mais Educação, ENEM, as bases estão dadas. É preciso entender cada política e aperfeiçoar. O Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) foi lançado pela presidente Dilma em 2013 e já está perdendo força.  O futuro ministro precisa de um perfil mais educador, entender a educação básica e buscar as pessoas que estão criando inovações e fazer com que estas novas concepções iluminem os programas atuais, sem jogá-los fora. Precisamos de alguém com força política, trânsito nos movimentos sociais e tranquilidade para entender que são lentas as profundas mudanças que queremos.”

Maria Thereza Marcílio, gestora institucional do Avante – Educação e Mobilização Social.

aspasTereza-min-publicoA educação precisa de mandatos estáveis. Embora, de acordo com o pacto federativo, o Ministério da Educação (MEC) não tenha ingerência sobre estados e municípios – a não ser pelo financiamento -, é necessário estabilidade, e que o MEC esteja sintonizado e organizado para que as políticas se efetivem. O novo ministro, a meu ver, deve ser o mais próximo da área possível. Alguém que entenda as conquistas e não só as mantenha, mas siga avançando. Uma pessoa comprometida que entenda que plantar hoje é colher daqui a 10 anos, e que também compreenda a complexidade em um país diverso, enorme e com muitos desafios. Deve ainda saber dialogar e mobilizar os deputados e praticar a escuta e negociação, em diálogo com o Conselho Nacional de Educação”.

Sérgio Haddad, coordenador da Ação Educativa

aspassergio_haddadA indicação de um ministro atende muito mais aos critérios de natureza política (acordos de alianças, atendimentos de interesses partidários) do que à sua especialidade como ministro da Educação. Evidentemente que não há como ter um ministro eminentemente técnico já que, para o cargo, é necessário ter capacidade de negociação com os diversos setores da sociedade, do parlamento, entre os próprios ministros para ações conjuntas, com as universidades, com a área econômica, com os diversos níveis de governos (estados e municípios) etc. Mas se a predominância dos critérios for apenas os acordos partidários para acomodar interesses da base aliada, a instabilidade sempre será maior quando essa base é composta por uma grande aliança ou quando há turbulência política como essa que estamos vivenciando agora. Há muitos desafios, principalmente em uma situação de crise econômica e da instabilidade política em que a capacidade de negociação se estreita. De qualquer maneira, os desafios não são diferentes dos tradicionais dos últimos anos como ampliar o atendimento nos níveis educacionais ainda não cobertos pelo poder público (a educação infantil e o ensino médio, por exemplo), melhorar a qualidade do ensino etc. Mas, o mais importante é implementar o Plano Nacional de Educação (PNE) votado recentemente e construído a partir de uma ampla mobilização dos setores da sociedade, além de estimular estados e municípios para que construam os seus planos. Essa é a base para a negociação do que fazer, para que haja controle social sobre suas metas. Quanto ao lema “pátria educadora” ainda não sabemos ao que veio. Não há conteúdo que permita operá-lo. Por enquanto é só retórica política, não há concretude.

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Daniel Cara, presidente da Campanha Nacional pelo Direito às Educação

aspasEm post intitulado “Para Educar a Pátria”, realizado em seu blog, Daniel Cara chama a atenção para o fato do governo já apresentado quatro ministros da educação. No entanto, coloca que é necessário o apontamento de saídas e não somente debates sobre erros, defeitos e limitações governamentais. Sobre o lema “Pátria Educadora”, o ativista defende que a educação seja verdadeiramente uma agenda central e reforça a importância do Plano Nacional de Educação estar assegurado no planejamento governamental.

(Colaborou Dafne Melo)

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